Preciso e tenho a humildade de reconhecer o mais recente serviço prestado pelo deputado federal Alex Manente à sociedade regional. A entrevista combinada, publicada no Diário do Grande ABC, confirma no meu horizonte e no passado já vivido e remoído todas as convicções: temos um exemplo de homem público confessadamente desprovido de duas essências naturais do homem público: sensibilidade política e conhecimento básico de economia regional.
O que está na origem das contradições do deputado federal é a recusa do prefeito Orlando Morando em tê-lo como candidato do Paço Municipal nas eleições do ano que vem. É claro que tanto o jornal quando Alex Manente disfarçaram o sentido de uma pauta jornalística que se tornou camicase para Alex Manente.
É muito raro encontrar numa entrevista previamente adocicada, mesmo se levando em conta muitas cavalgaduras da política, alguém como Alex Manente. Ele usou uma metralhadora de infantilidades e detonou a si próprio. Um tiro no próprio pé é pouco, portanto. Foram vários.
QUE SE PASSA?
Fico a perguntar que bebida bebeu Manente para dizer o que disse, que charuto teria fumado para repetir o que disse e que perfume teria cheirado Manente para reiterar o que declarou? Será possível que ninguém, absolutamente ninguém, o alertou sobre trapalhada em que se meteu?
Está certo que a sociedade da região, a sociedade consumidora de informação, está mais desleixada do que nunca, imersa no mundo digital que não tem fronteiras. Mas o que disse Manente ao Diário do Grande ABC é um caso senão de consulta psiquiátrica, ao menos uma ficha de ingresso num curso qualquer de habilitação, porque a capacidade de verbalizar estultices lembra um caminhão sem freios.
A melhor maneira de levar ao leitor o que de fato ocorreu e o que tenho a oferecer em contrapontos é reproduzir a reportagem do Diário do Grande ABC de forma escalonada às minhas intervenções.
AUTENTICIDADE
Se fizesse uma análise sem esse cuidado e transparência, provavelmente os maledicentes poderiam dizer que editei a entrevista do deputado federal, porque é mesmo de lascar. Se facilitar, vão dizer que se trata de fake news.
Então, sem perda de tempo e espaço, vamos ao que interessa? O título da reportagem, em três linhas no alto da página de Política, afirma: “Para Alex, eleitor olhará currículo, não padrinho político”. Na linha auxiliar: “Deputado federal diz que peso de figuras externas, como Lula, é reduzido em uma disputa municipal: População não votará em poste”. Agora vamos aos respectivos trechos da reportagem que comportam contrapontos:
DIÁRIO DO GRANDE ABC
O deputado federal Alex Manente (Cidadania) avaliou que será reduzido o peso de figuras políticas externas no processo eleitoral à Prefeitura de São Bernardo no ano que vem. “O eleitor vai priorizar São Bernardo. Quem tem o melhor projeto, o mais preparado, quem reúne mais condições de levar adiante os projetos da cidade. Ninguém vota em poste”, disse.
CAPITALSOCIAL
Não custa o leitor que também é eleitor esperar um bocadinho para que Manente seja desmascarado nessa premissa básica do conteúdo da reportagem. Sobremodo no trecho em que se refere ao banimento de poste como alguém com potencial eleitoral em São Bernardo. De poste, Manente entende bastante.
DIÁRIO DO GRANDE ABC
“O candidato tem que ter história, tem de ter currículo. Os postes tentados no Brasil só deram errado. Veja o (Celso) Pitta (ex-prefeito de São Paulo) do (Paulo) Maluf (ex-prefeito e ex-governador); Dilma (Rousseff, ex-presidente do Brasil) do Lula (Luiz Inácio Lula da Silva, atual presidente da República), o (Fernando) Haddad, também do Lula, que tem até feito um bom trabalho como ministro da Fazenda, mas perdeu a reeleição para a prefeitura de São Paulo. Não acho que as pessoas vão submeter seus votos às vontades de Lula, do governador Tarcísio (de Freitas, Republicanos) ou do Orlando (Morando), PSDB, prefeito de São Bernardo). Vão escolher aquele que tem condições de pegar a cidade endividada e encontrar soluções para alavancar a economia, com manutenção do padrão de qualidade que a cidade tem hoje”, emendou o parlamentar durante entrevista ao podcast Café com Bolo” – escreveu o Diário do Grande ABC.
