Por mais que o São Caetano não tenha, guardadas as devidas proporções, a institucionalidade e craques como Ganso e Neymar, ouso afirmar que ver a equipe da região rebaixada à Série C do Campeonato Brasileiro é tão inviável quanto acreditar que o Santos festejará o centenário no ano que vem na Série B do Campeonato Brasileiro. Mas é melhor se organizarem. Quem tem rodagem em rebaixamento, mesmo como torcedor, sabe que o monstro é dissimulado, persuasivo, encantadoramente mortal.
Rebaixamento é uma jornada de muitos capítulos. Tem certo parentesco psicológico com as telenovelas. Torcemos para valer por determinados personagens, esperando que se deem bem no último capítulo. A diferença é que as telenovelas costumam ser mais generosas com os heróis e implacáveis com os vilões. Sobretudo nestes tempos do politicamente correto.
Dar uma banana aos telespectadores, como há duas décadas em O Astro, protagonizado por Francisco Cuoco, seria mais que contraproducente. Chega o que já ocorre no mundo real, de escândalos sobrepostos por escândalos.
Quem entende um tiquinho de futebol sabe que o São Caetano tem um elenco tão qualificado para a Série B que a classificação atual, em antepenúltimo lugar, apenas 19 pontos conquistados, muito longe do agrupamento das equipes que sonham com a Série A, não é nada natural.
Afora os variados motivos sempre disponíveis no embornal de quem se autoproclama especialista em crises, o que pesa para valer na campanha decepcionante é a dificuldade que tanto Márcio Goiano quanto Oswaldo Vadão Alvarez registraram na condução da equipe. Vadão repete os problemas do antecessor. O São Caetano não encontra encaixe tático flexível, que lhe permita jogar de acordo com as circunstâncias.
Parece simples jogar de acordo com as circunstâncias, mas não é. O óbvio nem sempre está disponível na prateleira de praticidade, mesmo a inteligências e competências comprovadas. O estresse dos 90 minutos muitas vezes dá um nó nos treinadores, que transitam entre a paralisia e a apoplexia.
Num mesmo jogo é possível que se recomende ao treinador a aplicação de medidas que passaram longe da cenarização preparatória, uma das maneiras de não se surpreenderem com as acidentalidades naturais do esporte.
Dou um exemplo prático: a vitória do Corinthians no meio de semana ante o Atlético Mineiro, em Ipatinga.
O técnico Tite saiu da beira do gramado ao final do primeiro tempo com dois a zero no lombo e a cabeça quente de quem sabia que estava numa enrascada que poderia comprometer ainda mais a autoconfiança da equipe nos jogos seguintes, já que a perda da liderança parecia inadiável.
O que fez o treinador do Corinthians no intervalo do jogo? Surpreendeu todos que o consideram previsível demais, sempre com adequações conservadoras: deslocou o lateral Welder à posição de origem, na direta, já que estava improvisado na esquerda, cobrindo a ausência do titular e do reserva imediato, contundidos. Também recuou o posicionamento do múltiplo Jorge Henrique, que passou a atuar como lateral-ala. Para completar, acrescentou um atacante para dividir a preocupação dos zagueiros do Atlético Mineiro com Liedson. A entrada de Emerson Sheik foi o divisor de águas do jogo, porque quebrou a marcação do adversário, mas nada seria possível sem a mobilização de toda a equipe. O Corinthians foi ao ataque.
Quem imaginava que Tite se acomodaria com a virada no placar, voltou a cair do andaime: ao notar que o técnico Cuca, do adversário, tentou uma última cartada, colocando um atacante para arriscar tudo nos últimos 15 minutos, já que a desvantagem no placar e a inferioridade numérica provocada com a expulsão do zagueiro/volante Rever reduziram a potencialidade do Atlético, Tite substituiu o cansado Liedson pelo volante Edenilson. A proteção da defesa e os contragolpes redundaram na possibilidade do quarto gol, que Alex desperdiçou em cobrança de pênalti.
Está faltando ao São Caetano de Vadão a percepção das circunstancialidades. Há situações em que o ataque a qualquer custo é o último recurso, mas também não faltam casos em que fechar-se em copas é questão de sobrevivência. Jogar o tempo todo no mesmo ritmo, como fez o São Caetano diante do Náutico e em outros jogos, facilita a tarefa do adversário. O previsível é menos sujeito a surpresas.
A exceção que confirma a regra é o só aparentemente monotemático Barcelona de Messi. A comparação não vale, porque o Barcelona não joga futebol. Ou melhor: é o único time de futebol do mundo. Os demais pensam que jogam futebol.
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