A ficha da realidade da Série A do Campeonato Paulista finalmente caiu para o São Bernardo, mas ainda precisa cair para o São Caetano. A goleada de 4 a 1 no clássico de ontem à noite no Estádio Primeiro de Maio marcou a colocação das sandálias da humildade no São Bernardo, que demitiu o técnico na sexta-feira e com um treinador interino jogou preocupado em não se expor demais ao adversário. O São Caetano, que ainda curte o sucesso técnico na Série B do Campeonato Brasileiro do ano passado, quando só não subiu por conta de critérios do regulamento, precisa acordar para as diferenças impostas pela competição estadual.
O resultado favorável à equipe que melhor soube fazer a leitura tática do jogo só não pode induzir o São Bernardo a novos erros de avaliação. Se pretende mesmo chegar à Série D do Campeonato Brasileiro, caminho proporcionado por boa colocação no Paulista, vai precisar apurar o coletivo para não se perder em novos devaneios de ofensividade demais sem, entretanto, cair no extremo de cuidados extremos.
A goleada de ontem teve duas individualidades marcantes – o lateral/ala Régis e o meia-articulador Bady – e um arranjo tático defensivo que nem sempre encontrará as facilidades proporcionadas por um São Caetano exageradamente dispersivo e preocupantemente passivo.
A derrota fragorosa do São Caetano deve encaminhar o técnico Ailton Silva a semear o ambiente de preparação para os próximos jogos com mais fertilidade, porque nada melhor que um choque no placar para acordar uma equipe ainda pouco concentrada na competição. O Campeonato Brasileiro definitivamente está no passado e o Campeonato Paulista não pode se traduzir numa armadilha que atrapalharia os planos para a consolidação do grupo para um salto de qualidade à próxima temporada nacional, quando se pretende chegar, finalmente, à Série A.
Cautela e morosidade
O clássico de ontem foi marcado por períodos distintos. No primeiro tempo, a cautela do São Bernardo no plano tático, com três volantes de marcação num 4-3-2-1 com viés defensivo, não impediu que a equipe tivesse mais iniciativa de ataque do que o São Caetano, excessivamente moroso na transição ofensiva. Mais que isso, o São Caetano não tinha intensidade alguma. Já no segundo tempo, em desvantagem de 1 a 0, o São Caetano lançou-se ao ataque e proporcionou ao São Bernardo o uso de contragolpes fatais. Exatamente o que o time então dirigido por Luciano Dias deixou de organizar nos jogos anteriores, motivo de sua demissão.
O São Bernardo de Luciano Dias das quatro primeiras rodadas foi um time excessivamente ofensivo, sem guardar a mínima cautela. Já o de ontem foi monolítico no sistema defensivo e jamais deixou de explorar os erros do adversário.
Ante o 4-3-2-1 do São Bernardo, o São Caetano replicou o sistema dos jogos anteriores, um 4-2-2-2 sem centroavante fixo. É claro que essa numerologia é móvel, porque de vez em quando um ou outro volante do São Bernardo virava meia-atacante, mas nada de forma sistemática. Foi assim até que após a vantagem de 3 a 0 no placar aos 17 minutos do segundo tempo, o já cansado Fernando Baiano cedeu lugar ao mais móvel Michel. O São Bernardo passou a jogar num 4-3-3 de viés ofensivo. Pouco antes Ricardinho substituiu o pouco útil Jonathan. Nada que alterasse significativamente o jogo.
Os dois iluminados
Muito da goleada do São Bernardo se deve ao lateral/ala Régis e ao meia Bady. O rendimento individual e coletivo dos dois jogadores foi estonteante. Eles desnortearam o São Caetano pelo lado direito de ataque do São Bernardo. Régis participou de três gols por ali. Fez o cruzamento para Fernando Baiano marcar de bicicleta aos 45 minutos do primeiro tempo, recebeu o passe em diagonal nas costas de Éder para marcar 3 a 0 aos 10 minutos e cruzou quase da linha de fundo para Dudu livre na entrada da área finalizar rasteiro e marcar 4 a 0 aos 28 minutos. E ainda participou do segundo gol aos sete minutos quando, deslocado à esquerda do ataque, fez o passe em diagonal e em profundidade para a penetração de Bady pelo meio, que completou ante a saída do goleiro Fábio.
