O problema do São Caetano na Série A do Campeonato Paulista não é só a ausência de um centroavante confiável, desses que os zagueiros temem para valer, não desses que só são centroavantes no número nove da camisa. O problema do São Caetano passa por fatores técnicos e táticos, além de emocionais e de personalidade grupal. O São Caetano apequena-se ante os pequenos e acredita que recompensa as falhas ante os grandes, quando se agiganta. Essa dualidade de Davi versus Golias, essa Síndrome de Davi versus Goiás é má companhia. Classificação à fase final do campeonato se dá principalmente pela regularidade.
O futebol convencional não abdica de centroavante que fica o tempo todo na grande área à espera de contribuição coletiva e que, por ser especialista em arremates com os pés e muitas vezes com a cabeça, por saber distinguir um espaço mínimo para suplantar a marcação, por entender toda a mecânica de antecipação aos botes dos zagueiros, por decodificar automaticamente a velocidade e a distância a percorrer para encontrar-se com a bola para um arremate, por tudo isso é chamado de matador, de goleador, dessas coisas que a história do futebol consagrou.
Então, centroavante de verdade faz falta sim ao São Caetano como a qualquer time terreno, não ao Barcelona, que, todos sabem, é de outra galáxia. Como não dá para ter romantismo no futebol e imaginar um São Caetano dar certo sem centroavante, como tem atuado nos últimos jogos que não deram certo, é melhor mesmo colocar as peças nos devidos lugares. Centroavante faz falta ao São Caetano e à maioria das equipes porque os treinadores são acomodados ao transferirem a responsabilidade de finalizações a quem carrega o número nove às costas e, subsidiariamente, aos demais. Quando o centroavante vai bem, o técnico se consagra. Se vai mal, cai em desgraça.
Há diversas tipologias de centroavantes, mais técnicos e menos técnicos, mas no fundo eles são semelhantes: depositam as esperanças de vitorias. No caso do São Caetano, o técnico Márcio Araújo tem procurado compensar a ausência de centroavante com revezamento que conta com o sempre mobilizador Geovane, o finalizador Isael e o meia-atacante Marcelo Costa. Os demais, laterais, meias e volantes, aparecem como complementaridade.
Nas primeiras rodadas o São Caetano contou com centroavante de verdade, pelo menos no estilo. Betinho ficava muito isolado entre os zagueiros porque o time atuava com três volantes, um meia na articulação, Marcelo Costa, e um atacante que recuava até a intermediária, Geovane. Como os laterais não mantiveram frequência ofensiva constante, tanto nas escalações com Betinho como mais recentemente, de Geovane e Isael mais avançados, deram-se as mesmas complicações: a previsibilidade ofensiva facilita o sistema defensivo que os adversários geralmente opõem quando jogam
Tudo isso quer dizer o seguinte: com centroavante de ofício, qualificado ou não, ou com atacantes móveis, a tentar jogar em espaços vazios, o São Caetano encontra muitas dificuldades ofensivas porque não se mobiliza coletivamente. Mesmo com a retirada de um terceiro volante, a beneficiar a armação do meio de campo, que passou a contar há algumas rodadas com Ailton, um meia que sabe descobrir espaços, o São Caetano ainda não deu sinais de confiabilidade ofensiva. Melhorou, é verdade, mas não oferece a garantia de que perturbará constantemente os zagueiros adversários.
Com um sistema baseado no 4-3-2-1 ou no 4-2-2-2 o São Caetano acumula déficit ofensivo na Série A do Campeonato Paulista. Fosse a origem apenas a ausência de um centroavante de fato, o horizonte seria menos reticente. Entretanto, não é apenas esse o caso. Um centroavante bom de bola deve desafogar as mesmices da equipe com oportunismo, sem dúvida, mas não resolverá a equação, que consiste em dar maior operacionalidade coletiva ao grupo.
A divisão tradicional de ataque e defesa é coisa do passado quando se analisa futebol. Sistema ofensivo e sistema defensivo são conceitos que sintetizam a essência desse esporte, inclusive para abrandar conjecturas que instalam a função de centroavante imprescindível a jogador específico. A dinâmica do jogo pode proporcionar a ocupação daquele espaço vital de conclusão a outros jogadores senão com a frequência dos especialistas mas de forma complementar significativa, surpreendendo os adversários. As arremetidas de meias, de volantes, de laterais/alas, sempre em sincronia, costumam dar resultado inclusive a equipes que contam com centroavante de ofício de rendimento abaixo do esperado como finalizador, mas importante no envolvimento da marcação adversária com movimentação permanente entre os zagueiros.
A centralidade dos centroavantes, portanto, deve ser retirada do escopo específico de finalização, de complementação, para estar a serviço do conjunto. Quando essa roda-viva apresenta algum emperramento, das duas uma: ou o centroavante não é de nada ou seus companheiros não contam com técnica ou obra conjunta para explorarem a arquitetura defensiva montado pela equipe adversária.
Entre os dois modelos consagrados de centroavantes, de letalidade individual que absorve o direcionamento tático e os bons resultados de um time ou de colaboração intensa à efetividade dos demais companheiros de jogo, contribuindo em escala menos opressiva às vitórias, uma terceira vertente consagrou-se nestes tempos, remetendo a raros e menos extraordinários exemplos ao longo da história, caso da Seleção Brasileira tricampeã do mundo em 1970 com um falso centroavante chamado Tostão. Estou me referindo, é claro, ao Barcelona do centroavante Messi, do meia Messi, do ponta Messi, do articulador Messi, do goleador Messi.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André