Política

Avisei (em 2014) que PT não
faria o sucessor de Marinho

DANIEL LIMA - 18/10/2016

Não sei até que ponto o PT de São Bernardo se fiou na conversa do deputado estadual Luiz Fernando Teixeira sobre as possibilidades eleitorais de Tarcísio Secoli. Em novembro do ano passado, em análise que fiz nesta revista digital, já chamava a atenção para o equívoco do também presidente do São Bernardo Futebol Clube. O resultado é que o PT ficou a ver navios, fora do segundo turno, reservado aos jovens Orlando Morando e Alex Manente. Muito antes das declarações de Luiz Fernando Teixeira, em novembro de 2014, cantei aqui a caçapa de que dificilmente o PT faria o sucessor de Luiz Marinho. Houvesse uma bolsa de apostas eleitorais na região e fosse este jornalista levado a sério, uma bolada estaria garantida. Não cumpri mais que a obrigação de informar em forma de análise. Um artigo raríssimo no jornalismo brasileiro. 

Se como um dos integrantes da elite petista de São Bernardo Luiz Fernando Teixeira tem por padrão histórico de credibilidade a projeção eleitoral que formulou menos de um ano atrás, dá para entender as razões que possibilitariam o deslocamento do partido da etapa decisiva. Um resultado calamitoso na principal cidadela petista.

Afinal, o que disse Luiz Fernando Teixeira em novembro do ano passado quando, um ano antes, eu já alertava sobre o desastre que ameaçava o PT em São Bernardo? Luiz Fernando Teixeira disse o que comentei na edição de 23 de novembro de 2015 sob o título “PT encosta em Manente para enfrentar Orlando Morando”. 

Reproduzo alguns trechos daquela análise. Sim, daquela análise, porque CapitalSocial segue os passos da LivreMercado que criei e dirigi editorialmente por duas décadas: não se conforma pura e simplesmente com a reprodução acrítica de informações relevantes. Muito pelo contrário -- vai fundo na interpretação dos fatos e das versões. Isso desagrada terrivelmente quem só tolera informação oficial, de fontes nem sempre confiáveis como tradutoras do contexto em que vivemos. Vamos então a vários trechos daquela matéria que escrevi em novembro do ano passado: 

