A mais que esperada retirada da cena esportiva do Saged (Santo André Gestão Empresarial e Desportiva), empresa que terceirizou o futebol do Ramalhão em meados de 2007 e que entregou a rapadura formalmente nestes últimos dias, vai deixar um rastro de prejuízos que somente o tempo atenuará.
Mais que a caixa-preta do déficit acumulado, uma enormidade quando confrontado com o potencial orçamentário da equipe, vão pesar mesmo na condução da agremiação que voltou ao ninho do Esporte Clube Santo André os estragos na imagem. O modelo diagramado pelo então presidente do EC Santo André, Jairo Livolis, foi destruído pelo centralismo autoritário do empresário Ronan Maria Pinto. Tanto fora como dentro de campo o Ramalhão é um renegado social. A sociedade não só ignora a agremiação como lhe oferecerá muita resistência a eventuais chamamentos. Os torcedores organizados são seu único patrimônio latente. Os demais envelheceram, se decepcionaram e estão céticos.
O jornal ABCD Maior publicou uma matéria nesta semana (finalmente alguém se junta a esta revista digital para manifestar-se) questionando o buraco financeiro deixado pela gestão de Ronan Maria Pinto. Ninguém jamais o saberá. O contrato que formalizou a transferência do Ramalhão para o Saged foi um festival de buracos jurídicos que ensejam todo tipo de procrastinação, quando não de enrolação.
Quantas vezes escrevemos sobre esse relacionamento obscuro sem que respostas fossem oferecidas? Não seria agora que haveria mudança de rota. A pauta do ABCD Maior não deixa de ser interessante, é claro, mas é inócua.
Contexto exige discrição
O fato é que pelo tamanho dos coturnos de um dos coronéis da vida regional, tanto o presidente Celso Luiz de Almeida quanto o ex-presidente Jairo Livolis preferiram retomar o Ramalhão para o Santo André sem exigências maiores, além de praticaram um exercício de discrição digno da Santa Igreja. A aventura com Ronan Maria Pinto custou caro em todos os sentidos. As equipes de base foram destruídas. O time agora está na Quarta Divisão do Campeonato Brasileiro, o que significa um passo praticamente automático a retornar a um calendário que contemplará apenas quatro meses de competições, e também na Série B (que a Federação Paulista de Futebol e a Imprensa insistem em rotular de Séria A-2) do Estado de São Paulo.
Que pior situação se poderia esperar como linha de corte da interrupção dessa parceria? Apenas a desmoralização pública da equipe como marca sensibilizadora dos consumidores, também conhecidos por torcedores. O Ramalhão foi abandonado de vez sob a gestão do Saged, acentuando processo de esvaziamento popular que abriu caminho no começo dos anos 2000, embora já se manifestasse antes.
Popularização de equipe de futebol numa área metropolitana sem veículos de massa é uma façanha restrita ao São Bernardo, tão extraordinário na capacidade de organizar o acompanhamento da massa quanto sofrível ao dividir esse mesmo público entre petistas, que prestigiam a equipe, e antipetistas, que não estão no horizonte de catequese.
Contrapartida partidária?
Resta saber o que será feito no curto prazo no Ramalhão. O suporte do prefeito eleito Carlos Grana, que repetiria Luiz Marinho em São Bernardo, sempre será bem vindo principalmente se a agremiação não submeter-se a contrapartida de postura rastejante e partidária.
Ocupar-se do curto prazo é mesmo emergencial, mas é muito pouco. O Ramalhão precisa da revolução organizacional que propus quando da chegada do Saged e foi olimpicamente ignorada pelo ditador brando que tomou o poder, eliminando Jairo Livolis e Celso Luiz de Almeida do caminho até que, vejam só, os procurou agora para devolver em estado insolvente algo que bem ou mal recebeu em condições de embalar rumo a novos tempos.
Não tenho a menor vontade, pelo menos por enquanto, de revolver o passado recente do Ramalhão que, a bem da verdade, da justiça e da inteligência, deve ser tratado, nos cinco anos e meio de intervenção de Ronan Maria Pinto, como “Saged”. Como, aliás, consta de dezenas de textos desta revista digital. Considerar os 66 meses de terceirização uma etapa protagonizada pelo Ramalhão, como se tornou conhecido o Esporte Clube Santo André nos gramados, é um desrespeito às quatro décadas anteriores da agremiação.
Saged, Saged, Saged é o Ramalhão sob condicionantes explosivamente destrutivas do homem que arrebatou o poder da agremiação e enxotou com a suavidade de sempre todos aqueles que se lhe apresentaram como colaboradores. Ronan Maria Pinto detesta dividir o palco e só o faz quando pode capitalizar pessoalmente a empreitada. Ronan Maria Pinto adora os holofotes nos momentos de glória e corre para as coxias quando a temperatura de questionamentos aumenta.
Dando tempo ao tempo
Estou colaborando tanto com Celso Luiz de Almeida como com Jairo Livolis, a dupla diretiva que volta a comandar o futebol do Ramalhão. Essa colaboração se dá na forma de não lhes enviar, ainda, uma bateria de perguntas sobre o futuro do Ramalhão. Ao aceitarem a devolução de uma mercadoria em estado lastimável, praticamente sem condições de recuperação num período que não seja longo, eles provavelmente se excederam em confiança de retorno aos bons tempos. Devem, portanto, nestas alturas do campeonato, estarem a traçar planos emergenciais. É preciso, portanto, que tenham tempo para centrar fogo no que de fato interessa nesse momento.
Tomara que sejam capazes de introduzir mudanças significativas, mas é indispensável que sejam alertados sobre a ineficiência, quando não a obsolescência, do modelo de gestão do passado, já exaurido há mais de cinco anos e que, por isso mesmo, foi conduzido ao enterro para dar vida ao Saged. Mal sabiam que conceberiam uma assombração esportiva e empresarial cujo déficit, na ponta do lápis, contabilizando-se os créditos dos acionistas que viram seus investimentos virarem pó, ultrapassa facilmente a R$ 40 milhões.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André