Esportes

Devagar presidente, São Bernardo
ainda está longe da Primeira Divisão

DANIEL LIMA - 29/04/2013

Sei lá a quem o entusiasmado presidente do São Bernardo Futebol Clube endereçou a frase durante a festa pela manutenção da equipe na Série A, a Primeira Divisão, do futebol paulista. Disse Luiz Fernando Teixeira, do alto do esnobismo distribuidor de sarcasmo, algo como “somos um time de primeira”, conforme publicou o Diário do Grande ABC e o ABCD Maior. Time de Primeira nada, é o mínimo que posso responder em nome dos ofendidos, os quais não identifico. Suponho que sejam dirigentes do Santo André e do São Caetano, agremiações que vão disputar a Série B, a Segunda Divisão, do Campeonato Paulista do ano que vem.


 


O São Bernardo, caro presidente, é um time de Quinta Divisão. Não se trata nem muito menos se deve entender a frase como ofensa. É constatação e desafio a saltos futuros. Aliás, foi com os cromossomos de Quinta Divisão que o São Bernardo reagiu à fuga do rebaixamento na última rodada da fase de classificação da Séria A Paulista. Até porque, quem é de Primeira Divisão não precisa se proclamar como tal. Muito pelo contrário: quem é de Primeira Divisão só teria mesmo de lamentar eventual estresse. 


 


Time de Primeira Divisão não é um conceito que se esgota e se consagra apenas sob o ponto de vista hierárquico, legal. Também o é sob aspectos subjetivos, perceptivos, mensuráveis não com a métrica da formalidade de tabela de jogos, de classificação temporariamente alcançada, mas sobretudo pela força estrutural mesmo que circunstancialmente avariada. 


 


Um time de Primeira Divisão não precisa estar na Primeira Divisão para ser reconhecido como time de Primeira Divisão. O Palmeiras está circunstancialmente na Segunda Divisão do Brasileiro, assim como o Corinthians já esteve, mas jamais deixou de ser de Primeira Divisão.


 


Tratado público


 


A história é que constrói esse tipo de tratado público, social. E o São Bernardo, caro presidente Luiz Fernando Teixeira, está longe disso. E é natural que esteja porque não tem histórico algum no futebol se o referencial for Primeira Divisão. E ninguém pode garantir que terá, como tantos outros têm.


 


O São Bernardo é um time de Quinta Divisão porque não consta da lista de participante de nenhuma das quatro divisões em que está subdividido o Campeonato Brasileiro. Está na Série A do Campeonato Paulista, espécie de vestibular à Quarta Divisão do Campeonato Brasileiro. “São Bernardo é primeira”, como disse literalmente o presidente Luiz Fernando Teixeira, em tom de desabafo, foi um arroubo de quem é noviciado no futebol.


 


Para ser didático, caro presidente, listo uma combinação de quesitos que constam do perfil de clubes de Primeira Divisão, os quais, convenhamos, o São Bernardo demorará um bocado para atingir:


 


1. Tradição de resultados ante grandes clubes.


2. Tradição de colocações importantes em competições.


3. Pelo menos um título de expressão estadual e nacional.


4. Respeitabilidade no mercado negocial da bola.


5. Cristalização de suporte social.


6. Relativa independência dos poderes públicos.


7. Rápida capacidade de absorver deslizes em campo.


8. Relacionamento maduro com veículos de comunicação.


 


São Bernardo que escapou de novo rebaixamento à Série B do Campeonato Paulista, ou Segundo Divisão, na última rodada, está longe disso. Mais que isso: tanto o São Caetano, rebaixado e integrante da Série B do Campeonato Brasileiro, quanto o Guarani de Campinas, rebaixado à Série B do Paulista e à Série C do Brasileiro, são potencialmente mais próximos da Primeira Divisão do que o São Bernardo. Sem esquecer o Santo André, detentor de uma história muito mais abrangente, vitoriosa e nem por isso alardeador de clube de Primeira Divisão, porque também não o é.


 


Se o presidente Celso Luiz de Almeida, ao final da Série B do Paulista do ano que vem, propagar com eventual acesso que o Santo André é de Primeira Divisão, o brado soará muito mais viável do que aquele esgrimido por Luiz Fernando Teixeira ao final do jogo com o Oeste, em Itápolis. Se Nairo Ferreira fizer o mesmo em relação ao São Caetano, a frase parecerá ainda mais respeitável.