 O deputado estadual Luiz Fernando Teixeira disse ontem em entrevista ao Diário do Grande ABC que o PT deverá enfrentar o tucano Orlando Morando no segundo turno das eleições municipais do ano que vem. Tarcísio Secoli é o candidato petista, apoiado por Luiz Marinho. (...). São algumas as explicações à mensagem subliminar da entrevista. (...) Primeiro: ao apontar Orlando Morando como candidato de segundo turno contra o petista Tarcísio Secoli, LFT deixa subtendido que o PT não infligirá a Alex Manente discurso desclassificatório na campanha eleitoral porque o tem como aliado iminente. O grupo de Luiz Marinho e o grupo de Alex Manente têm mais afinidades do que se imagina. Pergunte a quem frequenta o Legislativo de São Bernardo como são as relações de fato, não aparentes, da bancada do PPS, o partido de Manente, e a Administração Luiz Marinho. (...) Manente é visto como companheiro em potencial que precisa ser preservado tanto quanto controlado para não ameaçar a participação do candidato petista no segundo turno. (...). Segundo: ao apontar Orlando Morando como concorrente maior, Luiz Fernando Teixeira sinaliza a ideia de que a cúpula petista em São Bernardo pretende polarizar a disputa pela Prefeitura desde já, de modo a matar a possibilidade de o partido ser superado pelos dois jovens deputados e com isso ficar de fora do segundo turno. É preciso escolher um adversário desde agora para tentar vender a ideia de que o PT não coloca em dúvida a passagem ao segundo turno. Terceiro: ao escolher Orlando Morando como adversário, o PT tem a perspectiva de que, aliado a Alex Manente no segundo turno, jogará o tucano Orlando Morando numa faixa eleitoral conservadora, que seria rejeitada pela coalização com Alex Manente, tido como de centro-esquerda. Daí, a vinculação de Orlando Morando ao ex-prefeito William Dib, que sofre forte rejeição do eleitorado de centro-esquerda de São Bernardo. (...) Não se pode esquecer que Alex Manente apoiou o então candidato Luiz Marinho no segundo turno das eleições de 2008, isolando Orlando Morando, e na eleição seguinte, sem Morando, concorreu sabidamente com Luiz Marinho apenas para marcar presença. (...) Observados esses pontos, não custa lembrar que pesquisas identificam os eleitores menos doutrinados de Alex Manente muito próximos também de Orlando Morando. Seriam 70% do eleitorado de Manente potencialmente favoráveis a Orlando Morando num segundo turno. Até que ponto Manente repetiria o alinhamento com o PT de 2008? Tudo indica que é mais provável que ceda ao petismo, caso fique mesmo fora do segundo turno, mas se manterá discretamente na torcida contra Orlando Morando. No máximo, liberaria apoiadores mais próximos a se juntarem ao candidato petista, não se expondo publicamente. (...). É totalmente descabida a comparação de Luiz Fernando Teixeira, que opõe os votos detectados agora em favor de Secoli aos votos potenciais de Luiz Marinho, manifestados em pesquisas no mesmo período do ano que antecedeu a disputa. O contexto era completamente diferente tanto no ambiente local quanto principalmente nacional. O presidente Lula da Silva, patrono de Marinho, navegava em águas plácidas. Sobre o PT de agora é dispensável utilizar qualquer adjetivo. Tarcísio Secoli também não tem a proeminência pública de Luiz Marinho, o qual ocupara pouco tempo antes o Ministério do Trabalho e o Ministério da Previdência Social. (...) O jogo de compadres de Luiz Marinho e Alex Manente em 2012, antecedido pelo jogo casadinho de 2008, provavelmente não se repetirá no ano que vem. Há uma candidatura agora potencialmente robusta de Orlando Morando no meio do caminho. (...) Como os políticos asseguram que é praticamente impossível Secoli e Manente irem juntos ao segundo turno, porque há faixas eleitorais que se confundem e canibalizam uma das candidaturas, Luiz Fernando Teixeira teria exercitado apenas o óbvio na entrevista ao Diário. E, quem sabe, colocou Alex Manente em posição incômoda como aliado disfarçado de candidato não necessariamente favorável ao petismo, mas discretamente hostil a Orlando Morando. 

Deputado descuidado 

Viram os leitores como o deputado estadual é ruim de avaliação? É claro que todos corremos riscos ao emitir juízo de valor sobre disputas eleitorais. Entretanto, no caso de Luiz Fernando Teixeira, sobram indícios de que naquele novembro do ano passado, quando a Lava Jato já fazia estragos imensos ao PT e a presidente Dilma Rousseff já dava sinais de que poderia dançar o tango antes da hora, no mínimo o deputado subestimou os desdobramentos econômicos e criminais de então. 

É nesse ponto, no ponto das declarações formuladas por Luiz Fernando Teixeira, que o jornalismo moderno deveria entrar em campo. Reproduzir pura e simplesmente informações com cara e corpo de propaganda eleitoral não é o insumo esperado pelos leitores cada vez mais atentos aos embates nas redes sociais. O jornalismo antenado com os novos tempos, tempos em que a personalização informativa não deve ser jogada a escanteio, obrigatoriamente teria de fazer exatamente o que fiz no dia imediatamente posterior às declarações do deputado: ponderar até que ponto suas afirmativas estariam conectadas com a realidade política e econômica. 

