Economia

SÍNDROME DA CHINA
AMEAÇA GRANDE ABC

DANIEL LIMA - 22/11/2024

Para os leitores terem uma ideia de como está desenhado em tintas fortes de preocupação e desalento o futuro do Grande ABC, basta lembrar que só na edição de ontem do jornal Valor Econômico há quatro notícias que deveriam provocar a movimentação de tropas institucionais  para acertar  os ponteiros de alerta sobre o quanto a geopolítica chinesa pode transformar a vida econômica da região em inferno ainda pior.

Transformando tudo o que você vai ler em metáfora, e não se trata de metáfora que force a barra da realidade e das perspectivas de futuro, o que temos são quatro funerais e o impulso a um novo desfiladeiro econômico e social. Quem tem dúvidas sobre o poderio regional de seguir fracassando em políticas estratégicas para enfrentar uma longa jornada infernal, basta lembrar que nada parecia pior depois dos efeitos locais do governo Fernando Henrique Cardoso. Pois é: Dilma Rousseff, com o patrocínio parcial de Lula da Silva de gastanças mil, superou o tucano. Os dados consolidados que produzi ao longo de décadas são inquestionáveis.

Os setores automotivo e petroquímico, que carregam a economia da região nas costas cansadas e velhas de guerra, principalmente de deserções, são alguns dos alvos preferenciais dos chineses. Os chineses são especialistas em trabalho-escravo típico de Estado autoritário. Entretanto, o planejamento centralizado começa a fazer água. É preciso desafogar as veias internas, agora mais preocupadas com o consumo. Há caudalosas sobras que ocupam mares e oceanos  em direção a outros mercados. Brasil, por exemplo.  

GUERRA É GUERRA

Os chineses praticam o que se convencionou  chamar no Brasil de guerra fiscal, no caso especifico guerras tarifárias. Algo semelhante à  guerra fiscal que levou muitas indústrias embora do Grande ABC ao som de do batuque de sindicalistas e de um governo federal incompetente por natureza e safadeza.

Como não temos tropas de inteligência e muito menos operacionais para cuidar do básico da regionalidade no sentido mais chinfrim, vamos perecer, esticando uma escalada que vem desde os anos 1990.

A China é objeto de preocupação de CapitalSocial desde muito tempo. Enquanto isso, metalúrgicos detentores dos salários mais elevados do setor privado da região,  não só desdenham da realidade como criam fantasias.

Uma missão sindical da região esteve recentemente na China e anunciou possíveis investimentos dos anfitriões na região. Como não deram sequência às informações, provavelmente caíram na realidade de que será preciso que joguem no lixo tudo que fizeram ao longo dos anos, greves inclusive, para, como sempre afirmaram, dar dignidade aos trabalhadores diante de “patrões malvados”. Os patrões chineses malvados seriam, por acaso, dignos de idolatrias metalúrgicas?.   

Vamos agora à reprodução seletiva (com garantia de que os trechos não mutilaram o básico para o entendimento da situação) do que o jornal Valor Econômico mostrou ontem em quatro reportagens em páginas distintas: 

PRIMEIRA REPORTAGEM

O jornalista Assis Moreira, correspondente em Genebra, escreveu sob o título “Busca de Monitoramento com China no comércio”. 

 A criação de um mecanismo de diálogo rápido com a China para monitorar disrupção nos fluxos de comércio entrou no radar, em Brasília, refletindo a preocupação com uma escalada de guerra comercial a partir de 2025. As conversas com os chineses ganharam força no pós-eleição de Donald Trump, com as suas ameaças de impor sobretaxas de 60% sobre produtos chineses e de 20% sobre os outros países e o risco de que reproduzidas por outros mercados relevantes. Não se esperava algo concreto, ainda, na visita de Xi Jinping ao Brasil, ontem. Se os Estados Unidos frearem a entrada de parte dos US$ 430 bilhões em produtos que importam da China a cada ano, as empresas chinesas tentarão evidentemente vendê-los para outros países, repetindo uma estratégia bem-sucedida quando Trump deflagrou a primeira guerra comercial, em 2018. Um desvio de comércio já está ocorrendo em carros elétricos. Sobretaxados nos Estados Unidos e na União Europeia, os veículos elétricos chineses tomam o rumo de outros mercados, incluindo o Brasil, deixando parceiros sem contrapartida e a industrialização  na mão de chineses. 