CAPITAL SOCIAL
É impressionante a inabilidade teórica e política de Alex Manente. Personalista, quando não arrogante, como se colecionasse currículo razoavelmente competente e não apenas um distribuidor de dinheiros de emendas parlamentares, como tantos outros, Manente simplesmente rifou eventuais reforços de campanha, à direita e à esquerda, os quais, aliás, como se verá mais adiante, ele tanto comemora quando são seus supostos aliados. As citações de cases de sucesso eleitoral de apadrinhamentos anula o argumento de que o eleitorado faz do currículo que ele imagina ter o barco de salvação a uma gestão competente. Todos os postes citados por Alex Manente foram eleitos e muitos outros o foram e serão, porque a influência junto ao eleitorado é uma prática cultural nas eleições brasileiras. Alex se utilizou de uma falácia misturada com ressentimento que também se mescla com burrice porque ele próprio, ainda outro dia, nas mesmas páginas do Diário do Grande ABC, praticamente suplicava (com o apoio do jornal, que o quer prefeito) o suporte do prefeito Orlando Morando, com quem teria feito no passado um trato rumo ao futuro que está chegando em forma de urnas eleitorais. Alex Manente enrolou-se de tal forma que possivelmente encontrará dificuldades para confirmar uma parceria eleitoral com o PT do suposto candidato Luiz Fernando Teixeira, deputado estadual. Se o fizer, ou seja, se saírem de braços dados sem dois soldados num eventual segundo turno, restará saber quem será o poste de quem. Ainda não se encontrou uma métrica segura para avaliar o peso de influência de parceiros de jornada internos e externos nas eleições municipais, mas não há um maluco na praça que interrompa o circuito de inteligência cognitiva a ponto de dizer que a consanguinidade eleitoral não alteraria praticamente nada o circuito de votos. Apenas Alex Manente, claro.
DIÁRIO DO GRANDE ABC
Na entrevista, Alex admite que “dificilmente não estará nas urnas”, porém, ponderou que sua candidatura não parte de um desejo individual, e, sim, de um coletivo. Ele citou os apoios políticos recebidos do secretário de Pessoa com Deficiência e Cidadania, Pery Cartola (PSDB), do vereador Julinho Fuzari (PSC), do MDB, do Progressistas e relembrou a fala do secretário de Estado de Governo, Gilberto Kassab (PSD), que disse que “agora é a vez do Alex” em São Bernardo: “Ninguém é candidato de si próprio. É desejo daqueles que acreditam em você. É preciso ter convergência. – disse ao Diário.
CAPITALSOCIAL
Notaram que todas as declarações no trecho acima colocam Alex Manete contra o próprio Alex Manente e, dependendo da opinião de terceiros, ele pode ser um poste daqueles que o apoiam? Se o peso de figuras externas não se reproduz numa disputa eleitoral, por que então a citação a Gilberto Kassab e, mais que isso, o chamamento à Imprensa quando do evento de apoio? E se também afirma de forma obliqua que apoios internos não fazem a diferença (referiu-se especificamente ao prefeito Orlando Morando), como auxiliares do titular do Paço Municipal valem tanto?
DIÁRIO DO GRANDE ABC
Alex rememorou a histórica rivalidade com Morando, transformada em apoio em 2020, afirmando que “por mais de 20 anos ambos disputaram os mesmos cargos”, mas que há três anos, houve entendimento de que era necessário convergência para que a cidade pudesse atravessar um período complicado da pandemia de Covid-19. Também garantiu que o apoio eleitoral naquele ano não veio condicionado às indicações do governo. “O André (Sicco, secretário de Assistência Social) tem feito um grande trabalho, mas não como uma imposição minha. Tanto que nunca tive ingerência no trabalho dele” – escreveu o Diário do Grande ABC.
CAPITALSOCIAL
Mais uma vez, Alex Manente tropeça em contradição. Deixa claro que fez uma composição com Orlando Morando em 2020, mas omitiu que anteriormente tanto frequentou o comitê do mesmo Orlando Morando quanto do petista Luiz Marinho, sempre como linha-auxiliar dos dois favoritos ao cargo máximo do Município. Para Manente, o que vale é o currículo, é a história. Provavelmente por isso jamais chegou ao gabinete principal do Paço Municipal. Em 20 anos de militância política, sempre e sempre fez das eleições municipais a estrada rumo à Assembleia Legislativa e à Câmara Federal. Mais que um poste escolhido para uma tentativa de vitória eleitoral, Manente se especializou com quebra-galho de terceiros sempre vinculado a interesses próprios.
