Ex-prefeito de São Bernardo em dois mandatos, ex-ministro do governo Lula da Silva e anunciado preliminarmente candidato ao governo do Estado nas eleições do ano que vem, o petista Luiz Marinho é o sonho de qualquer jornalista sedento por uma fonte oficial de declarações. Marinho é capaz de tudo. Do melhor, às vezes, ao pior, quase sempre. O ex-sindicalista prova na entrevista abaixo (com “meus comentários” a contextualizar as respostas) ao Jornal Periscópio, de Itu, o quanto pode tocar o dedo na ferida dos adversários políticos, como os tucanos de São Paulo, quanto sacrificar-se eticamente, quando se refere ao próprio PT.
Uma das razões que me mantém informado principalmente sobre personagens da região é rastreá-los com o uso de tecnologias de comunicação. Encontrei Luiz Marinho no Jornal Periscópio. E acredito que ganhei na loteria com o adensamento de informações sobre o petista. Por mais que Luiz Marinho seja desbocado e voluntarista, quando dá entrevistas à chamada grande imprensa ele mantém postura menos agressiva. Mas num jornal do Interior do Estado ele soltou a franga. Soltar a franga significa não se autocensurar. Autocensurar significa não dizer hoje o que lhe poderá ser fatal mais tarde.
Os leitores vão entender na sequência por que Luiz Marinho é um prato cheio a avaliações. O petista vai do oito em defesa intransigente da agremiação à qual está filiado, o que é legítimo, aos oitenta da insustentabilidade de argumentos que o colocam numa situação de desconforto junto a eventuais eleitores que poderiam, diante da situação de carnificina da prática política, tê-lo como alternativa de sufrágio.
A seguir, as perguntas do Jornal Periscópio e meus comentários. Preparem-se porque vem bomba.
JP – Saiu na grande imprensa o seu nome como possível candidato a governador. Se for confirmado, como vencer o PSDB?
Há grande possibilidade, mais de 90% que o nome seja eu mesmo. É evidente que todo mundo olha e vê a conjuntura complicada, o massacre que o PT sofreu nesses anos todos, mas eu enxergo que é plenamente possível a gente disputar a eleição no estado com a experiência de ter sido candidato a vice-governador do José Genoíno (em 2002), ter sido prefeito. Venci duas eleições em São Bernardo do Campo, fiz uma gestão bastante reconhecida na cidade. Mas se nós temos problemas, os adversários também têm muitos problemas, entre eles toda uma denúncia e todo um sentimento de corrupção no Estado de São Paulo, no metrô, no Departamento de Estradas de Rodagem, nas estações de trem, os problemas da educação, da saúde, problema de corrupção na merenda escolar na rede estadual, enfim, tem um conjunto de problemas aí. E, além disso, há indefinições de rumos de candidaturas e candidatos, quem será o candidato do PSDB. O Márcio França, atual vice-governador, tudo indica que ele será candidato a governador na reeleição, então é uma força a menos do lado deles, é possível que a confirmação de um Doria como candidato a presidente venha também fazer estragos na base de ostentação do PSDB de São Paulo. Enfim, você tem um monte de circunstância colocada nessa disputa e pode estar aí a grande chance do PT de estar no segundo turno. Nós queremos ter a chance de governar São Paulo, até porque o PSDB governa São Paulo desde seu nascimento.
Meus comentários
Luiz Marinho tem uma tonelada de razões para imputar ao governo do Estado embaraços no campo ético-administrativos distante de um Brasil diferente do que se pretende. Entretanto, por mais legítimas e fundamentadas que sejam as críticas, o candidato petista ao governo do Estado não pode desconsiderar um fator mais grave: as lambanças denunciadas e apuradas que impactam o Partido dos Trabalhadores. No Campeonato Estadual e no Campeonato Nacional de escândalos, apurados ou não, há constatação inegável de que o PT praticou mais estripulias e, por isso, mais sofre restrições do eleitorado. Marinho precisa torcer para que, nesse jogo de imundícies, que já foi muito mais desfavorável ao PT, algum equilíbrio se estabeleça com comprovações e punições aos tucanos paulistas. O que, convenhamos, não é tarefa fácil. Afinal, o PT parece ter-se tornado imbatível na modalidade e os tucanos paulistas usufruem de regalias diversas que inibiriam providencial e devastadora etapa paulista da Operação Lava Jato.
JP – Foi uma conjuntura de erros do PT e possíveis ataques sofridos pela mídia e outros setores que culminou nessa situação de descrédito do partido atualmente?
