É simples entender as razões que levaram o São Bernardo a ocupar, após quatro rodadas da Série A do Campeonato Paulista, a última colocação com três derrotas e um empate. Tão simples quanto preocupante. Os 3 a 0 ante o Palmeiras ontem à noite no Pacaembu foram uma continuidade da empáfia tática dos jogos anteriores. O São Bernardo reestreia no principal campeonato regional do País com ares de grande, quando não passa de pequeno. E é sobre isso que precisam ser alertados o técnico e os dirigentes. Senão, a casa cai como caiu em 2011, quando foi rebaixado à Série B, de onde subira na temporada anterior.
Na derrota de ontem à noite, que poderia enfeixar um número muito maior de gols palmeirenses, o São Bernardo radicalizou na tática suicida de acreditar que pode jogar de igual para igual com a maioria dos clubes grandes e médios paulistas. A formação definida pelo treinador – um 4-2-3-1– com viés ofensivo foi sopa no mel para um Palmeiras réplica dessa numerologia, mas muito mais qualificado tecnicamente, com Valdívia leve e solto o tempo todo e o centroavante Barcos tendo ampla liberdade para fugir dos zagueiros.
Como se bobagem não tivesse limites, o técnico Luciano Dias voltou ainda mais liberal no segundo tempo na ilusória tentativa de reverter a derrota parcial de 1 a 0, gol de Barcos aos 33 minutos completando um escanteio que Valdívia desviou na primeira trave. Ao substituir um dos dois volantes fixos, Glaydison, por um meia-atacante, Michel, o São Bernardo abriu as portas defensivas de vez com o 4-1-4-1. Bastou ao Palmeiras acelerar o jogo e utilizar as extremidades do campo, sempre desprotegidas pela baixa combatividade dos meias-atacantes, para que outros dois gols acontecessem, com Valdívia aos cinco minutos e Barcos aos 10.
Depois de esticar o placar confortavelmente, o Palmeiras levou o jogo na flauta, poupando-se. O São Bernardo não sabia fazer algo diferente senão tocar a bola praticamente sem profundidade. Fernando Baiano raramente teve alguém com quem dialogar. Ou seja, o São Bernardo consegue a proeza de jogar aparentemente no ataque, mas não transforma a teoria em prática porque acaba neutralizado por forças mais organizadas.
Trocando as bolas
Há erros de avaliação técnica de Luciano Dias que explicam o desempenho pífio do São Bernardo no campeonato. É verdade que a tabela da competição é malvada com a equipe, com três dos quatro jogos fora de casa e um clássico com o São Caetano no próximo domingo. Mas isso é apenas uma coisa. A outra coisa é que o time não convence porque não tem equilíbrio tático, começa a exceder-se ainda mais em instabilidade emocional e não terá saída senão correr atrás de resultados para não ser rebaixado, em primeiro lugar, e tentar uma vaga à Série D do Campeonato Brasileiro, cada vez mais improvável.
A composição do São Bernardo, pelas características dos jogadores que estão atuando no Campeonato Paulista, é de um time que acredita ser melhor que a maioria dos adversários. Os laterais são mais ofensivos que marcadores, os meias de ligação que formam o 4-2-3-1 têm vocação à armação ou ao ataque, menos à recomposição forte do meio de campo, e Fernando Baiano é um centroavante convencional. Experiente, tem melhorado o desempenho com maior mobilidade, mas sofre com a falta de companheiros para dividir as atenções dos zagueiros. Ricardinho, que joga pelas extremidades, tem verticalidade, mas é mal aproveitado porque o São Bernardo insiste em utilizar mais chutões do que passes na armação a partir da defesa. Tudo porque falta aproximação mais permanente.
O equívoco de Luciano Dias na volta do São Bernardo para o segundo tempo com o Palmeiras é inquietante como aferidor da maturidade do treinador. Ele simplesmente abriu a porteira para o Palmeiras passar. Arrependeu-se, é verdade. Tanto que tentou consertar quando substituiu Ricardinho por Naldinho, até o jogo passado titular do meio de campo como segundo volante. Naldinho entrou e executou uma função híbrida de segundo e terceiro volante, já que, surpreendentemente, o meia Kleber seguiu praticamente como meia defensivo. Kleber é uma espécie de Valdívia do São Bernardo, ou seja, suas funções mais produtivas começam na intermediária adversária. Começam e terminam, porque não tem poder de fogo ofensivo, diferentemente portando do craque chileno. Colocá-lo para jogar mais recuado é sacrificá-lo duplamente.
É muito mais que provável que o São Bernardo do clássico com o São Caetano seja um time menos atirado, com a provável volta de Bady para compor defensivamente o meio de campo, além de Naldinho ao lado de Dudu, um primeiro volante sem técnica para armação mas decidido a interromper o circuito de ataque adversário a qualquer custo.
Resta saber o que será dos laterais Régis e Gleidson. Eles atacam mais do que defendem e exatamente por isso criam embaraços aos zagueiros de área. Samuel agrava as deficiências de marcação do São Bernardo porque se mete demais a sair para o jogo. Pode até dar certo num ou noutro jogo, mas é sempre um risco para um time deliberadamente induzido ao ataque sem considerar o outro lado da moeda -- aquela que sugere cuidados defensivos igualmente fortes.
Enquanto o técnico Luciano Dias não entender que o Campeonato Paulista é barra pesada para quem se mete a acreditar que o adversário não é tão forte assim, o São Bernardo não se livrará da enrascada em que está se metendo. Está mais que provado que, qualquer que seja o time com camisa diferente em campo, sempre conta com um ou dois deles em nível suficiente para estragar os planos de vestiários. O Linense que acabou de vencer o São Caetano contou com um centroavante que finalizou apenas duas vezes em 90 minutos, o suficiente para marcar 2 a 0. O São Bernardo precisa de sandálias da humildade, dentro e fora de campo, para não voltar à Segunda Divisão paulista e para sonhar com a Quarta Divisão brasileira.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André