Estou curioso para ver nos gramados o Água Santa de Diadema, um time que não para de subir na hierarquia do futebol paulista e pode, nesta temporada, como integrante da Série B, chegar entre os quatro primeiros e, ano que vem, jogar contra os grandes do Estado. Nada mal para quem até dois anos atrás estava na Quarta Divisão. Afinal, que time é esse? E a organização que lhe dá sustento?
O Água Santa é tanto um terror para os adversários dentro de campo como um enigma fora de campo. Vou ficar com o time que entra em campo porque parece mais confiável.
O time que entra em campo jamais vi entrar em campo. Os jogos do Água Santa coincidem em dia e horário com os jogos do Santo André ou do São Caetano, quando não com os jogos das duas equipes mais tradicionais da região. Ainda não me desloquei para ver a equipe colecionar mais vitórias que derrotas no campeonato de acesso. Dono do melhor ataque da competição, com 18 gols em oito jogos, o Água Santa que conheço não passa de informações de terceiros e de dados estatísticos que, acreditem, significam uma fresta num quarto escuro.
Como os terceiros que conheço e os terceiros que lidam com futebol não são lá muito versados em táticas, não tenho a menor confiança em acreditar no que já ouvi. Prefiro contar com minha intuição. É arriscado desenhar um time sem tê-lo visto em campo, mas vou arriscar dentro de uma margem de erro que não me coloque a nocaute. A um ponto apenas do G-4, o grupo das quatro equipes que subirão à Série A Paulista, o Água Santa pode chegar já na rodada desta quarta-feira ao topo classificatório. Não é pouca coisa.
Sempre no ataque
O Água Santa de 28 gols marcados e sofridos em oito jogos, média superior a três gols por jogo, é um time que joga ofensivamente e não dá muita bola à recomposição defensiva. Já marcou quatro gols em três diferentes jogos da Série B, mas também já sofreu quatro gols num outro jogo. O entusiasmo de sua torcida, formada aparentemente por gente ligada às organizadas das grandes equipes de São Paulo, que se dão à licença poética de conviverem em nome do time de Diadema, aquece a temperatura de cada jogo.
O Água Santa joga movido por um esquema tático francamente ofensivo salvaguardado pela batucada dos torcedores fieis que acompanham os jogadores onde quer que estejam.
Para marcar tantos gols num campeonato tão difícil e equilibrado como a Série B do Campeonato Paulista é preciso ser menos responsável taticamente do que a média geral. Quero dizer com isso que o Água Santa deve ser mesmo um turbilhão em campo. Daria pouca bola, no sentido metafórico, às qualificações técnicas e táticas dos adversários. É egoisticamente doutrinado a atacar sem parar, custe o que custar. Como tem a mesma base de jogadores há várias temporadas, e jogadores que se conhecem dentro e fora de campo como poucos elencos formados às pressas gozam do privilégio da automaticidade de uma engrenagem que envolve velocidade, passes rápidos, mobilidade, agressividade e contundência.
Creio cá com meus botões que existe uma maneira possivelmente provável de superar o Água Santa dentro de campo. Basta não se deixar pautar pela intensidade das manobras. Quem conseguir impor o ritmo de jogo contra o efervescente Água Santa certamente chegará à vitória, porque o Água Santa que os números revelam e que o passado me informa é um time de transpiração e de inspiração, mas de baixa racionalidade. É intempestivo e por isso mesmo pouco reflexivo. Um time peladeiro, no sentido nobre do termo.
Reta de chegada
Resta saber se a característica de jogar e de deixar o adversário jogar resistirá na reta de chegada do campeonato, quando o peso da classificação normalmente aflora. Estaria o Água Santa tão descontraído nas rodadas finais a ponto de manter um esquema de jogo liberalíssimo, de ataques contínuos mesmo que a custa de generosos espaços defensivos? Em campeonatos passados nos quais obteve sucessos seguidos de acessos os adversários menos qualificados não representavam tanto risco nos contragolpes. Serão mais destrutivos agora?
O Água Santa de Diadema está empatado com o último colocado, o Guaratinguetá, no número de gols marcados e gols sofridos ao final de oito rodadas da Série B. Como o Água Santa, o Guaratinguetá protagonizou 28 gols até agora. A diferença é que os dados estão invertidos. O Água Santa marcou o número de gols que o Guaratinguetá sofreu (18) e sofreu o números de gols (10) que o Guaratinguetá marcou. O que isso significa? Provavelmente nada, exceto, quem sabe, a constatação de que as duas equipes são igualmente pouco versadas nas artes táticas, de amarrações tradicionais. Com a diferença de que o que sobra de competência a uma escasseia à outra.
Agora, sobre o Água Santa fora de campo, sobre a estrutura organizacional que o sustenta, eis um enorme ponto de interrogação que necessariamente será retirado ou minimizado à medida que eventuais novos acessos se confirmarem. O modelo vitorioso do time de Diadema precisa ser compartilhado com a sociedade esportiva de modo que seja possível aplicá-lo, adaptá-lo ou simplesmente rejeitá-lo por conta de especificidades não apropriados a outros clubes. O Água Santa que poderia também ser chamado de Água Benta talvez tenha um receituário organizacional exclusivo, moldado e aperfeiçoado conforme o figurino socioeconômico em que está inserido.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André