 


Numa breve análise sobre os oito vetores listados, o diagnóstico para o São Bernardo dito de Primeira Divisão é o seguinte:


 


1. Embora já tenha participado de duas edições da Série A do Paulista, não somou uma vitória sequer ante os chamados grandes. Ou seja: o time não aprontou uma zebra sequer, embora tenha se comportado em todos os jogos com dignidade, empenho e até mesmo pudesse ter obtido algum resultado melhor. Tudo indica que, para romper esse anel de ferro, o São Bernardo terá muito mais complicações históricas do que o São Caetano e o Santo André, porque avança cada vez mais a disparidade de forças entre grandes, médios e pequenos.


 


2. O São Bernardo não tem tradição alguma em competições relevantes. A Série B do Campeonato Paulista não conta. Principalmente para quem se diz de Primeira Divisão, o que automaticamente escorraça qualquer menção à Segunda Divisão.   


 


3. Ao São Bernardo ainda falta e provavelmente faltará por bom tempo um título de expressão estadual ou nacional. Uma Série A do Campeonato Paulista conquistada pelo São Caetano, um título de vice-campeão da Taça Libertadores, como o São Caetano, dois títulos de vice-campeão Brasileiro da Série A, também como o São Caetano, ou um título da Copa do Brasil, como o Santo André.


 


4. Respeitabilidade no mercado da bola se obtém com calendário de brilho, algo que o São Bernardo ainda está longe de alcançar. Quem sabe ao disputar com relativo sucesso a Copa do Brasil comece a preparar o terreno para ingressar no clube dos jogadores a serem negociados e entre mesmo que circunstancialmente num circuito fechadíssimo?


 


5. A cristalização de suporte social foi bem encaminhada com estratégias para levar torcedores ao Estádio Primeiro de Maio. Nesse ponto, é um clube que poderia pleitear um lugar na Primeira Divisão, embora com ressalvas. Pouco importa se a quase totalidade não torce para valer pelo São Bernardo como uma minoria já apaixonada. O importante é comparecer e começar a vibrar.


 


6. O São Bernardo está a léguas de distância do critério de relativo distanciamento dos poderes públicos. Marcado pelo petismo, sem o qual não resistiria a uma temporada, o São Bernardo entregou-se ao servilismo ao mitificar a camisa 13, entregue ao presidente honorário Lula da Silva, cuja ficha futebolística não passa de perna de pau. Nenhum clube brasileiro cometeria tamanha barbeiragem, porque, no fundo, no fundo, politizou o futebol da cidade, ou futebolizou a política, o que abre imenso buraco separatista entre petistas e não petistas.


 


7. Estaria o São Bernardo preparado para absorver deslizes em campo? Vamos esperar, vamos esperar, porque mesmo com todo o vento a favor há muito tempo, a fuga da Segunda Divisão mereceu foguetório. A direção emitiu sinais de que poderia estar vivendo processo de aprendizagem e maturidade quando contratou o técnico Wagner Lopes para livrar a equipe de novo rebaixamento nesta temporada.


 


8. O relacionamento maduro com veículos de comunicação é um teste que só será possível colocar em prática para valer quando o São Bernardo disputar várias edições da Primeira Divisão de São Paulo e, quem sabe, divisões importantes do calendário nacional. A capacidade de absorver críticas e de ultrapassar as tormentas ditará o nível de equilíbrio diretivo. Algo bem diferente dos tempos atuais, quando Luiz Fernando Teixeira e demais dirigentes praticamente pautam a Imprensa regional sob efeitos da cadeia de poderes paralelos que nascem e crescem no Paço Municipal do prefeito Luiz Marinho.


 


Num exame rigoroso que considere aspectos esportivos, financeiros e de consumo, clubes de Primeira Divisão no futebol brasileiro são somente os integrantes do G-12, ou seja, os quatro grandes de São Paulo, os quatro grandes do Rio de Janeiro, os dois mineiros e os dois grandes do Rio Grande do Sul. E a tendência, agora que se descobriu que futebol é muito mais que 22 marmanjos correndo atrás da bola, é que esse clube já fechadíssimo será ainda menor ou ganhará alguns representantes de um núcleo muito especial. Corinthians, Flamengo e São Paulo têm vagas asseguradíssimas.


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