Administração Pública

Eixo Tamanduatehy é
a chegada do futuro

DANIEL LIMA - 05/05/1999

A dimensão extraterritorial do Eixo Tamanduatehy, cujos reflexos sociais e econômicos vão muito além dos 700 hectares de área com que foi concebido, pode ser aferida pela própria transformação dos estudos urbanísticos em objeto de mostra na 4ª Bienal Internacional de Arquitetura de São Paulo. Lançado com pompa e circunstância em abril deste ano dentro de uma espécie de santuário de longínquos e inesquecíveis  encontros sociais do Grande ABC, o Palácio de Mármore construído no último piso do Moinho São Jorge, em plena Avenida dos Estados, em Santo André, o Eixo Tamanduatehy já é muito mais que um encontro com o amanhã, carimbo com que foi concebido. É o próprio futuro que já chegou. 

Integrante do Programa Santo André Cidade Futuro, deflagrado no final de 1997, o Eixo Tamanduatehy não é mais um projeto que também passou pelo auditório do Masp em abril último, quando reuniu pesos-pesados das áreas de arquitetura e urbanismo, principalmente. 

A transformação do abstrato em concreto eliminou da identidade do Eixo Tamanduatehy o apêndice de projeto. Projeto Eixo Tamanduatehy virou passado porque o futuro incorporou-se nesse trabalho conjunto assinado por equipes encabeçadas por Cândido Malta (Brasil), Crhistian de Portzamparc (França), Eduardo Leira (Espanha) e Joan Busquets (Espanha), com a consultoria dos urbanistas Jordi Borja, da Espanha, e Raquel Rolnik, do Brasil. Sem contar os coordenadores técnicos da Prefeitura de Santo André, Maurício Faria e Horacio Galvanese. 

Fatos mais fortes 

Por que o Eixo Tamanduatehy já rompeu a fita de largada? Porque os fatos são mais fortes e, inseridos nos conceitos-base que vão nortear a materialização desse trabalho que vai invadir as duas próximas décadas do novo milênio, não poderiam esperar pelas articulações que se seguem. Por que esperar se o progresso bate à porta? Desta forma, o ABC Plaza Shopping, o vizinho Hipermercado Extra e a quase pronta UniABC (Universidade do Grande ABC), na Avenida Industrial, estão assumindo também a logomarca que identificará o Eixo Tamanduatehy. 

A nova Estação Rodoviária de Santo André e o Global Shopping, na Avenida dos Estados, em fase de construção, entram na fila de empreendimentos com a chancela do Eixo. A Cidade Pirelli, que ocupará área ociosa da Pirelli Cabos, está prestes a receber o tiro de partida e o símbolo do Eixo Tamanduatehy, desenhado pelo escritório do arquiteto Silvio de Ulhoa Cintra.

Vez do Município

Como se percebe, não é por simples capricho que o Eixo Tamanduatehy não permite mais a esperança contida no verbete projeto. Essa obra que a Bienal Internacional de São Paulo está conhecendo revela também um ângulo todo especial da administração de Santo André. O prefeito Celso Daniel, um dos principais responsáveis pelo ressurgimento do Consórcio Intermunicipal de Prefeitos, instância de Poder Público  regional que estava moribunda, não perdeu a percepção de que Santo André reunia problemas específicos que precisavam ser duramente enfrentados. O passado industrial de Santo André, sabe o prefeito, está profundamente marcado no território do Município, definindo sua estrutura e identidade urbana. 

A grande indústria ocupou espaço central no Município. Localizou-se no eixo de maior acessibilidade de tal forma que um elemento urbano muito forte é a soma de enormes lotes com construções sem continuidade e sem configurar propriamente ruas ou espaços públicos com funções que não sejam exclusivamente de circulação. Essa espécie de vazio de tecido urbano é agravada pela desqualificação do ambiente representado pela Avenida dos Estados, principal eixo viário que estruturou esse espaço e a constante instabilidade das condições de drenagem do canal do Rio Tamanduateí. 

