O Diário do Grande ABC de hoje transformou em manifesto de torcida organizada de Alex Manente a pesquisa produzida pelo Instituto Paraná. O cenário previsto para São Bernardo é uma constelação de estrelas cadentes em sustentação técnica.
(Vou deixar para o final desta análise um dado que me chegou à mão somente quando estava pronto para editar o texto. Um dado importantíssimo)
O Diário do Grande ABC integra o grupo que apoia o deputado federal e que tem como reserva supostamente de luxo o petista Luiz Fernando Teixeira. Só não pode vencer a disputa em São Bernardo alguém ligado ao prefeito Orlando Morando.
O Diário do Grande ABC e o grupo político do qual faz parte o Diário do Grande ABC até tolerariam uma vitória do petista Luiz Fernando Teixeira, mas não passaria disso mesmo – de tolerância. O PT e o Diário do Grande ABC têm relações mais que preventivas, para não dizer cautelares, senão desconfiadíssimas.
FLEXIBILIDADE DEMAIS
A análise da pesquisa do Instituto Paraná não comporta especulação porque, se isso for levado a cabo, o que teremos é a valorização da subjetividade permeável à desclassificação de um produto editorial a salvo de tranqueiras interpretativas.
Pesquisa eleitoral é uma ferramenta que tanto pode ser estritamente técnica e inviolável a manipulações como um artifício a flexibilidades interpretativas.
No caso da reportagem de hoje do Diário do Grande ABC, fico com a segunda opção sem a menor margem de risco.
O material é mesmo uma mescla de informação e panfletarismo no sentido de desnudar a preferência incontida por um candidato bem visto na Rua Catequese. No caso é o deputado federal Alex Manente, do grupo regional do qual faz parte também a Administração de Paulinho Serra.
(Vou deixar para o final desta análise um dado que me chegou à mão somente quando estava pronto para editar o texto. Um dado importantíssimo)
Quem disser que não existe regionalidade no ABC Paulista precisa tomar muito cuidado para não deixar de citar exceções. No caso da política partidária, existe regionalidade parcial de vários lados. De quem está com o Diário do Grande ABC e de quem resiste ao Diário do Grande ABC.
A conclusão de que a pesquisa do Instituto Paraná precisa ser cuidadosamente digerida não constitui opinião no sentido democrático de que todos têm direito a ter, mas de argumentação que, infelizmente, poucos conseguem adensar para fugir dos descaminhos de vícios que sempre mostram os fundilhos.
Além dos vetores técnicos que listo e explico logo abaixo (margem de manobra, fator Orlando Morando, fator Tarcísio-Lula e votos vulneráveis), há que se considerar na reportagem de hoje do Diário do Grande ABC outros aspectos que configuram a torcida organizada apontada na manchete dessa análise.
MANCHETÍSSIMA PROTETIVA
A primeira página do Diário do Grande ABC é esclarecedora nesse ponto. A manchetíssima do jornal (“Alex Manente se consolida na liderança em corrida eleitoral pelo Paço de São Bernardo) é precipitada porque assim deveria ser. Afinal, o jornal está a serviço do deputado federal.
(Vou deixar para o final desta análise um dado que me chegou à mão somente quando estava pronto para editar o texto. Um dado importantíssimo)
Ainda a nove meses da disputa e sem que o passado o recomende como primeira força de uma disputa que mal se iniciou, o uso do termo “se consolida” incorporado ao nome de Alex Manente é propagandístico. Mesmo se considerando que tanto o candidato do PT, Luiz Fernando Teixeira, ainda não esquentou os tamborins eleitorais como também o candidato do prefeito Orlando Morando não tenha sido oficialmente levado a campo.
O Diário do Grande ABC poderia ter sido minimamente comedido, mas não é fácil aplacar o entusiasmo propagandístico. Ao invés de “se consolida”, referindo-se à liderança de Alex Manente, um “segue na frente” ficaria bem mais ajustado ao quadro eleitoral. Pela primeira vez, Manente tem um campo eleitoral menos hostil em São Bernardo, mas daí à “consolidação” vai uma grande diferença.
