O São Caetano que joga esta noite uma nova partida decisiva pela Série B do Campeonato Brasileiro (enfrenta o Vitória em Salvador pela 33ª rodada do segundo turno) livrou-se do peso do técnico Emerson Leão. A demissão do treinador, consumada ontem de manhã, mostra que a direção do clube não quer mesmo correr riscos. Corria com o antecessor de Leão, Sérgio Guedes, por isso o trocou pelo ex-goleiro da Seleção Brasileira. E corria também com a manutenção de Leão, cujo prazo de validade é conhecido pela dificuldade de relacionamento interpessoal. Leão caiu porque esgotou o repertório autocrático antes do previsto. Imaginava-se que, ao ser contratado, ele chegaria com alguma folga até a última rodada da competição.
Emerson Leão deixou um legado numérico discretamente superior ao do Sérgio Guedes. Guedes caiu em 30 de agosto com um currículo de nove vitórias, sete empates e duas derrotas em 18 jogos, com índice de aproveitamento de 62%. Leão dirigiu o São Caetano em 12 jogos, com sete vitórias, três empates e duas derrotas, com 66% de aproveitamento. O que sobrava ao primeiro em fair-play, de companheirismo no relacionamento com o grupo de atletas, sobrava em intolerância e radicalismo em Emerson Leão. Há um vácuo de meio termo entre os dois treinadores que poderia ser o ponto de equilíbrio emocional, técnico e tático da equipe. Algo que o São Caetano não mostrou seguidamente na competição. E não é por falta de jogadores, porque jamais na Série B a equipe contou com tantas opções praticamente do mesmo nível.
É claro que pesou na balança da demissão de Emerson Leão o esgarçamento das relações com boa parte do elenco, mas não foi só. Os métodos de treinamento atentamente observados deixaram a desejar. Se Sérgio Guedes não deu ao São Caetano um sistema ofensivo confiável, porque à combatividade da marcação se contrapunha uma obviedade ofensiva de poucas alternativas, Emerson Leão conseguiu desmontar a segurança do sistema defensivo sem oferecer compensação ofensiva da mesma intensidade.
Erros de avaliação
Algumas bobagens do treinador custaram caro não só dentro de campo mas também no espirito cooperativo do grupo de jogadores. Não é possível considerar apropriado e muito menos pragmático o esquecimento de dois laterais-direitos de ofício, casos de Samuel Xavier e Samuel Santos, e deslocar à função, em vários jogos, um volante de 34 anos, sem velocidade, sem cacoete para a função, caso de Augusto Recife. O gol sofrido ante o Ipatinga, na última terça-feira, quando Augusto Recife posicionou-se como volante em vez de lateral, revelou o desastre de improvisações.
Emerson Leão também escalou em vários jogos o lateral/ala Fabinho no lugar de Diego. Melhor ala do Campeonato Gaúcho desta temporada, Fabinho precisa de liberdade para ser útil à equipe. Para tanto, a melhor alternativa é a equipe contar com três zagueiros. Leão o escalou como ala contando com apenas dois zagueiros. O São Caetano virou uma avenida pela esquerda. Todas as deficiências de Fabinho como marcador foram desnudadas e pouco se aproveitou de Fabinho como apoiador. O temor de ser acusado de responsável pelos contra-ataques dos adversários o tornava reticente, incompleto.
Outros erros de avaliação foram cometidos por Emerson Leão ao longo dos 12 jogos. O São Caetano não registrou alguns requisitos básicos para quem ter pretensões e qualidades individuais para chegar à Série A. Os resultados começaram a se deteriorar porque o esfarelamento tático se instalou. O distanciamento entre os setores aumentou a cada jogo, à falta de compactação. O que dizer então da esqualidez ofensiva, com a concentração de jogadas em poucos jogadores? E a barafunda de excesso de lançamentos, de bolas divididas, sacrificando a aproximação, a transposição em combinações de duplas e trios pelas extremidades e pelo meio? Enfim, Emerson Leão não ofereceu ao São Caetano um padrão de jogo minimamente confiável.
Prevaleceram nos resultados do São Caetano com Emerson Leão a qualidade individual e o empenho. Até que começou a fase de declínio de rendimento. Os estragos fora de campo contaminaram o time dentro de campo. O São Caetano dos últimos jogos era um time sem alma, sem confiança e incapaz de jogar no mesmo tom durante pelo menos metade do tempo de cada jogo. A falta de concentração é a explicação para tamanho desequilíbrio. Numa fase em que as equipes são rastreadas em todas as potencialidades positivas e negativas, o São Caetano parecia alheio à necessidade de espionar os adversários. O Ceará fez a festa com o lateral-ala Apodi ante um São Caetano negligente na marcação. No jogo seguinte, empate com o Barueri, o centroavante Magrão, 1,90 metro, foi o centro da maioria das combinações ofensivas do adversário. Leão demorou para descobrir o óbvio.
Indolente com Márcio Araújo, treinador que antecedeu a Sérgio Guedes e que dirigiu a equipe por quase 40 jogos, o São Caetano parece ter aprendido uma lição de valor exponencial numa competição em que subir tem um significado especial: é preciso detectar (e reagir) a tempo a existência de complicações no circuito que abastece o rendimento da equipe em campo. Com Sérgio Guedes faltava ordem e disciplina, instauradas por um especialista de efeitos temporários como Emerson Leão. O problema é que Leão intensificou um perfil que já não combina com as mudanças comportamentais que precisam ser avaliadas com sensibilidade e capacidade resolutiva. Leão é preto no branco sem intermediações cromáticas.
O São Caetano não perde nada com a saída de Emerson Leão porque com Emerson Leão muito provavelmente não tiraria o Atlético Paranaense do caminho, na luta pela quarta vaga. Com um interino ou uma reposição que leve em conta principalmente a restauração do ambiente interno do grupo, o São Caetano ao menos resgata a esperança de que pode recuperar a potencialidade individual e coletiva para chegar à Série A.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André