Esportes

É longa a jornada para time pequeno
virar médio e alcançar rótulo de grande

DANIEL LIMA - 19/11/2013

O tamanho conceitual de um time de futebol é uma conjunção de valores mensuráveis e subjacentes que encontra parentesco na definição de nações desenvolvidas e em desenvolvimento. O que é um time grande, um time médio e um time pequeno, afinal?


 


A indagação vem na esteira das declarações do presidente Luiz Fernando Teixeira, do São Bernardo Futebol Clube, ao jornal ABCD Maior. Noviciado no futebol profissional, Teixeira acredita que o São Bernardo atingirá o patamar de equipe média se disputar a Série D do Campeonato Brasileiro do ano que vem.


 


Nada mais exagerado. Equipe média é o São Caetano, de histórico que dispensa legendas. O Santo André já foi médio e hoje se apequenou ao cair para a virtual Sexta Divisão. É uma pequena equipe historicamente muito maior que o São Bernardo, mas circunstancial ou definitivamente em rota de ultrapassagem.


 


Dividir hierarquicamente as equipes de futebol em grandes, médias e pequenas é subestimar as nuances implícitas entre uma realidade histórica e outra. Mesmo entre as grandes há diferenciações, mas não seria justo distingui-las entre grandes-grandes, grandes-médias e grandes-pequenas. O chamado G-12, formado por Corinthians, São Paulo, Palmeiras, Santos, Flamengo, Botafogo, Fluminense, Vasco, Atlético Mineiro, Cruzeiro, Internacional e Grêmio, conta com as principais equipes do futebol brasileiro. Tropeços circunstanciais não retiram essa condição. Da mesma forma que sucesso eventual, como o do Santo André que ganhou a Copa do Brasil em 2004, assim como o Juventude, em 1999, o Paulista de Jundiaí, em 2005, não altera abruptamente a conceituação, tornando-os grandes. Podem estar grandes, mas não são grandes até que se provem grandes.


 


Peso das torcidas


 


Cada vez mais o peso das torcidas vai consolidar o perfil das equipes nacionais. A audiência televisiva é o centro do negócio chamado futebol. A TV aberta já diferencia e faz muito bem por diferenciar os valores monetários aos quais têm direito os clubes brasileiros pela transmissão dos jogos. Quem dá mais audiência tem mais dinheiro à disposição. Muito longe, entretanto, da participação relativa dos consumidores.


 


A chiadeira contra este ou aquele clube procura revogar as leis de mercado. Uma inserção publicitária na Rede Globo custa muito mais do que em qualquer outra emissora porque a audiência assegura retorno ao investimento. Pretender sufocar o critério de distinção de recursos de acordo com o potencial de audiência é uma aberração em nome de uma demagogia de isonomia que o mercado publicitário rejeita. Mas nem por isso deve-se admitir a concentração monolítica em torno de duas ou três agremiações que mais atraem telespectadores, casos de Corinthians, Flamengo e São Paulo.


 


Há comparações descabidas sobre a distribuição de receitas aos clubes brasileiros por intermédio da televisão aberta. Utilizam-se exemplos do futebol europeu sem se darem conta de que, diferentemente do Brasil, ali não há disparidades de suporte popular. Há uma preferência menos ostensiva e, portanto, mais diluída, de torcedores entre as agremiações. Raros são os clubes de abrangência nacional.


 


Em termos de potencial de consumo, que é o que decide a sorte dos investimentos publicitários, Corinthians, São Paulo e Flamengo, nessa ordem, dominam o mercado nacional. Não é justo que recebam da TV Globo valores médios semelhantes aos dos demais clubes. Assim como seria imperdoável que recebessem proporcionalmente ao que auferem de audiência e com isso sufocassem os demais no tiro de partida de investimentos na formação dos elencos. Os desequilíbrios abissais iriam se manifestar nos gramados.