MAIS PRIMEIRA PÁGINA
Pior que isso na primeira página do Diário do Grande ABC está um subtítulo inusual em termos gráficos e muito mais ainda em termos de projeção: “Disputa acaba no 1º turno se ficar somente nos principais nomes”.
(Vou deixar para o final desta análise um dado que me chegou à mão somente quando estava pronto para editar o texto. Um dado importantíssimo)
Temos uma barbaridade de avaliação exatamente por conta dos motivos apresentados acima. Ainda mais que, até prova em contrário, Alex Manente poderá repetir uma velha canção monocórdia eleitoral das últimas eleições em São Bernardo: entra como suporte logístico de votos do PT ou do adversário do PT sempre com o objetivo de cacifar-se rumo a novo mandato de deputado. Para fugir desse destino precisaria ser o candidato apoiado por Orlando Morando. Entretanto, ao se aproximar do grupo que comanda Santo André, Alex Manente viu deteriorarem as possibilidades de um acordo. Agora passo a detalhar alguns aspectos viscerais da pesquisa.
MARGEM DE MANOBRA
A margem de erro de 3,7 pontos percentuais de fato é margem de manobra, porque dá elasticidade exagerada à navegação oscilante dos dados apresentados. Não é pouca coisa a instrumentalização de 3,7 pontos percentuais. Um exemplo: Manente (com 41,2% dos votos válidos no cenário mais comprimido de concorrentes poderia ter, segundo a margem de erro, tanto 44,9% quanto 37,5%. Marcelo Lima (que vem logo abaixo com 25,0 % dos votos válidos), poderia ter 28,7% como 21,3%. Ou seja: a diferença entre os dois primeiros colocados tanto poderia ser de 23,6 pontos percentuais (3,7 pontos percentuais a mais para um e 3,7 pontos percentuais a menos para outro) quanto 8,8 pontos percentuais (3,7 pontos percentuais a menos para Alex e 3,7 pontos percentuais a mais para Marcelo Lima).
Pontos percentuais e percentagem são diferentes, embora a maioria faça confusão e distorça resultados. A diferença entre uma nota 10,0 e uma nota 7,0 é de três pontos. A pesquisa publicada pelo Diário (41,2% a 25,0%) com cenário restrito coloca Alex Manente 39,32% acima de Marcelo Lima – sem considerar a maleabilidade da margem de erro de 3,7 pontos percentuais.
(Vou deixar para o final desta análise um dado que me chegou à mão somente quando estava pronto para editar o texto. Um dado importantíssimo)
FATOR MORANDO
O Diário do Grande ABC não deu importância alguma e deslocou ao pé da página uma constrangida informação: o prefeito Orlando Morando, com 71,4% de aprovação, é um fator bastante relevante na definição de voto em outubro. Morando conta com 17,6% de ótimo, 39,6% de bom e 25,4% de regular, segundo o Instituto Paraná. Somente 5,4% do eleitorado o consideram ruim e outros 10,8%, péssimo.
Em se tratando de São Bernardo, cidade dividida entre conservadores e trabalhistas, o que temos é uma consagração do prefeito. Talvez os adversários de Orlando Morando, grupo do qual faz parte o Diário do Grande ABC, ainda não tenham detectado as raízes profundas da avaliação positiva do prefeito num ambiente tradicionalmente hostil aos adversários do PT. Ao que parece, são frondosas as raízes do sucesso de público de Orlando Morando. Como são as raízes do prefeito Paulinho Serra em Santo André, igualmente vitorioso. O problema de Santo André é que Paulinho Serra é bom de voto, mas é ruim de governo. A vantagem de Santo André é que Santo André não tem a oposição encardidíssima do PT de São Bernardo.
