Política

Vai devagar, Marangoni;
vai devagar, Marangoni

DANIEL LIMA - 23/02/2023

Deputado federal de primeira viagem; mais que isso, parlamentar de primeira viagem; mais que isso, de olho na Prefeitura de Santo André no ano que vem; mais que isso, louco para que ninguém lhe roube a cena de um legado que imagina seu, Fernando Marangoni colocou em risco o currículo público que ainda não construiu ao meter a colher de oportunismo na tragédia do Litoral Norte de São Paulo. 

Vou partir dos finalmentes para os inicialmentes de modo que os leitores entendam a derrapada de Fernando Marangoni no lamaçal da destroçada cidade de São Sebastiao. 

Fernando Marangoni insinuou nas redes sociais que o prefeito de São Sebastião teria culpa no cartório das mortes e de tudo o mais porque não levou a  sério o projeto de recolocação da população de um determinado bairro de São Sebastião, como foi oferecido ao titular da Prefeitura por ele, Fernando Marangoni, na condição de então secretário executivo estadual de Habitação, cargo que exerceu no governo de Rodrigo Garcia. 

SUTILEZA CRIMINAL  

Claro que na ânsia de aparecer como um suposto salvador de uma pátria que foi para o brejo, Fernando Marangoni não fez acusação direta ao prefeito de São Sebastião, do PSDB. Foi sutil ao incriminar o prefeito.  

Uma sutileza restrita ao campo criminal, porque não se pode sair aí acusando quem quer que seja de uma modalidade que caberia no formato hoje banalizado de genocídio.  

Só que a sutileza criminal do deputado Fernando Marangoni ganhou sentido oposto no campo de comunicação social.  

Ficou expresso nas declarações aos jornalistas digitais exatamente o seguinte: se houvesse mais cuidados e atenção do prefeito, levando a cabo a assinatura do projeto elaborado pelo governo do Estado, os estragos humanos e materiais poderiam ser menores.  

Traduzindo: Marangoni entrou num campo minado do ponto de vista ético porque está louco para mostrar serviço.  

MUITOS PROJETOS  

Raramente se viu um legislador recém-eleito ou mesmo reeleito diversas vezes entregar-se tanto a apresentar projetos de lei. Foram, segundo o noticiário das semanas anteriores, dezenas dos quais numa só batelada. Nada grandioso e revolucionário, muito menos reformista em favor do Grande ABC, mas o suficiente para demostrar que Fernando Marangoni não está para brincadeira. Projetos de lei sempre rendem votos no eleitorado menos exigente.  

O que talvez ainda não sabe o deputado federal e assessores é que tudo tem limite. Principalmente quando se trata de assunto sério como os mortos e desabrigados de São Sebastiao.  

Acusar o prefeito de infringir os ditames de cautela e precaução ao sugerir  gravidade no quadro que levou aos estudos e ao projeto de reconfiguração habitacional da área levada pelas águas é dar um tiro no próprio pé.  

Como assim? Tiro no próprio pé? É disso que estou falando, porque é disso de que se trata.  

Marangoni foi muito além da cautela criminal ao subjetivamente direcionar carga elevadíssima de responsabilidade do prefeito. Marangoni foi precipitado como agente público porque se colocou na posição de salvador de almas. Ficou cego de paixão midiática e cavou a própria sepultura funcional como ex-executivo do Estado de São Paulo. 

Nas redes sociais que consumi não havia a informação da reportagem que li no Diário do Grande ABC de ontem. E é essa reportagem que faz de Fernando Marangoni um deputado contraditório e autoincriminador.  

VEJA DECLARAÇÕES  

Tanto é verdade que vou reproduzir o trecho que consta da matéria do Diário do Grande ABC e que me leva a dizer ao deputado que é melhor baixar a temperatura da busca por manchetes a qualquer custo. Vamos ao trecho do Diário:  

 Nos últimos anos, o chefe do Executivo de São Sebastião já teve problemas com a demora em ações de prevenção em área de risco. “Ele foi condenado pela Justiça, em março de 2021, por meio de ação civil pública, justamente para cuidar daquela área que havia risco de deslizamento e impedir ocupação irregular no município. Ele sabe do problema”, disse Marangoni. Na sentença, o juiz Alaby Soubihe Filho determina: “o embargo imediato de qualquer nova ocupação ou ampliação, sob pena de multa diária de R$ 5.000, bem como responsabilidade pessoal do prefeito e secretários”. Para o deputado federal, que também foi secretário de Habitação da Prefeitura de Santo André, não há explicação razoável para que o prefeito de São Sebastião tenha deixado de assinar o convênio para construção das moradias na cidade do Litoral Norte de São Paulo. “Não há razão para isso, uma vez que o investimento seria todo do Estado, disse. “Para mim, essa é uma tragédia claramente anunciada” – disse ao Diário.  

