Política

Pesquisa coloca morador e
eleitor em situações opostas

DANIEL LIMA - 10/10/2023

O Instituto Badra divulgou ontem à noite uma primeira rodada de pesquisa eleitoral para o comando da Prefeitura de Santo André em disputada programada para outubro do ano que vem. Os dados gerais ainda são vulneráveis porque a disputa está distante. 

O que se tornou um desafio à interpretação é o grau de insatisfação dos moradores entrevistados como eleitores. Não se pode esquecer que o mesmo morador de Santo André que vota em alguém também consome qualidade de vida sob a responsabilidade da Administração Municipal.

Esses eleitores-contribuintes se mostram mais ácidos do que o esperado. O que contrasta com o nível de aprovação da Administração de Paulinho Serra.  Tantas reclamações não combinam com números tão positivos. Há alguma inconformidade nisso ou isso faz parte do aquilo, ou seja, da geleia de viver apesar de contradições? 

Sempre que escrever sobre pesquisas eleitorais os leitores que também são eleitores que também são contribuintes devem levar em conta o grau de condicionalidade. Tenho restrições imensuráveis a pesquisas eleitorais. O Datafolha da Folha é o principal alvo, exatamente por ser o mais expansionista nos meios de comunicação. Mais que isso: se traveste de todo-poderoso e infalível, apesar de tantas patacoadas que patrocina. 

MORADOR X ELEITOR 

Feita essa observação, é impossível não comparar o eleitor de Santo André que respondeu ao Instituto Badra com o morador de Santo André que existe em cada um deles. Eles coabitam o mesmo corpo e mente. Mas não parecem integrados. Uma coisa está desgarrada da outra. Ou, diferentemente disso, uma coisa está conjugada à outra, embora pareçam distintas?

Os dados gerais sobre o posicionamento dos eleitores frente aos nomes relacionados à competição ainda são frágeis para conjecturas seguras. Afinal, na questão inicial, básica para entender a temperatura do jogo proposto, nada menos que 95% dos eleitores entrevistados disseram que “votariam em branco, nulo, nenhum ou simplesmente não sabiam responder” sobre em quem votariam. 

É isso mesmo: de cada 100 eleitores (e foram 1.060 no total) inicialmente indagados pelo pesquisador, 95 disseram na resposta espontânea (sem o aporte de uma cartela com nomes) que não têm candidato. Na pesquisa do Instituto Paraná, divulgada recentemente, eram 70%. 

PROBLEMAS URBANOS 

Pare um instante para pensar sobre as respostas vinculadas ao critério de voto espontâneo e compare com as respostas que os mesmos eleitores também contribuintes em Santo André disseram, no decorrer da pesquisa, em resposta às soluções prioritárias que esperam do Poder Público.

Vejam o que o espera: nada menos que 47% afirmaram que “falta segurança”, enquanto 20% apontam “população de rua”, 18% “enchentes e alagamentos” e 13% “transporte público”. Some esses apontamentos e você chegará a 98% de respostas afirmativas. Apenas 2% não souberam responder.

Ou seja: 95% dos eleitores não saberiam em quem votar se não lhes fossem apresentados os nomes de supostos concorrentes, enquanto 98% desses mesmos eleitores que também são contribuintes apontaram os quatro maiores dramas de quem mora em Santo André. 

Acredita-se que os problemas potenciais de Santo André e que não são especificamente de Santo André numa região problemática como o antigo Grande ABC, tenham sido expressos com base numa cartela demonstrativa específica. Ou seja: foram manifestações estimuladas. Por falta de informações metodológicas, pode também ter ocorrido de as respostas condensarem agrupamentos temáticos de questões urbanas em função de apontamentos espontâneos. 

PERCENTUAL DO PREFEITO 

De qualquer forma, com uma coisa ou outra coisa, o que o contribuintes que também são eleitores deixaram evidenciado é que Santo André está longe de ser um paraíso regional, como se vende no noticiário propagandístico da Administração Municipal. 

Antes de chegar a um dos pontos relevantes da pesquisa (a aprovação do prefeito Paulinho Serra e do governo municipal), não custa aprofundar os dados dos 95% que não teriam em quem votar sem estímulo do entrevistador e sua cartela mágica de nomes. Do total de 1.060 entrevistas, o nome do prefeito Paulinho Serra foi apontado por 33 eleitores, ou 3,1% do total. 

Não é possível estabelecer qualquer avaliação sobre o grau de potencial de votos do prefeito Paulinho Serra se o prefeito Paulinho Serra fosse candidato a prefeito porque prefeito não poderá ser mais na próxima temporada, já que já foi reeleito. Quantos eleitores saberiam disso e, por conta disso, não mencionaram o nome de Paulinho Serra?

BAIXA ESPONTANEIDADE 

A lista dos demais concorrentes que constam de respostas nominais da pesquisa sob o critério de espontaneidade contempla vários nomes e o total de 20 menções identificadoras. Resultado: do total de questionamentos, o predomínio de “não sei dizer” alcançou 72% dos eleitores (765 entrevistas), enquanto do grupo de “nulo/branco/nenhum” constaram 244 respostas. 

