Administração Pública

Clube da Saúde vai além
da falta de transparência

DANIEL LIMA - 30/01/2017

Não é única e simplesmente a falta de transparência que colocou a Fundação do ABC (Fuabc) no corredor da morte ética como única instituição de cunho regional que deu certo exatamente porque faz o gosto de quem não tem apreço pelas coisas certas. Por isso o Diário do Grande ABC de hoje foi generoso com essa milionária instituição cuja capacidade de unir gregos e troianos não surpreende. Todos falam a mesma língua de vantagens corporativas, grupais e individuais.  O que chamaria de Clube da Saúde Regional -- para facilitar o entendimento dos leitores -- é um das provas de que contamos com uma sociedade desorganizada. 

Ao alçá-la à manchetaça de primeira página (manchetaça é a manchete principal mais importante de uma edição depois da manchetíssima, que é a manchete das manchetes), o jornal cumpre apenas uma parte de uma operação muito mais profunda e ampla. A Fundação do ABC não peca apenas pela falta de transparência, como afirma o jornal. A falta de transparência é subproduto da imensidão de irregularidades que uma auditoria externa comprovaria sem dificuldades. 

O Clube da Saúde Regional é milionário porque conta com quase R$ 2,5 bilhões das prefeituras de Santo André, São Bernardo e São Caetano para administrar a saúde pública. É dinheiro para ninguém botar defeito. Deveria, por isso mesmo, ser rigorosamente vigiada e questionada por um conselho curador de verdade, que fugisse ao controle do Estado, no caso as três prefeituras. Mas as instâncias que deveriam monitorar a instituição são omissas, quando não cúmplices. 

Críticas em profusão 

Não faltam nesta revista digital matérias sobre as obscuridades da Fundação do ABC. Vou reproduzir em seguida uma lista de algumas matérias que preparei nos últimos anos. Na sequencia, retomo esse comentário: 

 Prefeito de São Caetano vai estourar caixa-preta da Fuabc? 

 Fundação do ABC lubrifica suspeita de que poderia ser uma Petrobras 

 Ninguém tem coragem de abrir caixa-preta da saúde da Província 

 Modelo Fuabc vai às manchetes como síntese da falência da saúde pública 

 Caixa-preta da Fuabc vai crescer com novo contrato de parceria 

 Fuabc manipula pesquisa enquanto esconde buracos 

 Falta Operação Bisturi para acabar com a farra da Churrascaria Fuabc 

 Fundação do ABC não resistiria à auditoria do Ministério da Saúde 

 Entrevista Indesejada quer abrir caixa-preta da Fundação do ABC

Antiga caixa-preta

Perceberam os leitores que leram a manchetaça do Diário do Grande ABC de hoje e passaram os olhos com relativa atenção nos os títulos de algumas matérias da Fundação do ABC editadas desde 2013 que a expressão “caixa-preta” foi utilizada em diversas oportunidades? Pois não existe outra que a substitua sem que se corra o risco de amenizar a situação de suspeição que vai além, muito além mesmo, dos questionamentos do Diário do Grande ABC de hoje. 

Fico particularmente satisfeito com a manchetaça do Diário do Grande ABC porque provavelmente, mais que certo, garantidamente, sem a menor dúvida, deriva das propostas que formulei em 19 de dezembro do ano passado aos então futuros integrantes do Clube dos Prefeitos. Sob o título “Um Observatório para seguir passos do Clube dos Prefeitos”, decidi pela criação de um ramal do Observatório de Promessas e Lorotas, instrumento com o qual monitoro as propostas dos prefeitos da região. Escrevi: “Desta feita teremos o Observatório do Clube dos Prefeitos. (...) Acho que valerá a pena acompanhar as atividades daquela entidade com base num conjunto de enunciados. Inicialmente o Observatório do Clube dos Prefeitos contará com 20 propostas. Poderemos aumentar a lista no decorrer do tempo”. 

Entre as propostas 

Uma das 20 propostas sugeridas aos novos comandantes dos paços municipais refere-se à Fundação do ABC. É claro que não teria cometido o desatino de deixar de lado uma instituição que reúne tanto poder político e financeiro como caixa-preta do setor de saúde. Leiam o que propus antes que o Natal do ano passado chegasse: 

 O senhor tornaria transparente não só a contabilidade mas também os dados de atuação da Fundação do ABC, entidade responsável pelo atendimento de saúde de grande parte da população da região em forma de convênios e cujo orçamento supera todos os municípios individualmente, menos São Bernardo e Santo André? 

Aquelas 20 propostas endereçadas ao Clube dos Prefeitos são uma imensidão de pautas cujo esmiuçar representaria novos tempos na região. 

A cobrança por transparência estampada na primeira página do Diário do Grande ABC de hoje é um primeiro passo, mas temo que, possivelmente por conta de circunstâncias editoriais, não de estrutura editorial, venha a ser descartada mais adiante. 

Defendo o que chamaria de martelamento da agenda jornalística. O que significa isso? Que temáticas importantes para a vida regional sejam persistentemente abordadas, esmiuçadas, questionadas. Só assim, com o volume de informações e o aprofundamento crítico, seria possível romper os grilhões de conformismo que se reproduzem a cada temporada. 

Circunstancial ou estrutural?

A ideia de que uma manchetaça hoje sobre a Fundação do ABC é suficiente para estabelecer imagem de combatividade não resiste ao sentido jornalístico de participar ativamente de transformações. É preciso pegar esse touro de irregularidades à unha – e tantos outros touros de uma tourada em que o toureiro em forma de cidadania sempre perde – e transformá-lo num pangaré de elementos indefensáveis.

A leitura dos links acima é suficiente para inteirar-se do conceito editorial que consolidei sobre a atuação da Fundação do ABC desde que me chamou a atenção o desempenho daquela instituição quase que unanimemente endeusada pelos jornais da região e, lamentavelmente, livre de qualquer investigação do Ministério Público Estadual aqui instalado. Tanto quanto os malfeitores do mercado imobiliário -- apenas para citar um exemplo do que a Província do Grande ABC está a quilômetros de distância dos pressupostos da Operação Lava Jato, um ponto fora da curva da generalizada impunidade que mantêm os bandidos sociais não só à solta, mas cada vez mais abusados. 

A Fundação do ABC é um simulacro de instituição. O jogo de cena que a caracteriza é uma ação de blindagem a proteger mutuamente quem usufrui dos milionários recursos financeiros que alimentam uma regionalidade de araque. 



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