DIÁRIO DO GRANDE ABC
Após década de intenso desenvolvimento econômico de São Bernardo pela matriz automobilística, o deputado federal Alex Manente afirmou que é necessário repensar o modelo econômico da cidade. “São Bernardo não pode ficar refém de arrecadação do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano) e ICMS (Imposto Sobre Circulação de Mercadores e Serviços), tributos esse em queda. “É necessário diversificar a matriz econômica”. Na visão de Alex, São Bernardo precisa apostar as fichas em empresas de tecnologia para se desenvolver para o futuro. Ele citou que visitou algumas das grandes montadoras que seguem na cidade – Scania e Mercedes-Benz – e constatou que a tecnologia tem substituído a força de trabalho, sendo que, se o município tivesse viés para o desenvolvimento tecnológico, geraria receita e emprego ao mesmo tempo.
CAPITALSOCIAL
Extraordinário monumento de sabedoria. Se o deputado recorrer aos arquivos desta revista digital vai descobrir que a expressão “desenvolvimento tecnológico” consta de 52 análises diferentes deste e de outros jornalistas que fazem o sucesso dessa publicação há 34 anos. “Tecnologia” aparece em 1.158 análises, entre pouco mais de oito mil textos. “Atualização tecnológica” está em 58 análises”. Outras variáveis com o mesmo sentido desenvolvimentista também se encontram às dezenas e centenas. Ou seja: falar em tecnologia quando se refere à economia da região é algo como ouvir “Timão, timão”, quando se vai ao Itaquerão. Alex Manente não tem o mínimo conhecimento sobre a economia da região. E jamais se preocupou com isso. É um ausente contumaz em todos os eventos do passado e do presente que tratam de qualquer tema econômico.
DIÁRIO DO GRANDE ABC
“Em São Bernardo temos uma empresa que produz ônibus elétrico (Eletra). Por que não pensar em incentivos para que São Bernardo se torne um polo de produção de veículos elétricos, não só ônibus, indagou.
CAPITALSOCIAL
A resposta é simples, caro deputado, e vai muito além da vontade de investir. As condições gerais de aportar recursos na região são irreversivelmente insustentáveis diante da concorrência nacional e dos efeitos macroeconômicos do setor mais competitivo do mundo industrial. A maior empresa mundial de veículos elétricos, a chinesa BYD, acabou de ganhar milionários incentivos fiscais do governo estadual e do governo federal para construir a maior fábrica do setor em Camaçari, de onde a Ford escafedeu. O Custo ABC, se o deputado não sabe, inviabiliza a volta dos que foram, ou seja, dos investimentos em forma de produção industrial.
DIÁRIO D GRANDE ABC
Alex lembrou que a Prefeitura tem vendido áreas públicas atualmente “só para fechar a conta” porque há queda do ICMS e ausência de uma política que pense novos modelos econômicos para o município. “São Bernardo apresenta um alto volume de endividamento. Para o futuro, o próximo prefeito terá de equacionar uma conta difícil: equilibrar as contas públicas, projetar o futuro e manter o padrão de vida que a cidade está acostumada – disse o deputado.
CAPITALSOCIAL
É claro que uma entrevista tão desastrosa e insensata deveria ser fechada com chave de latão. Primeiro, vender áreas públicas inócuas, quando não custosas à manutenção, é obrigação de qualquer gestor público. O que faltaria e que o deputado poderia contribuir com ideias e projetos, é estabelecer regulamentação básica para que não falte transparência nos negócios, para todos os endereços municipais, sem omissão e proteção a prefeitos amigos que atuam sob condições de transparência muito mais preocupantes. Segundo, o futuro econômico de São Bernardo passa por um mata-burros que jamais foi aceito por um grupo decisivo às transformações: o movimento sindical. Terceiro, se São Bernardo mantiver o padrão de vida atual da população, em escalada há muito decrescente, herança de vários fatores sobejamente conhecidos, se São Bernardo mantiver o que tem hoje, já seria uma grande vitória. Vem mais chumbo grosso no futuro. A dependência do setor mais competitivo do mundo ainda está longe de ser revertida. E não o será sem muito mais choro, vela e fita amarela.
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19/11/2024 PESQUISAS ELEITORAIS ALÉM DOS NÚMEROS (24)