O São Caetano venceu o Atlético em Sorocaba por 2 a 1 e o São Bernardo perdeu em casa para o Santos de Neymar por 3 a 1 na abertura da Série A do Campeonato Paulista. Resultados normais, esperados até, mas que vão muito além dos números.
Assisti aos dois jogos transmitidos no mesmo horário pela TV fechada. É claro que acompanhei ao vivo apenas o São Caetano em Sorocaba. Optei pela gravação do jogo no Estádio Primeiro de Maio. Faço um balanço ligeiro do que vi. E o que vi, acreditem, é contraditório. Gostei mais do time que perdeu, no caso o São Bernardo, do que do time que ganhou, o Azulão. Coisas do futebol, não necessariamente de minha cabeça.
1. Conjunto da obra
São Caetano e São Bernardo se utilizaram de armas táticas diferentes. O São Caetano do técnico Ailton Silva apresentou um autêntico 4-2-2-2, com quatro zagueiros em linha, dois volantes (Moradei e Pirão), dois meias-articuladores (Pedro Carmona e Eder) e dois atacantes rápidos, que não guardam posição no centro do ataque, ou seja, não são pivôs (Danielzinho e Vandinho). O São Bernardo optou por um mais dinâmico 4-2-3-1, com dois volantes marcadores (Dudu e Naldinho), três meias de ligação (Cleber, Michel e Bady) e um pivô de centroavante (Fernando Baiano).
Até a expulsão do volante Dudu, que caiu na armadilha do genial Neymar, o São Bernardo estava equilibrado, saindo em velocidade, explorando as laterais e dificultando a marcação santista. É claro que sofria com Neymar, tão craque que tornou Montillo senão um jogador qualquer. Após a expulsão, o técnico Luciano Dias sacrificou Fernando Baiano e passou a apostar em duas linhas de quatro e avançou o pequenino Michel para buscar a sorte num lance de bola parada ou contragolpe rápido. O Santos passou a dominar o jogo, a ter o controle do jogo, mas não foi ostensivamente melhor porque o São Bernardo demonstrou apetite impressionante por cada centímetro do gramado.
Já o São Caetano sofreu um bocado em Sorocaba com o buraco à frente da zaga. Pirão é ala de ofício e meia-articulador que joga da intermediária para a frente, não para trás. Por isso, Moradei ficou o tempo isolado como volante e Eder desapareceu, porque Pirão ocupava o espaço que ele teria como articulador. Danielzinho e Vandinho ficaram isolados demais no ataque também porque Pedro Carmona não contava com suporte dos laterais/alas e dos volantes para ganhar terreno. A situação só se amenizou no segundo tempo, e mesmo assim apenas em parte, com a entrada do volante Leandro Carvalho em substituição a Eder. Mas o São Caetano continuou a rifar a bola demais, a produzir ligações diretas, a perder o controle do jogo para um adversário voluntarista que parece ter aprendido apenas parte das lições do técnico Estevão Soares, porque pouco adianta a coreografia ofensiva sem o apetrechamento técnico de finalização de jogadas.
2. Rendimento setorial
O melhor do São Bernardo ante o Santos foi o sistema defensivo, bem protegido pelo meio de campo. O ataque sofreu as consequências da expulsão de Dudu. A linha de quatro jogadores no meio de campo minimizou os espaços para os santistas, embora de vez em quando Neymar desse um jeito de ampliar milímetros em metros. Tanto que deixou Montillo na cara do gol no segundo tempo, mas o argentino demorou para concluir.
Já o São Caetano não teve um setor que saltasse aos olhos. Houve deficiências na defesa, no meio de campo e no ataque entre outros motivos porque os setores não se integraram coletivamente. O lado esquerdo da defesa, onde o lateral/ala Fernandinho é um tormento ofensivo, ficou desprotegido durante quase todo o tempo não só porque sobravam espaços às costas, mas também ante a baixa mobilidade do zagueiro Eli Sabiá e do mau posicionamento de Pirão. O pior rendimento setorial foi mesmo do meio de campo, centro nervoso do coletivo. A barafunda foi total, com baixa capacidade de marcação, de articulação e de penetração como opção aos atacantes.
3. Individualidades positivas
O zagueiro Gabriel e o atacante Danielzinho foram os melhores do São Caetano. Gabriel tornou-se mais uma vez praticamente imbatível, com senso de colocação, de antecipação e de liderança. Danielzinho apareceu pouco por conta dos erros coletivos, mas não desperdiçou a única oportunidade de gol de que desfrutou, num passe de Vandinho pelo meio, e fez uma jogada de craque, pela esquerda, quando se livrou da marcação, observou a penetração livre pelo meio de Ailton, que acabara de entrar, e fez um passe preciso completado às redes. Fernandinho também foi bem como ala, aparecendo quatro vezes para bater da entrada da área, em evidentes jogadas ensaiadas. Só falta calibrar os chutes.
No São Bernardo não houve destaque individual tão reluzente, mas o zagueiro Daniel Marques e o volante Naldinho, que marcou o gol de empate no primeiro tempo, podem ser pinçados como um pouco acima da média do grupo. Um time que faz boa exibição sem alçar algumas individualidades ao extremo do estrelado é um time a caminho do sucesso.
4. Individualidades negativas
Além de Dudu, expulso aos 34 minutos do primeiro tempo, o São Bernardo deve contabilizar parte do passivo de pontos do jogo com o Santos na caderneta do zagueiro Samuel, responsável por uma furada monumental no lance que Miralles transformou em gol. Até então Samuel estava bem na partida.
No São Caetano, também o quarto-zagueiro Eli Sabiá entra na conta em vermelho. Ele não só errou no desvio de bola do cruzamento da direita em direção à pequena área, porque o correto era desviar a bola para valer, como tirou da jogada Gabriel, que vinha logo atrás, presenteando o atacante do Atlético Sorocaba com um passe medido para anotar o gol. Pirão também foi um desastre tático e Eder um fracasso individual. Pedro Carmona, sacrificadíssimo pelo conjunto, não foi nem sombra da média de atuações na Série B do Campeonato Brasileiro. Quando o conjunto fracassa, as individualidades reclamam.
5. Aplicação de conceitos
No conjunto da partida ante o Santos o São Bernardo revelou dinamismo surpreendente para quem mal saiu dos primeiros treinamentos. A determinação em busca de um bom resultado, lançando-se ostensivamente ao ataque com os laterais apoiadores e os meias sempre dispostos a penetrações, revelou uma característica que, aplicada frequentemente no campeonato, poderá render muitos pontos. Diferentemente da temporada de 2011, quando não suportou o peso da Série A Paulista, o São Bernardo transmite a sensação de que, com um time de experientes jogadores, poderá registrar campanha de destaque este ano. A derrota para Neymar, cérebro, coração e pernas do Santos, principalmente pelas circunstâncias e pela forma que se deu, não foge da bitola da lógica.
Já o São Caetano não expôs durante os 90 minutos nada do empenho coletivo e do brilho individual da campanha que o levou a produzir 71 pontos na Série B do Campeonato Brasileiro. O exagero de passes errados, a perda quase permanente do controle do jogo, o baixo grau de pressão sobre os adversários, o reduzido número de finalizações, a escassa verticalidade ofensiva, tudo isso ficou no passado. A vitória apenas comprovou que a força da individualidade pode fazer a diferença em jogos ante adversários menos qualificados, mas não será suficiente em confrontos mais equilibrados.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André