Política

Orlando Morando não tem vocação
para ser o Vicentinho dos tucanos

DANIEL LIMA - 31/05/2011

Danado, muito danado esse jovem deputado estadual Orlando Morando. Batedor oficial do governo do Estado no PT do Grande ABC, especialmente de São Bernardo, Morando perdeu as eleições para o comando do Paço de São Bernardo há pouco mais de dois anos mas deixou um recado nas urnas: tem combustível para gastar, não só por conta da idade, mas de um certo arcabouço político-intelectual. Agora, num contexto de euforia dos situacionistas que converge à comemoração antecipada da reeleição de Luiz Marinho, eis que o oposicionista Orlando Morando aparece nas páginas do jornal Diário Regional (numa entrevista de qualidade, juízo de valor à parte) e prega o reio no prefeito petista.


É, convenhamos, uma intervenção e tanto, porque quebra a correia de transmissão de uma onda de entusiasmo com a gestão de Luiz Marinho, opondo restrições que certamente passam a ser consideradas pelo eleitorado.


Não fosse por algumas companhias, como é o caso de Milton Bigucci, presidente da Acigabc (Associação dos Construtores, Imobiliárias e Administradoras do Grande ABC), Orlando Morando poderia sustentar a possibilidade de representar o novo num cenário político que vai muito além das eleições do ano que vem. Juntar-se a Milton Bigucci, duas décadas de inutilidades naquele instituição, não é algo que se coloque no currículo.


Mas Orlando Morando não deve ser condenado por estar tão próximo de um dirigente empresarial muito mal avaliado pelo setor que pensa representar. Provavelmente Morando segue à risca os preceitos de boa-vizinhança sem comprometimentos. Mesmo que caia na gandaia da ingenuidade de deixar-se homenagear pela entidade de Milton Bigucci pouco tempo depois do escândalo de financiamento eleitoral do setor imobiliário na vizinha Capital.
Numa entidade muito frequentada por Milton Bigucci.


O que disse Orlando Morando da gestão Luiz Marinho está no Diário Regional. Não consegui encontrar no site daquela publicação a entrevista impressa na edição de sábado. Se conseguir, acrescentarei ao final deste texto a qualquer momento. O que disse da administração petista não é flor que se cheire. Um contraponto ao odor de rosas campestres que emana do Paço Municipal.


Convenhamos que Orlando Morando é apetrechado. Sabe utilizar-se de fina ironia como poucos na política regional. Lança desconfianças, ergue arremetidas aparentemente mortais, estrutura frases de efeito. Fala com convicção. Destila críticas sem dó nem piedade. Mas não deriva à fulanização. É um batedor de classe. Um tucano da melhor estirpe. Entenda-se por tucano a linhagem de políticos mais escolarizados. Morando parece ter devorado o manual de boas maneiras verbais que os tucanos tanto apreciam, porque o exercita com suavidade cortante.


A intervenção do deputado de São Bernardo, líder do governo do Estado na Assembléia Legislativa, carrega um caminhão de possibilidades de desdobramentos. A principal é que o jogo eleitoral que muitos consideram decidido é um jogo que ainda tem muito tempo de disputa.


Resta saber se Orlando Morando terá coragem de dar materialidade às objeções. Como fazer? Demarcando o terreno aparentemente minado sobre o qual oposicionistas em São Bernardo parecem caminhar, e sair candidato nas próximas disputas à Prefeitura. É possível que não tenha dificuldades para tanto, porque os outros supostos interessados querem mesmo, no fundo, fugir da raia.


Será que Orlando Morando vai se lançar concorrente de Luiz Marinho no ano que vem, sabendo como sabe e todo o mundo sabe e quem não sabe é ruim da cabeça que o ex-presidente Lula da Silva vai estar na trincheira do ex-sindicalista, que o ex-presidente vai peregrinar na periferia de uma cidade cujos problemas sociais estão muito além do que desprezam os engravatados de gabinetes?


Viram como a disputa é inglória? Que qualquer que seja o candidato de oposição o destino cantado em verso e prosa seria de uma nova versão de Vicentinho Paulo da Silva, com troca de sinais partidários?


Explico: Vicentinho Paulo da Silva, já há tempos deputado federal, foi levado ao enforcamento em disputas à Prefeitura de São Bernardo quando o PT se debatia com o governo situacionista de Fernando Henrique Cardoso e não reunia massa de manobra financeira para enfrentamento mais competitivo. Vicentinho, duas ou três vezes candidato ao Paço de São Bernardo, apanhou muito nas urnas.


Será que Orlando Morando será o Vicentinho da vez?


Há quem duvide, porque Morando e Vicentinho são antagônicos. O tucano é mais atrevido, tem conteúdo discursivo muito mais amplo e versátil, conta com o efetivo apoio do governo do Estado, a quem sempre foi dedicado soldado nos piores momentos. E do ponto de vista plástico, é mais palatável. E aqui vai uma pitada de polêmica: Vicentinho é negro, Morando é branquinho.


Orlando Morando, diferentemente de William Dib, outro potencial concorrente oposicionista em São Bernardo, estaria prontíssimo para medir forças com Luiz Marinho. Saberia de antemão que tem escassas possibilidades de vitória. Que provavelmente apanharia muito. Que certamente a eleição terminaria no primeiro turno. Mas que um novo turno estaria no horizonte, em 2016, quando, sem Luiz Marinho e provavelmente sem um candidato petista ou aliado com a imagem tão disseminada, com a memória eleitoral tão aflorada, seria o concorrente principal ao Paço Municipal.


Orlando Morando concorreria com a certeza de que precisaria contar com o imponderável para vencer, mas que perder sem passar vexame de ser goleado nas urnas seria uma maneira de vencer.


Em resumo, Orlando Morando faria da disputa do ano que vem a caderneta de poupança eleitoral de 2016.


Por isso demarca o terreno de opositor empedernido do PT em São Bernardo. Um adversário abusado, manipulador de frases de efeito, bem assessorado, dissimulado como todos que sabem que política não é monastério. Tudo o que o rosto imberbe jamais corroboraria. É um jovem da política com as artimanhas das raposas da política. É uma carne de pescoço para os petistas. E um estorvo para os eventuais planos de 20 anos no poder em São Bernardo.


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