Na medida em que você permite que fiquem falando mal de você todo dia, batendo em você todo dia, tem mentira que começa a parecer verdade. Uma das questões era: “tira o PT e a Dilma do governo que as coisas se resolvem”. Aí botaram o Michel Temer, o Geddel das malas de mais de 50 milhões de reais guardados em um apartamento. Então essa é a banda? Pelo amor de Deus, né, não se compara. E mais, a Dilma foi tirada não é por corrupção, foi por ter pedalado fiscalmente de uma gestão para outra para garantir o financiamento do PRONAF. Ou seja, rasgaram a Constituição para botar um bando de gatuno no Palácio do Planalto. Então isso ajuda a população a refletir também: “espera um pouquinho, estão batendo no PT, mas durante o PT tinha emprego, tinha crédito, tinha vaga no PROUNI, no FIES, tinha o Ciência sem Fronteira para a juventude se formar, se preparar”.
Meus comentários
É claro que Luiz Marinho distorce fatos econômicos e suas consequências à aplicabilidade de programas do governo federal quando joga a bomba da recessão no bando, segundo ele, que sucedeu à puríssima, segundo ele, ex-presidente da República, Dilma Rousseff. Trata-se de descarada afronta aos fatos e à história. Claro que seria demais esperar de Luiz Marinho a verdade cristalina de que está na gestão petista, a partir do consumismo desregrado e eleitoreiro do ex-presidente Lula da Silva, a origem dos desequilíbrios que levaram o Brasil à maior contração econômica da história. Luiz Marinho pratica o jogo de avestruz tanto no campo político quanto econômico. O PT e a coalizão de partidos que lhe deram sustentação ao longo de 13 anos, sobretudo o PMDB de Michel Temer, são farinhas do mesmo saco. Com a diferença de que o saco petista é mais insidioso no sentido ideológico da expressão, porque representa a antítese do socialismo democrático.
JP – O senhor foi sindicalista por muito tempo, teve sempre proximidade com a CUT. Como o senhor acompanha todas essas reformas impostas pelo governo?
Eu creio que o movimento sindical está numa encalacrada muito grande, porque a reforma trabalhista somada com a lei da terceirização é oficializar o fim do trabalho regulamentado. Isso é muito preocupante em um país que nós temos trabalho escravo. Não é um país do tamanho da Suécia, da Bélgica que você olha de um lado para o outro e vê a divisa, nós estamos falando de um país continental, nós estamos falando de um país que tem um estado do Pará que é muito maior do que muitos países juntos. Nós estamos falando de um país que tem desde sindicato altamente organizado, para sindicato frágil para ausência de sindicatos. Então, a Justiça do Trabalho, os contratos formais, a legislação trabalhista são peças fundamentais na garantia do emprego de qualidade. É balela falar que isso é para poder gerar emprego. Não tem um empregador que contrata mais porque vai pagar menos, ele só contrata mais se o seu produto estiver vendendo mais. Para vender mais nós temos que estruturar a economia, é pela economia que passa o debate, não é pelas relações fragilizadas do trabalho. A Globo encomendou o fim do contrato do trabalho CLT.
Meus comentários
O ex-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e da CUT (Central Única dos Trabalhadores) já não parece tão dogmático quanto no passado. As críticas à reforma trabalhista são uma forma de manter contato com as bases populares doutrinadas aos embates com o capital. Luiz Marinho enxerga fantasmas como todo esquerdista apegado ao corporativismo trabalhista. A proporção majoritária de trabalhadores fora do mercado de trabalho formal e a horda de desempregados e subempregados parecem não sensibilizar o candidato petista ao governo do Estado como constatação de que, independente do novo modelo trabalhista, o até então vigente não domou a fera ferida de desigualdades que se agravam na medida em que trabalhadores de primeira classe, como os das montadoras de veículos da região, correm em raia totalmente distinta dos demais e, por isso mesmo, geram distorções que comprometem o equilíbrio geral das empresas. Ou seja: o modelo trabalhista cultivado por Luiz Marinho e sua turma na Província dos Sete Anões, outrora Grande ABC, está longe de ser a solução à competitividade econômica e à harmonia social. A derrocada da Província é prova disso.
JP – O senhor percebe um crescimento de uma “direita reacionária” ou isso sempre existiu e agora, com as mídias sociais, é que esse discurso aumentou?
