A classificação geral da Série A do Campeonato Paulista é aliada do São Bernardo no sonho de disputar a Série D do Campeonato Brasileiro desta temporada. Os dois primeiros colocados entre os 12 times que disputam a Série A mas que não constam do calendário da CBF vão se envolver no segundo semestre numa competição que poderá levá-los à Série C do Brasileiro. O São Bernardo está praticamente alijado da fase de mata-mata do Paulista, porque soma apenas metade (sete) dos pontos (14) do Mogi Mirim, vice-líder do Grupo A, liderado com folga pelo São Paulo. Apenas os dois primeiros colocados de cada grupo vão disputar a etapa decisiva do Paulista.
O que leva mesmo as 12 equipes excluídas do Brasileiro a passar pelo filtro classificatório é a pontuação geral do Paulista. O São Bernardo está atrás de cinco dessas equipes, mas ainda restam oito rodadas ao encerramento da fase. Os três pontos que separam a equipe do Ituano, o mais bem classificado do G-12, não são montanha insuperável. Muito pelo contrário. Significam apenas 16% dos pontos a disputar individualmente pelas equipes.
Por essas e outras o desespero da equipe e dos dirigentes após a derrota de sexta-feira em Osasco diante do Audax por 3 a 0 é muito mais fruto do despreparo de entender a competição paralela à Série A -- ou seja, a briga por uma das vagas à Série D -- do que outra explicação qualquer. Como uma das equipes favorecidas pela tabela, já que dos oito jogos que lhe restam quatro serão disputados no Estádio Primeiro de Maio contra adversários diretos na disputa por duas vagas à Série D, contra dois concorrentes como visitante, o São Bernardo deveria colocar a cabeça no lugar.
Principalmente o técnico Edson Boaro. Ele preparou a própria forca diante do Audax. O confronto do final de semana contra o São Bento de Sorocaba é o que se consagrou chamar de jogo de seis pontos. Trata-se de um concorrente direto pela Série D e que soma oito pontos ganhos na classificação geral. Um ponto apenas acima do São Bernardo, derrotado nos três últimos jogos.
Fracasso sem segredos
É preciso entender muito pouco de futebol para estar à procura das razões que levaram o São Bernardo a ser humilhado na noite de sexta-feira na derrota de 3 a 0 para o Audax, em Osasco. O time de Edson Boaro foi atropelado pelo adversário porque desprezou um dos conceitos-base do futebol: o excesso de alterações individuais geralmente altera a estrutura tática.
Desprezar o Audax, time que mantém a mesma base há pelo menos três anos, foi um erro fatal. Principalmente porque o Audax é o Audax, com uma maneira muito peculiar de jogar futebol, praticamente sem seguidores no futebol brasileiro. Trata-se de um time que faz do passe metódico, da aproximação dos jogadores, da posse de bola, da multifuncionalidade, marca registrada.
Contra equipes de semelhante poderio técnico, o Audax geralmente se dá bem porque conta com o diferencial do coletivismo levado ao extremo. Tanto que ano a ano foi deixando para trás divisões menos nobres do futebol paulista. Chegou ao topo da hierarquia paulista jogando assim. Já foi chamado de Barcelona dos pobres, ou uma imitação do Barcelona dos bons tempos. O que poderia soar a deboche, no fundo é elogio. É um time com digitais técnicas e táticas que dispensariam o uso do uniforme para identificá-lo.
Pois foi exatamente contra uma equipe organizada mesmo sem ser necessariamente efetiva em muitos jogos que o técnico Edson Boaro inventou uma nova escalação do São Bernardo. Ele destruiu o sistema defensivo com a substituição de dois titulares que disputam um bom campeonato, o lateral Rafael Cruz e o zagueiro Diego Jussani, trocados por Eduardo e Alex Silva sem ritmo de jogo e sem entrosamento com os demais companheiros.
Alex Silva, anunciado pelo presidente Luiz Fernando Teixeira como a maior contratação da história do São Bernardo, está virando símbolo de um fracasso monumental. Os três gols do Audax tiveram como origem falhas técnicas do ex-são-paulino. Ele deu o bote na hora errada e no lugar errado, abrindo espaços na defesa.
Também errou o técnico Edson Boaro ao escalar o volante Moradei, até outro dia sofrendo consequências de contusão e, portanto, sem a percepção de tempo e espaço que o Audax sabe manipular coletivamente. Completando a lista de bobagens do treinador, a escalação do centroavante Magrão como titular desde o começo, com o deslocamento do também centroavante Lúcio Flávio à função de segundo atacante, deslocado à direita, se comprovou inapropriada. Os dois atacantes não têm velocidade para puxar e completar contragolpes, teoricamente a grande arma preparada pelo treinador do São Bernardo. No intervalo do jogo Magrão foi sacado da equipe, deu lugar ao mais ágil Wanger, mas o peso da individualidade num jogo fortemente coletivo se esvaiu.
Individualizando culpa
Não bastassem todos esses tropeços de escalação que abalaram principalmente o que o São Bernardo exibiu de mais precioso até então no campeonato – um sistema defensivo bem arrumado, apesar das situações de risco quando do aproveitamento de Alex Silva – o técnico Edson Boaro personalizou no meia-armador Cañete a responsabilidade pelos 2 a 0 construídos no começo do jogo. O argentino emprestado pelo São Paulo foi substituído aos 27 minutos. Boaro preferiu reforçar o sistema de marcação com um terceiro jogador de características destrutivas (Carlinhos), que se juntou a Moradei e Marino. A reação de Cañete ao deixar o gramado só poderia ser de reprovação à mudança.
Qualquer outra explicação que se pretenda dar à derrota do São Bernardo contra o Audax se comprovará suplementar ao desarranjo técnico-tático anunciado previamente e executado imprevidentemente. Mexer tanto numa equipe diante de um adversário tão coletivo foi alvo como cutucar onça com vara curta. Da tragédia de Osasco só se salvou o lateral-esquerdo Vicente que, no segundo tempo, jogou mais tempo como meio-campista. Ele foi o responsável pelas três finalizações da equipe que incomodaram o goleiro adversário. Acertou até o travessão, quando merecia ter marcado.
E para quem não entendeu a razão de Edson Boaro infestar o meio de campo de marcadores com pouca habilidade de construção e criação, o comportamento da equipe no segundo tempo, quando trocou passes geralmente sem intensidade e profundidade, foi claro: o medo de sofrer uma goleada o levou a abdicar de vez de qualquer iniciativa ofensiva. O São Bernardo escolheu perder de pouco quando poderia, caso jogasse sem invencionices do treinador, disputar os três pontos para valer.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André