Alerta em 2014

Para não dizerem que estou a formular conjecturas como engenheiro de obra feita, recorro ao acervo desta revista digital para mostrar que a caçapa da degringolada petista em São Bernardo era a consequência mais lógica no tabuleiro da baiana de complicações eleitorais. Na edição de três de novembro de 2014 (portanto, mais de um ano antes da entrevista de Luiz Fernando Teixeira ao Diário do Grande ABC, e também do texto que construí no dia seguinte) escrevi uma análise sobre o ambiente político em São Bernardo sob título que, embora encerrado com um ponto de interrogação, dizia praticamente tudo: “PT tem quatro candidatos a um funeral na sucessão de Marinho?”. Reproduzo vários parágrafos: 

 O prefeito Luiz Marinho é o principal derrotado entre os políticos da Província do Grande ABC nas eleições de outubro tanto para o governo do Estado quanto para o governo federal. Só não enxerga quem não quer ou quem aprecia dominar a pauta jornalística, um dos exercícios favoritos dos políticos desse fim de mundo em cidadania. Porque apanhou bastante, o prefeito Luiz Marinho vive uma bananosa de fazer gosto. Por enquanto ele conta com quatro candidatos alternativos à disputa das eleições municipais de 2016. Prevê-se, após a hecatombe do partido na Província do Grande ABC, que ao vencedor da agremiação estará reservado um funeral eleitoral. Ou seja: Marinho não faria o sucessor. É inquestionável que Luiz Marinho viu complicar-se a sucessão municipal, em 2016. A maior prova de que está enrascado é que há candidatos demais para vestir a desgastadíssima camisa vermelha do PT. (...) Quem tem opções em excesso a apenas dois anos da sucessão não tem candidato algum. Mas o prefeito sempre cara de pau virá a público para dizer que há numerosos craques no elenco e, quem sabe, se autoproclamara um Guardiola da política petista. (...) Para começar, entre os petistas que poderiam concorrer à Prefeitura após os oito anos do poste sindical que Lula transformou em prefeito, não existe no momento nenhum minimamente competitivo. Luiz Fernando Teixeira saiu derrotadíssimo das urnas locais, com 38 mil votos. (...) Se Luiz Fernando Teixeira saiu da disputa enfraquecido em São Bernardo, entre outros motivos porque há petistas que o querem longe da cidade, o supersecretário Tarcísio Secoli, aliado da deputada reeleita Ana do Carmo, nem passou pelo teste das urnas. Está certo que não é tão importante assim virar deputado para disputar a Prefeitura, mas há espaços que se perdem. (...) Outro suposto concorrente, segundo especulações sobre quem vestirá a camisa vermelha em São Bernardo como se tudo corresse na mais absoluta normalidade, não uma enrascada de um prefeito superado largamente no próprio quintal, é o ministro da Saúde Arthur Chioro.  Trata-se de profissional acima da média, mas sem bases locais para pleitear a vaga petista. (...) Completando o time dos eventuais concorrentes petistas está Rafael Marques, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, também comandante da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, esse quadradinho do organograma de regionalidade que jamais funcionou e poucas vezes contou com marketing. (...) Há quem duvide que Luiz Marinho tenha competência para articular medidas que possam convergir à escolha de um concorrente sem deixar sequelas de dissidências. Qualquer que seja, a solução não contabilizaria a unidade do partido em São Bernardo, mesmo se considerando que o PT destes dias está sofrendo como jamais na história regional, o que provocaria um abaixar coletivo de narizes empinados. Muitas vezes a solidariedade se dá pela dor da desgraça ainda mais cruel do que a já registrada. (...) A situação que se coloca às próximas eleições municipais em São Bernardo não pode desconsiderar o deputado estadual Orlando Morando e o deputado federal Alex Manente, de expressivas votações tanto dentro quanto fora de casa. Morando se elegeria deputado mesmo sem os votos dos demais endereços paulistas, porque ultrapassou a 100 mil eleitores em Bernardo. Mais que a soma de Luiz Fernando, Ana do Carmo e Teonílio Barba, todos eleitos à Assembleia Legislativa ao buscarem em outros campos o que lhes faltou em campo próprio. (...) Sob a ótica de 2016, Luiz Marinho obteve uma vitória de Pirro ao ver os três concorrentes petistas de São Bernardo garantidos como opositores de Geraldo Alckmin. Nada que tenha fortalecido o partido internamente visando aquele que ocupará cadeira de Luiz Marinho no Paço Municipal. Muito pelo contrário. A vitória quase envergonhada no conjunto dos municípios do Estado não escondeu a frustrante derrota em casa. 



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