É isso que chamo de vulnerabilidade da pesquisa, que não é da pesquisa propriamente dita, mas de quem respondeu à pesquisa. 

Quando se chega à pergunta subsequente, cujas respostas estão atreladas à cartela circular com os nomes dos concorrentes apontados, a escolha individual se dá sem a mesma consistência do que transpira em baixíssimo grau no voto espontâneo. 

Isso quer dizer que, levando-se em conta a longa jornada até as eleições, muito do que aparece em forma de intenção eleitoral definida se torna fluído e por isso mesmo mutável.

RELATIVIZAÇÃO 

É sob esse enfoque que os resultados do critério de voto estimulado precisam ser relativizados. A pesquisa do Instituto Badra anunciada ontem contém três versões com diferenciações de concorrentes.

No Cenário Um, Eduardo Leite tem 12,4% dos votos, André do Viva tem 12,4%, Luiz Zacarias 11,6% e Bruno Daniel 9,3%. Os demais estão bem abaixo, a partir do quinto colocado, Almir Cicote, com 5,7%. Nesse ambiente, brancos, nulos e ninguém compuseram 21,2% das escolhas, enquanto outros 11,6% não souberam responder. No total, portanto, os votos desprezados somaram 32,8% dos eleitores.

No Cenário Dois, André do Viva lidera com 12,6%, Eduardo Leite conta com 12,4%, Luiz Zacarias com 10,7% e Bruno Daniel com 9,7%. O total de votos descartáveis soma 34,8%. Alguns supostos concorrentes foram substituídos por outros como explicação à mudança dos números.

No Cenário Três, com redução drástica de concorrentes (apenas seis ante 12 de cada um dos cenários anteriores), Luiz Zacarias lidera com 14,0%, Eduardo Leite com 13,7%, André do Viva vem a seguir com 13,7%, Fernando Marangoni tem 5,6%, Carlos Grana 4,5% e Leandro Petrin 3,8%. Os votos descartáveis (branco/mulo/ninguém/não-se-dizer) totalizaram 44,7% dos eleitores.

APROVAÇÃO DUPLA 

Agora chegamos, finalmente, à aprovação de Paulinho Serra e do governo Paulinho Serra. Também não há nota metodológica distinguindo uma coisa da outra, mas se supõe que a primeira se trata da individualidade do prefeito tucano e a segunda do coletivo do prefeito tucano, ou seja, dele e dos demais colaboradores. Na especificada “Avaliação da Administração”, Paulinho Serra conta com 56,3% de aprovação, somando-se os 19,3% de “ótimo” e os 37,0% de “bom”. O ‘regular” registrou 29,2%, ante 6,1% de “ruim”, 4,3% de “péssimo” e 4,0 de “não sabe”.

Na questão seguinte, denominada “Forma de governar”, Paulinho Serra é aprovada por 74% dos eleitores pesquisados, enquanto 17% o reprovam e 9% não responderam. Provavelmente a diferença entre aprovação num critério e aprovação no critério seguinte seja explicada pelo desembarque de eleitores que optaram por “regular” no questionamento anterior e tenham se decidido em maior parcela pelo “aprovação” na questão posterior.

VOTOS TRANSFERÍVEIS 

Um outro ponto da pesquisa do Instituto Badra que quase desprezei, mas é relevante mostra que os eleitores que aprovam Paulinho Serra situam-se no total de 43% que transfeririam “com certeza eu votaria nele” ao indicado. Ainda há um naco de “35% que “eu poderia votar nele”. Para 17%, “não votaria nele de jeito nenhum”, enquanto 5% não responderam. 

Paulinho Serra teria maior influência à transferência de voto do que o presidente Lula da Silva, com 47% de poderio, e Jair Bolsonaro, com 22%. Essas duas marcas estão relacionadas aos eleitores ouvidos pelo Instituto Badra e os votos que levaram às urnas em outubro do ano passado à escolha do presidente da República. Bolsonaro ganhou a eleição de Lula da Silva em Santo André por 5E% a 48%, mas na pesquisa do Badra Lula leva vantagem quando se resgata aquela disputa – 52% A 29%. 

A conclusão provisória a que se chega ao fim da análise da pesquisa do Instituto Badra é que o jogo está aberto em Santo André para qualquer candidato, mas o peso da escolha final, sejam quais forem os concorrentes, estaria prevalecentemente entre os candidatos com aproximação ou vinculados ao Paço Municipal. Nenhuma surpresa, portanto. 

A conclusão de prefeito bem avaliado e repassador de prestígio ao candidato potencialmente vencedor não retira a dificuldade de explicar como isso é possível diante da realidade de que os quatro maiores problemas urbanos alcançam números tão elevados. 

A dúvida aumenta na medida em que Paulinho Serra é um prefeito varejista, ou seja, relacionado a obras voltadas à próxima eleição e, por isso, muito distantes da próxima geração. 

Um prefeito bom de voto, mas ruim de governo é um prefeito hermafrodita do qual Santo André não sentirá falta. Principalmente quando a conta chegar a quem ainda não entendeu que o nome do jogo de uma administração histórica chama-se comprometimento com o futuro que sempre chega. 



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