Na verdade, eu acho que isso sempre existiu, aquela coisa que fica encoberta, por baixo do lodo e na hora que se sente à vontade ele sai e tira a cabeça para fora levado para esse momento de grande articulação para cassar a Dilma e criar uma verdadeira pregação de ódio. E na pregação de ódio esse tipo de mentalidade floresce com todo vigor e tão barulhento que parece que é mais do que são. Eu acho que esse tipo de candidatura não tem a mínima chance de ser vitoriosa no país, então, um Bolsonaro da vida, tem voto para ser eterno deputado, mas não vejo ele sequer senador da República, quanto mais presidente da República. Acho que é uma visão que não representa de forma majoritária a sociedade brasileira, a não ser que caia em uma situação como foram as eleições de 2016, onde a grande maioria faça a opção de não participar do processo e vá para a abstenção de brancos e nulos e aí pode surgir uma mentalidade doentia dessa aí, mas sinceramente não vejo que isso vá prosperar, apesar de às vezes até assustar.
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A incubadora do direitismo extremista de Jair Bolsonaro foi a administração federal do Partido dos Trabalhadores. O pregador de medidas extremas e bem ao gosto de quem detesta o contraditório e as mudanças do mundo é filho legítimo do lulismo que desencadeou no mais sistemático esquema de corrupção do País e as consequências determinadas pela intervenção não de militares saudosos dos tempos do Regime Militar, mas da Operação Lava Jato predominantemente de jovens inconformados com a transformação da política em uma grande rede de prostíbulos estatais e privados.
JP – Como o senhor enxerga o atual panorama da Operação Lava Jato?
Veja, o único ponto positivo que se tem é chamar a atenção, botar luz sobre o debate da corrupção em todos os níveis para, quem sabe, surja disso o mínimo de resultado positivo que cada cidadão e cidadã do nosso país reflita sobre si próprio, qual o teu comportamento do dia a dia com filho, em casa, na relação com a família, na relação com o vizinho, da relação no estádio de futebol, da relação na fila do banco, na fila da padaria, enfim, porque o furar fila é também um comportamento inadequado. Enfim, isso serve para essa reflexão. Agora, ele fez um estrago na economia brasileira que nós vamos levar uma década para recuperar, isso se conseguirmos recuperar.
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Assim como não faltam jornalistas patéticos que atribuem a crise política nacional à Operação Lava Jato, porque se mostrou que os bandidos sociais não estão apenas à esquerda do espectro político-ideológico, não faltam trombeteadores como Luiz Marinho a desfraldar a bandeira da crise econômica por conta da força-tarefa que acabou com a farra de corrupção de centenas de agentes públicos e privados que transformaram o governo federal, principalmente, numa pista de lançamentos de novas modalidades de gatunagem. Quem deixou o País em petição de miséria com pedaladas fiscais, as quais estão na raiz da trombose econômica agora em fase de leve recuperação, foi o governo petista a partir do desprezo olímpico aos sinais de que seria impossível manter gastos públicos ante a contração internacional dos preços de commodities e também aos avanços populistas de programas sociais e benesses econômicas.
JP – O senhor se refere ao juiz Sergio Moro?
A Operação Lava Jato de maneira geral, e o Moro tem grande responsabilidade porque ele é o grande capitão desse processo, é o grande general desse processo junto com o (procurador Deltan) Dallagnol e companhia limitada fizeram uma arquitetura que desmontou empresas, que está desmontando a engenharia nacional. Eu chego a duvidar se não está a serviço de visão internacional, porque as engenharias brasileiras, de maneira geral com suas construtoras, vinham deixando as construtoras americanas no chinelo, vinha avançando globalmente, tornando grandes empresas globais. Isso vale também para outros segmentos brasileiros. O que está virando a engenharia brasileira? Estava criando condições de competir até com os gigantes chineses, agora está virando pequenas empresas, empresas de fundo de quintal de novo. Isso é um grande prejuízo para o emprego para o Brasil. Ataca o problema, mas preserva o ativo econômico. Se você olha o quanto que eles falam que recuperaram de recurso da Petrobrás é uma gota no oceano perto dos prejuízos causados pelo desemprego gerado e essa doença, esse ódio na sociedade brasileira que se gerou.
Meus comentários
Seria importante que Luiz Marinho tivesse a coragem de repetir as estultices acima durante o programa eleitoral de televisão. Nada mais revelador da visão entorpecida sobre economia e o quanto sustenta cegueira à realidade dos fatos. É impressionante o alheamento ou a cara de pau, quando não a desfaçatez, de um agente público diante de escândalos mais que inquestionáveis na esfera federal, principalmente a partir dos tentáculos da Petrobras.
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