O tempero da baiana do resultado de um jogo não pode esconder o sabor de perspectivas no campeonato. Por isso, o São Caetano não deve ficar lamentando o gol sofrido já na prorrogação e a perda de dois dos três pontos praticamente contabilizados na Série B do Campeonato Brasileiro. O único representante do Grande ABC na competição mostrou algo que lhe faltou durante todo o Campeonato Paulista, quando terminou em nono lugar, fora dos mata-mata: evolução em relação às partidas anteriores.
Quem acha que isso é pouco é porque não entende bulhufas de futebol. Evolução dentro de campo é como evolução na passarela carnavalesca: ajuda a fazer a diferença no resultado final. No futebol, mais que na avenida temporariamente curta, o médio e o longo tempo distinguem ainda mais competentes de incompetentes, os acertos dos desacertos.
Aos poucos o São Caetano assume perfil técnico-tático que tem tudo a ver com o treinador Márcio Goiano, comandante do Figueirense à Série A no ano passado. É uma equipe que aos poucos se encaixa e que por isso mesmo deve torcer para que os jogos sejam disputados duas vezes por semana porque, diferentemente de tantos outros concorrentes, tem banco de reservas para reposições que pouco atrapalharão o conjunto.
Provavelmente o árbitro Guilherme Cereta está interessadíssimo em testar os reservas de luxo do São Caetano. Nada mais que essa projeção para tentar explicar as razões de ter aplicado seis cartões amarelos aos jogadores do Azulão no primeiro tempo. Quase todo o time ficou pendurado. Mas nada que inibisse a dedicação do grupo no segundo tempo, quando, agora, Cereta direcionou a bateria de amarelos à Ponte Preta, com quatro punições.
O São Caetano só deixou acontecer o empate ontem à noite porque subestimou a Ponte Preta. Num jogo que é um clássico entre equipes de porte médio do futebol brasileiro, não tem sentido desprezar a cautela, como não tem sustentação ser cauteloso o tempo todo.
O placar de 1 a 0 deveria ser preservado com um certo cuidado defensivo mais agudo depois dos 30 minutos do segundo tempo, quando se esperava a Ponte Preta mais decidida ao ataque. Um terceiro volante, como Souza, em substituição a um Nunes cansado, seria uma troca providencial. Márcio Goiano preferiu colocar um atacante jovem, rápido e descansado no lugar de Nunes. Ao menos se Túlio, o menino que entrou, cuidasse dos avanços do lateral Uendel, que fez o gol de empate numa jogada de laboratório, a mudança teria tido validade tática.
É claro que não se pode tirar os méritos da jogada que redundou no empate da Ponte Preta, treinada exaustivamente, mas exatamente porque é conhecida não poderia servir como salvação da lavoura da equipe de Campinas nos minutos finais. Um cuidado maior — e um terceiro volante trataria melhor da cobertura a Arthur — teria sido suficiente para aplacar o ataque pontepretano.
O resultado acabou injusto porque, mesmo com a Ponte Preta se soltando mais no final, o São Caetano tinha o controle tático do jogo. Aliás, o teve durante todo o jogo, mesmo no período, até por volta de 20 minutos do primeiro tempo, em que encontrou mais dificuldades para organizar-se. Três gols perdidos no segundo tempo foram demais para um jogo de forças equivalentes.
A principal característica que o São Caetano de Márcio Goiano está esculpindo é a simplicidade mesclada com objetividade. Há menos firulas e mais verticalidade nas jogadas. Os zagueiros internos Eli Sabiá e Anderson Marques parecem irmãos siameses no pensamento e nas ações. Os laterais Arthur e Diego avançam com mais desembaraço e cobrem com mais atenção, porque sabem que os volantes Ricardo Conceição e Augusto Recife estão conscientes de que têm de dar cobertura defensiva. Ailton e Fernandes movimentam-se intensamente no meio campo e se apresentam como opções de finalização. Os centroavantes Nunes e Eduardo se doam o tempo todo, em sincronismo com primeiro e segundo atacantes.
O São Caetano é um grupo que oferece a perspectiva, o horizonte, de dias melhores no Campeonato Brasileiro. A competição envolve 20 equipes, por isso mesmo torna difícil o acompanhamento dos preparativos e dos jogos de todos os concorrentes, mas é certo que não seria exagero afirmar que o caminho está sendo trilhado com desenvoltura. Há pecados que precisam ser corrigidos, como ainda um excesso de passes errados, mas nada que remeta às oscilações da equipe do Campeonato Paulista.
O empate com a Ponte Preta não foi um resultado qualquer. O São Caetano confirmou um estado de espírito coletivo que tem tudo para dar frutos na competição. Basta enxergar a disputa como uma maratona, não uma corrida de fundo. A impaciência, nesse caso, é inimiga da progressão. A diretoria do São Caetano já está calejada para assimilar o golpe do empate.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André