SABIA DE TUDO  

Assimilaram bem as declarações do deputado Fernando Marangoni? Ele sabia do crime de responsabilidade do prefeito e de secretários, provavelmente conhecia os riscos dos moradores da área, o Estado elaborou um projeto que não foi assinado há seis meses pelo prefeito e as consequências vieram.  

Reagiu com estardalhaço somente após a casa arrombada literalmente, sabendo-se como sabia que havia riscos e, mais que isso, que o Estado poderia, legalmente, interferir no cronograma de obras ou de evacuação da área, com o respaldo do Judiciário. Afinal,  por que então não foram tomadas as providências cabíveis?  

Se tivesse que dar uma sugestão ao deputado Marangoni diria com a pureza da alma de quem não tem partido de estimação, nem político de oração, muito menos eleitorado a proteger: cuide-se, cuide-se e cuide-se. O aprendizado é longo e pode ser ruinoso para quem vai com muita sede ao pote do populismo. Pior que isso: de um populismo calculadíssimo em situação em que o humanismo, na abrangência da expressão, deveria estar a salvo de malfeitores éticos.   

O deputado Marangoni deveria dar uma olhadinha ao redor. Veja quem são os assessores que influenciam suas mensagens, suas decisões. Tem gente aí que está louca para fazer do caro deputado um ocupante tagarela das redes sociais.  

COMO CAMICASE  

Cuidado, deputado. Esse pessoal demonstrou no caso de São Sebastião que não entende nada do riscado de comunicação. Fosse o caro deputado mais visível e sujeito a chuvas e tempestades do eleitorado como um todo e do jornalismo em geral, teria se esborrachado. Seria provavelmente um caso raríssimo de entrega da própria rapadura. 

Sim, entrega da rapadura de aceitar sem contestação a suposta recusa de um prefeito em maus lençóis com a Justiça a desrespeitar uma ação do governo do Estado.  

Além de tudo que armou contra si mesmo, como camicase, Marangoni ainda ficou a dever informações que seriam essenciais ao ajuizamento criminal do prefeito, caso se dispusesse a isso.  

AÇÕES PASSADAS?  

Mesmo que o prefeito houvesse assinado o acordo, não seriam seis meses suficientes para botar o time em campo e consertar abusos de ocupação de área que se registra há muito tempo.  

Teria Marangoni alguma ação efetiva em situação semelhante resultado em intervenção rápida e eficiente?  

Vou um pouco além: alguma vez Marangoni agiu junto ao Ministério Público e ao Judiciário, como agente público estadual, para formular denúncias contra mercadores imobiliários que durante todo o sempre transformam territórios litorâneos em casa da sogra ocupacional e em casa da moeda de investimentos que destroem qualquer possibilidade de desafio aos fenômenos naturais ou mesmo a qualidade de vida dos incautos compradores?  

MERCADORES IMOBILIÁRIOS  

Como secretário de Habitação de Santo André, quais foram as ações de Fernando Marangoni também no sentido de harmonizar as relações entre mercado, espaço e qualidade de vida, sem permitir, portanto, a contratação de eventuais desventuras provocadas por chuvas e tempestades?   

Não custa lembrar que Santo André e São Bernardo estão entre as 15 maiores cidades do País em potencial de desastre ambiental.  

Será que os programas de habitação populares que invadiram Santo André nos últimos anos seguiram rigorosamente a legislação de uso e ocupação do solo?  

OUTROS RESPONSÁVEIS  

Se seguiram, por que o ex-secretário municipal e ex-agente estadual não elaborou um tratado exemplar que pudesse ser adaptado aos endereços vulneráveis como de São Sebastião? 

São apenas algumas perguntas a serem respondidas. O que não dá para responder em situação normal é como um agente público estadual, conhecedor de que um prefeito prevaricou nos cuidados com o uso e ocupação do solo,  não transformou a irregularidade em severa política de contenção do apetite de mercadores imobiliários?  

Ou alguém tem dúvidas de que entre os muitos responsáveis pela tragédia no Litoral Norte as digitais de mercadores imobiliários aparecerão proeminentes a desafiar a natureza?  

A Velha Imprensa tem todo o interesse do mundo em esconder uma das vertentes da criminalidade ambiental urbana em terra firme ou terra em risco. Inescrupulosos bandidos imobiliários são protegidos pelos beneficiários de financiamentos eleitorais à revelia da legislação. Os crimes ambientais e seus desdobramentos têm nos mercadores imobiliários os principais atores.



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