SEGUNDA REPORTAGEM 

A notícia é do Financial Times, de Londres e de  Frankfurt, sob o título “Ford vai cortar 4.000 empregos na Europa. Leiam: 

 A Ford planeja cortar cerca de 4.000 empregos na Europa, enquanto a montadora enfrenta a desaceleração da demanda por veículos elétricos e a competição acirrada com rivais chineses. A empresa americana disse na quarta-feira que os cortes entrariam em vigor até o fim de 2027 e afetariam cerca de 3.000 empregos na Alemanha e no Reino Unido, representando cerca de 14% de sua força de trabalho de 28.000 funcionários na Europa. (...) A indústria automotiva global está sob intensa pressão para fechar fábricas e reduzir o número de funcionários na Europa e em outros lugares, em meio à desaceleração do crescimento nas vendas de veículos elétricos e uma acirrada competição de preços com rivais chineses. A Volkswagen, maior montadora da Europa, também planeja fechar pelo menos três fábricas na Alemanha e cortar dezenas de milhares de empregos devido à forte perda de participação de mercado na China e à fraca demanda por veículos na Europa. (...). Seu presidente executivo Jim Farley, também alertou no passado que a produção de carros elétricos exigiria 40% menos trabalhadores do que veículos movidos a motores de combustão interna. 

TERCEIRA REPORTAGEM

Do Financial Times, a terceira matéria que deveria preocupar e muito o Grande ABC. Sob o título “Xi Jinping supera Joe Biden na batalha pela América Latina”: Leiam: 

 O comércio entre China e América Latina decolou nos últimos 20 anos. Passou de US$ 12 bilhões em 2000 para US$ 450 bilhões em 2023. Pequim é agora o maior parceiro comercial da maioria dos países da região e possui estoque de investimentos que mais cresce (o México, com seu acesso privilegiado ao mercado americano por meio do acordo Estados Unidos-México-Canadá, é uma exceção). Nos últimos anos o foco de Pequim tem sido investir em setores-chave da América do Sul, como a extração de minerais críticos, a geração e transmissão de eletricidade, a infraestrutura digital e o transporte. (...). Parece provável que a volta de Trump à Casa Branca dará à China um papel ainda mais dominante na vida econômica da região. Matias Spektor, da Fundação Getúlio Vargas, de São Paulo, vê poucas chances de Trump  aumentar o comércio e os investimentos dos Estados Unidos na região em um segundo mandato: “As promessas de Trump vão na direção oposta”, disse, argumentando que a retórica dura incrementaria a pressão sobre os países da América Latina para restringirem a presença na China, enquanto Pequim teria um incentivo para sobrar a sua aposta, deixando a política interna da região profundamente dividida. “É o pior cenário possível”, acrescentou. 

QUARTA REPORTAGEM

O quadro se completa com uma matéria produzida em São Paulo, sob o título “Indústria teme aproximação de Brasil e China”. Leiam alguns trechos:  

 Há quase dois meses a Coalizão Indústria, que reúne 14 entidades empresariais vinculadas sobretudo à indústria de transformação, recebia jornalistas para advertir sobre as potenciais consequências de práticas predatórias de comércio exterior detectados em diferentes setores do mercado local. A China foi o alvo principal das críticas, embora outros países tenham elevado embarques ao Brasil. Segundo fontes ouvidas pelo Valor, o que motivou aquela entrevista foi justamente a preocupação de a aproximação entre Brasil e China, com o futuro encontro entre seus chefes de Estado, já anunciado, evoluir para um acordo de livre comércio com o Mercosul. (...). Um representante da indústria resume o momento: “O problema é da indústria em geral. Sem acordo, já vemos entrada excessiva de produtos. Com o acordo assinado, a tendência é de agravamento”. (...) Na química, o imposto de importação de 30 produtos foi elevado de 7,6% a 12,6% para 20% em outubro. As queixas não recaem somente sobre os chineses, embora no ciclo mais recente da petroquímica o excesso de capacidade instalada na China e nos Estados Unidos, combinado a um crescimento menos do que o esperado da demanda sobretudo no mercado chinês, tenha resultado nas piores margens da indústria na história. (...). O Brasil tem a maior produtora de resinas das Américas, a Braskem. O setor segue perseguindo novas medidas de defesa comercial, incluindo a elevação ou novas tarifas antidumping.


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