 


Nada pior do que ir a um estádio de futebol com a certeza de que os três pontos estarão garantidos. Exceto quando o time pelo qual a gente torce seja o beneficiário. Mesmo assim, transformada em probabilidade intocável e constante seria enfadonho perder o medo de perder. A graça do futebol é a possibilidade que apenas fortuitamente outro esporte coletivo oferece: ver um time pequeno bater um grande.


 


Barreira televisiva


 


Clube nenhum da Província do Grande ABC romperá o cerco e chegará ao tamanho dos integrantes do G-12. Nosso potencial de consumo esportivo é baixo, porque minoritário ante a invasão dos grandes clubes da Capital. Sem emissoras de sinal aberto o direcionamento de programação local e regional é utopia. A repercussão da penumbra televisiva se espraia por todos os cantos. Nas arquibancadas e no portfólio de patrocinadores.


 


Viver nas trevas da TV aberta numa região metropolitana como a Grande São Paulo é o pior dos destinos do futebol regional. A colonização pela Capital é compulsória. Equipes com sede fora das capitais mas servidas por retransmissoras das grandes redes de televisão com faixas de programação local levam nítida vantagem de marketing ante os representantes da Província do Grande ABC.


 


Para o São Bernardo ser o time médio com que sonha o presidente Luiz Fernando Teixeira, sempre tendo em conta que é a hierarquia nacional o referencial da qualificação, muito haveria de ser conquistado durante e sequencialmente por muito tempo. O São Caetano de histórico invejável na primeira década deste século jamais alcançou a categoria de clube grande. No máximo chegou a médio-grande por algumas temporadas e hoje é um médio-médio, porque também não é somente o declínio nos gramados que conta.


 


A Ponte Preta, provável rebaixada à Série B do Campeonato Brasileiro, é estruturalmente um time médio-grande com baixa possibilidade de tornar-se médio-pequeno porque, entre vários fatores, está concentrada numa região de relativa autonomia esportiva, servida por emissoras de TV locais que lubrificam a cultura de competitividade da equipe. Condição de que não goza nenhuma equipe da região. O São Caetano já chegou a suplantar a Ponte Preta nesse jogo de rótulos, opondo o time médio-grande ao médio-médio de longo período dos campineiros, mas a biruta virou. E tudo indica que sempre vai virar, beneficiando ou penalizando esses supostos e tantos outros competidores.


 


Tradição conta muito


 


Não será a possível disputa da Série D do Campeonato Brasileiro do ano que vem que tornará o São Bernardo um time médio, como sugeriu Luiz Fernando Teixeira, ou mesmo médio-pequeno. Talvez alcance provisoriamente o título de pequeno-médio.


 


Nem o fato de o São Caetano ter sido praticamente rebaixado à Série C do Campeonato Brasileiro o colocará como médio-pequeno. A caminhada rumo à cristalização de etiquetas esportivas é automaticamente longa, com paradas, avanços e retrocessos cada vez mais desafiadores a quem não conta com a compactação histórica dos grandes clubes, estes sim, mesmo quando atingidos circunstancialmente pelo rebaixamento técnico, casos já conhecidos, encontram nas entranhas da própria grandeza implícita energia à recuperação.


 


A situação das três principais equipes da região numa suposta hierarquização do futebol brasileiro encontraria o São Caetano na condição de médio-médio, o Santo André de pequeno-médio e o São Bernardo como pequeno-pequeno. Pesam a favor do São Caetano dois títulos de vice-campeão brasileiro, um de vice-campeão da Libertadores da América, um de campeão paulista e também um de vice-campeão paulista, entre tantos outros sucessos. O Santo André ganhou uma Copa do Brasil e foi finalista da Série A do Campeonato Paulista. O São Bernardo só ganhou a Série B Paulista até agora, além de títulos menores.


 


Não será a possível Série D que alterará a conceituação do São Bernardo no ano que vem, nem a Série C do São Caetano e tampouco a Série F do Santo André. Espasmos de grandeza dos pequenos e dos médios e de pequenez dos grandes são nuvens passageiras porque quando deixam de ser espasmo, viram tradição, que é o somatório de qualificações que começam mas não terminam nos gramados.


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