Política

Lava Jato imuniza candidatos
do PT na região. Por enquanto?

DANIEL LIMA - 10/08/2016

Não podem ser desprezadas duas realidades convergentes que repercutiriam de formas distintas nas disputas eleitorais de outubro na Província do Grande ABC envolvendo candidaturas petistas: a federalização ou nacionalização eleitoral, por conta dos escândalos da Operação Lava Jato vai atingir sim os concorrentes da estrela vermelha, mas a ausência de identificação de delinquências nas administrações petistas sob a alçada da mesma Lava Jato oferece a contraofensiva de imunização do partido em nível regional para abrandar estragos macropolíticos inescapáveis.

Trocando em miúdos, o que quero dizer é o seguinte, segundo a ótica que já aflora nos candidatos petistas às eleições municipais: não podemos pagar pelos pecados dos outros petistas porque somos petistas limpos, conforme está explicitado no enredo da Lava Jato que não detectou qualquer problema a nos envolver, sem contar, também, que candidatos opositores estão agregados a legendas denunciadas pelos federais.

Ainda insisto na tentativa de me fazer entender, porque o assunto é mesmo complexo: fosse eu dirigente petista da região não teria dúvidas em buscar antídotos ao mais que providencial discurso dos opositores de que o partido é uma teia de delinquentes denunciados pela força-tarefa federal. E o melhor antídoto, pelo menos por enquanto, é que nenhum dos titulares dos paços municipais da região que representam o PT, e tampouco dos demais municípios, que pretendem vencer as próximas eleições, passou diretamente pelas garras afiadíssimas do juiz Sérgio Moro.

Negar é muito pior

A pior das terapias eleitorais que o PT poderia adotar na região seria tentar tapar o sol da realidade insofismável com a peneira da demagogia barata, ou seja, negar a influência do escândalo da Petrobras sobre o eleitorado regional, por mais que outros partidos estejam comprometidos com as roubalheiras denunciadas.

O que o PT vai colocar no campo de jogo, como deixou claro o prefeito de Santo André, Carlos Grana, numa entrevista ao Diário do Grande ABC, é a versão de que a disputa municipal não se dará sob qualquer influência da atmosfera nacional. Resta saber se Carlos Grana e os demais petistas vão agir como avestruzes ou vão jogar com as cartas na mesa.

Fosse Carlos Grana, não teria dúvidas em propagar a ideia da imunização dos petistas na Província do Grande ABC, porque é assim que se faz política. Como não sou o prefeito petista, mas sim jornalista, caberia ao autor da reportagem do Diário do Grande ABC o que faço agora, ou seja, interpretar aquelas declarações de Carlos Grana. Deveria o texto ter ido além das declarações, claro.

Carlos Grana faz uso de estratagema da engenharia eleitoral que, repassado literalmente a um veículo de comunicação, ou seja, sem a devida ponderação, como é praxe nos jornais diários impressos, acaba por levar aos leitores uma visão manquitola da realidade conjuntural.

Sociedade acrítica

Esse filtro crítico, marca registrada dessa revista digital, não é, entretanto, extensivo à sociedade em geral, muito menos às camadas mais populares e de menor densidade educacional e de conhecimento agregado. Refiro-me propriamente às periferias das metrópoles, áreas nas quais o PT, com o suporte de Lula da Silva, vai atuar incisivamente para atenuar os estragos do Petrolão. Os nordestes metropolitanos são mais sensíveis ao petismo porque, entre outras razões, o Bolsa Família não é algo que se esquece quando o passado de fome batia à porta.

Como a Província do Grande ABC é um manancial de periferias pouco letradas, de gente que vive para trabalhar e comer e mal dispõe de tempo a uma leitura razoavelmente apetrechada, o corpo a corpo da militância petista deverá sim amenizar os efeitos da Operação Lava Jato – como bem afirmou o prefeito de Santo André que, como o principal adversário da temporada, Aidan Ravin, conhece o cheiro do povo.

Nessa projeção estou sendo generoso com as camadas mais escolarizadas da população regional, supostamente robustas no entendimento das coisas. A classe média tradicional (a outra classe média inventada pelos petistas é uma piada de mau gosto que a recessão tratou de destruir de vez) também tem recheio pronunciado de ignorância ou despreparo a avaliações político-eleitorais. Muitos vão no embalo do que ouve no radio, vê na televisão, lê nas manchetes dos jornais e curte nas redes sociais.

Classe média e periferia

Boa parte da classe média no sentido econômico de ser se assemelha à periferia no sentido intelectual de ser: confia plenamente no que consome de informação sem valor agregado. Ou seja: as declarações de Carlos Grana, candidamente em defesa da imunização do PT no escândalo da Petrobras, faz a cabeça de muita gente como níveis educacionais muito acima do que se encontra nas periferias.

Portanto, até que eventual grande escândalo regional dentro do grande escândalo nacional da Operação Lava Jato atinja algum todo-poderoso da política partidária na Província do Grande ABC, os estilhaços dos federais serão menos intensos do que desejariam os opositores petistas e mais assimiláveis do que imaginavam inicialmente os próprios petistas.

Isto, é claro, se os petistas da região recorrerem para valer à tática de não fugir à transparência comunicativa com a sociedade de que foram colhidos em flagrantes delitos pelos federais em nível nacional, mas são candidatos a diplomas de honestidade ampla e irrestrita porque jamais foram identificados como ramais de roubalheiras ecumenicamente desfrutadas pela quase totalidade das agremiações políticas.

Sei que não faltarão leitores a imaginar que estou a fazer tratado de canonização do petismo na região. Não faltam línguas de trapo e cabeças de bagre a tecer avaliações desgarradas da lógica intelectual.

Possivelmente algum bandido digital usará instrumentos apócrifos para trombetear que este jornalista defende supostos ramais dos quadrilheiros.

Deixem que digam, que falem, deixem isso para lá, vem para cá e leiam bem: tudo isso que produzi está situado no campo do pragmatismo político-eleitoral de quem vive de politica e de eleições. Não é o caso deste jornalista, paradoxal por excelência porque, embora deteste política, devora tudo que se relaciona à atividade.

Querem saber por quê? Porque jornalista não escolhe o prato que vai consumir – apenas o consome avidamente em nome de terceiros que precisam de informação. Mesmo que essas informações sejam eventualmente mal-interpretadas por apaixonados ou oportunistas.



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