FATOR TARCÍSIO-LULA
A pesquisa do Instituto Paraná mediu mais uma vez a aprovação do governador Tarcísio de Freitas e a aprovação do presidente Lula da Silva. A diferença favorável a Tarcísio, aliado compulsório do candidato a ser escolhido por Orlando Morando, aumenta o cacife situacionista.
Tarcísio de Freitas conta com aprovação de 61,9% dos eleitores pesquisados, ante 51,8% de Lula da Silva. A distância resiste à elasticidade da margem de erro de 3,7 pontos percentuais. As oscilações apontadas pelo Diário do Grande ABC em relação à pesquisa anterior não devem ser levadas em conta porque estão praticamente encaixadas no critério de margem de erro.
Tarcísio oscilou de 65,9% para 61,9% de aprovação, enquanto Lula da Silva saiu de 56,6% para 51,8% de aprovação. O mais significativo talvez seja o fato de que os dois maiores cabos eleitorais em postos de Executivo, além de Jair Bolsonaro, seguem avaliados distintamente pelo eleitorado. E a desvantagem de Lula da Silva pode fragilizar o potencial de votos do candidato do PT à Prefeitura. Os 12% apontados para Luiz Fernando Teixeira na pesquisa mais restrita estão longe do potencial do candidato petista.
(Vou deixar para o final desta análise um dado que me chegou à mão somente quando estava pronto para editar o texto. Um dado importantíssimo)
VOTOS VULNERÁVEIS
Não consta da reportagem do Diário (diferentemente da pesquisa anterior) o percentual de eleitores que, diante do pesquisador, se manifestou reticente sobre em quem votar em outubro próximo. Ou seja: o voto espontâneo -- que sai da boca do entrevistado e vira dado importante da pesquisa -- não está na reportagem do Diário. Os dados oferecidos aos leitores são de votos explicitados por conta do chamado modelo estimulado.
A diferença entre o voto espontâneo e o voto estimulado é que o primeiro camufla e tornam indecifráveis determinadas investigações sobre os resultados. Quanto mais eleitores se manifestarem em dúvida diante da pergunta inicial do entrevistador, sem expressar qualquer nome dos possíveis candidatos, mais se acentua o grau de vulnerabilidade eleitoral.
O voto estimulado é resultado de uma cartela apresentada ao eleitor com os nomes formando um círculo para que não haja preferência visual indutiva. Esse voto estimulado é mais suscetível a mudanças, porque sai do ventre frágil do voto espontâneo. O voto espontâneo manifestado pelo eleitoral é um caminhão de carregamento de convicções, enquanto o voto estimulado, e portanto sem o lastro de segurança e solidez do voto espontâneo, é uma bicicleta mais ágil e versátil a mudanças de rota.
(Vou explicar agora um dado que me chegou à mão somente quando estava pronto para editar o texto. Um dado importantíssimo)
VOTO SEM DONO
Para não refazer o texto que preparei de manhã, desconsiderei o tempo todo o resultado relativo ao voto espontâneo, já explicado acima. A situação é pior do que imaginava. Sabem os leitores quantos eleitores que responderam à pesquisa do Instituto Paraná disseram, perguntados pelo entrevistador, em quem votariam para prefeito em São Bernardo? Apenas 23,5%. Isso mesmo: apenas um quarto dos eleitores têm convicção sobre o voto que destinarão aos supostos candidatos em São Bernardo.
Isso é literalmente quase nada. Como expliquei acima, os votos estimulados que adviriam da questão seguinte, com cartela recheada de concorrentes, são votos em larga escala suscetíveis a chuvas e trovoadas.
Essa depreciação do voto não vale, pressupostamente, às questões que envolvem a aprovação e a reprovação tanto do prefeito Orlando Morando, do governador do Estado, Tarcísio de Freitas e ao presidente Lula da Silva. Para a disputa pelo Paço, entretanto, torna enorme risco qualquer investida analítica mais profunda ou mesmo fastfoodiana.
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14/11/2024 PESQUISAS ELEITORAIS ALÉM DOS NÚMEROS (23)