O que fez de Régis e Bady os craques do jogo foram a luminosidade técnica e a percepção tática. Régis não se intimidou com a obrigação de marcar Danielzinho entre outros motivos porque sempre contou com o apoio do volante Dudu. Já Bady, que nos tempos de Luciano Dias corria demais atrás dos adversários, desta vez contou com o suporte dos três volantes e, livre de marcação, flutuou entre a direita e a esquerda no vazio da intermediária dos volantes e os meias-de-articulação do São Caetano. Por ali, Bady manobrou os espaços como bem entendeu.
É claro que o coletivo do São Bernardo contribuiu para o sucesso individual de Régis e Bady. Seus companheiros de zaga e de meio de campo correram o tempo todo, encurtaram os espaços para o São Caetano e os procuraram como válvulas de escape ofensivas.
O mapa da mina
A esquerda da defesa do São Caetano foi o mapa da mina da goleada do São Bernardo. Por ali Régis e Bady fizeram a festa. Ao lateral Fernandinho estão faltando fôlego e pernas, porque nem consegue marcar e muito menos ataca com competência. Para complicar, Danielzinho e Éder se omitiram durante todo o primeiro tempo na marcação a Régis que, com o auxilio de Bady, sacrificava ainda mais a marcação de Fernandinho. Moradei tentava apagar incêndio, mas nem sempre conseguia. O antídoto era simples, mas de execução que exige treinamento: bastava a defesa do São Caetano subir a marcação e naturalmente os dois volantes e os dois meias de articulação ficariam mais próximos. Compactação com permanente pressão ao jogador de posse ou na expectativa de receber a bola é um terror para equipes que, como o São Bernardo, optam pela cautela explícita de três volantes. A generosidade de espaços vazios na intermediária do adversário é o sonho de todo time que, como o São Bernardo, não podia correr muitos riscos. que não está decidido a muitos riscos.
No primeiro gol do São Bernardo, o cruzamento de Régis para a bicicleta de Fernando Baiano só foi possível porque Fernandinho e Moradei chegaram atrasados na marcação. O cartão amarelo recebido por Fernandinho logo no começo do jogo o tornou ainda mais vulnerável. Por isso acabou substituído por Éder no intervalo, proporcionando a entrada do armador Pedro Carmona.
O São Bernardo soube explorar o setor esquerdo da defesa do São Caetano com a chegada de trás de Régis e de Bady. O técnico Ailton Silva não teve escapatória senão recuar Éder às funções de lateral, já que não tinha opções para reposição no setor. Samuel Santos poderia ser aproveitado na lateral-direita, com a deslocação de Samuel Xavier à esquerda, mas a inferioridade no placar e os riscos inerentes de adaptação de um jogador acostumado ao setor direito levaram o técnico a optar pelo recuo de Éder. O erro maior do São Caetano foi não ter optado por Danielzinho como primeiro marcador de Régis até a linha de meio de campo.
Danielzinho, o vilão
O reencontro de Danielzinho com o clube que o formou nas categorias de base não poderia ter sido mais feliz para o São Bernardo e desanimador para o São Caetano. O atacante ficou o tempo todo à esquerda do ataque, foi marcado duplamente por Régis e o volante Dudu e se movimentou muito pouco para escapar da prisão imposta. É verdade que teve pouca ajuda de Fernandinho no primeiro tempo, mas no segundo, até o descontrole no placar, Pedro Carmona se apresentou para ultrapassagens, mas Danielzinho não conseguia se desvencilhar dos adversários. Até que foi substituído por um Jobson que jogou mais à direita e com muito mais contundência. Geovane entrou um pouco antes no lugar de Vandinho e acabou sofrendo o pênalti que se traduziu no único gol do São Caetano. Menos mal para a equipe de Ailton Silva que o adversário não tenha devolvido na mesma moeda os 6 a 1 aplicados no Estádio Anacleto Campanella em 2011. Um resultado catastrófico para o São Bernardo, rebaixado algumas rodadas depois por conta do saldo de gols.
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