Administração Pública

Por que estamos tão mal
no Ranking de Eficiência?

DANIEL LIMA - 05/09/2024

O jornal Folha de  S. Paulo e o Datafolha lançaram um marcador direcionado a quem pretende entender o que se passa na esfera municipal do setor público nacional. Desta feita, o produto é o REM-F, Ranking de Eficiência Municipal. Os dados se restringem a quatro dimensões, nas áreas de  Educação, Saúde, Saneamento e Finanças. O Grande ABC dividido em sete pedaços disformes político-administrativos, entre tantos quesitos, perde feio. Somente São Caetano, um caso à parte, salva-se ao ficar entre os 50 melhores endereços. São Caetano não representa mais que 13% do PIB Regional e menos de 10% de população.

Não vou fazer maiores incursões hoje sobre um tema que tenho levantado diante do silêncio geral, porque envergonhado: a onda emancipacionista na metade do século passado é a raiz mais dolorosamente profunda de nosso sofrimento como espaço humano bafejado pela sorte com a chegada das montadoras de veículos, transformada em Doença Holandesa. Vou deixar essa abordagem para outro dia.

É claro que o separatismo de interesses prevalecentemente políticos sob o manto de um municipalismo supostamente arrebatador de cidadania e pertencimento não é o único vetor que ao longo de décadas provocou a quebra de competitividade na gestão pública regional. Há muitos outros fatores, mas todos os secundários.

BOLO INDIGESTO

Afinal, quando se produz um bolo com ingredientes contraproducentes entre si, o resultado só pode mesmo ser um desastre gastronômico. É assim também  com  tudo na vida. Inclusive nas instituições. A Cidade de João Ramalho é uma feijoada de araque. Não tem orelha de porco, rabo de porco, focinho de porco, nada de porco. É uma porcaria no sentido competitivo de ser. O Ranking de Eficiência Municipal mostra isso.

Uma observação atenta na lista dos 100 primeiros colocados do Ranking de Eficiência dos Municípios aponta o prevalecimento nacional de pequenos municípios. A maioria dos quais dos Estados do Sudeste. Os pequenos municípios são mais governáveis. O Estado de São Paulo conta com 38 representações de pequeno e médio porte. Apenas dois municípios integram a Região Metropolitana de São Paulo. São Caetano na 45ª posição e a Capital, São Paulo, na 60ª posição.

Ora, bolas: se a principal metrópole do País está entre os 100 melhores endereços no Ranking de Eficiência Municipal, não haveria contradição em relacionar o fenômeno da metropolização como indutor de ineficiência?

Não existe contradição alguma. A Capital mais importante do País tem um portentoso poder de aglutinação econômica que mitiga, embora não dissolva, os estragos que produz. Como a base do Ranking de Eficiência dos Municípios é a arrecadação per capita, o poderio da cidade de São Paulo impulsiona políticas públicas nas áreas de Educação, Saneamento e Saúde que definem a métrica. São Paulo é multitemática em geração de riqueza. O Grande ABC é monotemático no escravagismo automotivo.

SANGUESSUGA

Traduzindo em miúdos: São Paulo é espécie de sanguessuga como vizinho incômodo. Todas as atenções se convertem a seu território. O Complexo de Gata Borralheira do Grande ABC não é obra do acaso.

Convém lembrar, também, que, dos 100 endereços mais eficientes do País, apenas uma outra Capital de Estado, Belo Horizonte, consta da lista. Belo Horizonte tem o tamanho populacional do Grande ABC. Vamos tratar disso na próxima edição.

Se o Grande ABC fosse a Cidade de João Ramalho, ou seja, sem o divisionismo territorial autofágico, a realidade do  Ranking de Eficiência Municipal certamente seria outra. É disso que se trata o inconformismo deste jornalista. Um inconformismo inócuo. A besteira foi feita e consolidada. Só não se permite que seja exaltada como peça arrebatadora de inteligência humana.  

A cidade de Botucatu, Interior do Estado, está na liderança do Ranking de Eficiência Municipal. E os três principais municípios da região estão em posições secundárias. São Caetano ocupa a 45ª posição nacional, São Bernardo a posição 234 e Santo André a posição 292. Diadema vem antes de Santo André ao ocupar a posição 175. Ribeirão Pires está na posição 1.982, Mauá na 2.595 e Rio Grande da Serra na distante 3.406.

METROPOLIZAÇÃO INSANA

A principal questão ao se observar o Ranking de Eficiência Municipal, esquecendo-se da febre emancipacionista que redundou em várias enfermidades, é a localização periférica e subalterna do Grande ABC em relação à vizinha poderosa São Paulo. Estamos no furacão de uma das regiões metropolitanas mais insanas do mundo, a chamada Grande São Paulo.

A Região Metropolitana de São Paulo, jamais foi devidamente esquadrinhada pelo governo do Estado, como se não fosse praticamente metade do PIB Paulista. Trata-se de  um contraponto conflitivo quando se tem o Interior do Estado (e também de outras localidades do País) como referencial. Esse interior do Estado não é muito próximo demais de metrópoles menos tormentosas, casos de Campinas, Sorocaba e São José dos Campos. Botucatu faz parte dessa lista, ou mesorregião, como dizem os especialistas.

Decidi que numa próxima edição vou  analisar os números das três mais tradicionais cidades da região, que concentram 70% do PIB (Produto Interno Bruto) regional.  Apenas São Caetano está no que poderia ser chamado de Série A do Ranking de Eficiência Municipal, de Cidade Eficiente. São Bernardo e Santo André estão na Série B, de “Alguma Eficiência”. 

Na sequência, reproduzimos o texto explicativo publicado pela Folha de S. Paulo sobre o Ranking de Eficiência Municipal: 

RANKING FOLHA-DATAFOLHA 

O Ranking de Eficiência dos Municípios - Folha quantifica o cumprimento de funções básicas do município, previstas em lei, segundo os recursos disponíveis. A lógica para o filtro das variáveis leva em conta a confiabilidade das fontes, o potencial de rastreabilidade (disponibilidade dos dados para os mais de 5.000 municípios), a possibilidade de comparação e a facilidade de compreensão dos resultados.

Após consultas com USP, FGV e Insper, além de pesquisas e testes, foram selecionadas, segundo essas diretrizes, oito variáveis, subdividas em quatro categorias —educação, saúde, saneamento e finanças. Em todas elas, considerou-se a taxa de cobertura de políticas claramente vinculadas às atribuições municipais.

Em Educação, foram tomados como parâmetro os percentuais de crianças de 4 e 5 anos matriculadas no Ensino Fundamental e de 0 a 3 que frequentam creches.

Em Saneamento, foram considerados o percentual de domicílios na rede de fornecimento de água e esgoto e os atendidos pelo sistema de coleta de lixo. Na saúde, foi levantada a cobertura por equipes de atenção básica e o número de médicos por habitante no município.

Junto ao Tesouro Nacional, coletou-se a receita per capita dos municípios, dado que, quando utilizada como denominador dos escores de cobertura das políticas públicas das três áreas citadas anteriormente, fornece a métrica de eficiência do REM-F.

Para combinar parâmetros e grandezas tão distintos, utilizou-se a padronização de escalas com base em valores máximos e mínimos, a exemplo do que acontece na composição do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano, da ONU).

Para o cálculo de eficiência, atribui-se peso dois à Educação e Saúde porque ambos os setores têm despesas vinculadas às receitas dos municípios, o que torna o investimento uma obrigação constitucional.



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