Divisão do Município 

Esse espaço central que se transforma no Eixo Tamanduatehy também funcionou como barreira que separa dois setores de Santo André, implantados desde que a ferrovia atravessou seu território e articulou o primeiro surto industrial e a aceleração do crescimento urbano. 

A idéia de projetar um novo eixo de centralidade, transformando o vale sem tecido urbano em cidade, surgiu em 1997, a partir da identificação das potencialidades do território de cerca de 700 hectares, uma faixa de largura variável que acompanha a Avenida dos Estados e a ferrovia pelos 8,5 quilômetros que cortam o Município, entre São Caetano e Mauá. 

O Eixo Tamanduatehy, simplificadamente, é um programa de requalificação da área, de modo a potencializar os investimentos públicos e privados já previstos e a partir dos quais novos investimentos serão atraídos. É o que Horacio Galvanese chama de intervenção sobre uma dinâmica já em curso que, se deixada ao sabor de empreendimentos esparsos isolados e de porte apenas local, continuará produzindo mais um local de baixa qualidade urbanística, mantendo características de periferia metropolitana.  

Partes iguais

Maurício Faria explica que, do ponto de vista da estruturação do espaço municipal, a urbanização do vale pressupõe a costura das duas Santo André historicamente separadas pela barreira do rio, da ferrovia, da avenida e de grandes plantas industriais. O sucesso do Eixo Tamanduatehy ampliaria também a possibilidade de revitalização do próprio Centro da cidade, conferindo-lhe novo posicionamento regional. Representaria também -- argumenta Maurício Faria -- a afirmação de uma estratégia urbana e de uma nova identidade, e não a recepção pura e simples das demandas avulsas do mercado. Significaria, finalmente, a oportunidade da conquista de espaço aberto e público com grande qualidade urbana, que possa ser apropriado pelo conjunto dos 625 mil moradores de Santo André. 

Os coordenadores-técnicos do Eixo Tamanduatehy vão além de aspectos exclusivamente municipais. Argumentam que o programa estabelece a proposta de geração de nova centralidade com duplo efeito: de um lado estabelece nova relação centro-periferia metropolitana, referindo-se à Capital e seu entorno, redefinindo o que chamam de um protagonismo a partir da anterior periferia. Além disso, afirmam, é crucial que o Eixo Tamanduatehy se situe exatamente na várzea do Rio Tamanduateí, definindo uma centralidade a Sudeste e, assim, invertendo o modelo histórico de concentração de oportunidades econômicas no Centro-Sudoeste. 

Essa nova centralidade de caráter regional, argumentam os dois executivos públicos, deve reverberar na escala metropolitana, já que poderia potencialmente significar uma alternativa para boa parte da periferia Leste e Sudeste da Capital como geradora de atividade e de ocupação econômica, mas também de espaços de lazer, de criação e de consumo cultural, de encontro e festa. 

Qualificação do espaço 

Maurício Faria e Horacio Galvanese acreditam que a particularidade pretendida por essa centralidade em relação às demais existentes na metrópole é a de que o Poder Público estaria agindo de forma a qualificar os espaços como áreas de urbanidade, de uso coletivo intensivo, de mistura de classes sociais, de trabalho, lazer e moradia para diferentes segmentos da população local e metropolitana, nos diversos horários e dias da semana. 

Aos quatro projetos apresentados publicamente em abril no Palácio de Mármore e posteriormente na Avenida Paulista, sucedeu a composição do Grupo Promotor, representado pelo Poder Público, Fórum da Cidadania do Grande ABC, empresários atuantes na área, profissionais de urbanismo do Grande ABC e Imprensa. Esse grupo é encarregado de fomentar o debate público ao mesmo tempo em que deve sistematizar o projeto final e gerir a implementação, preparando as condições para a criação de uma entidade gestora especial que assegure profissionalismo, dinamismo e continuidade do programa, independentemente do jogo político municipal. 

Síntese definida

A síntese dos quatro estudos urbanísticos já se delineia em algumas diretrizes básicas formuladas pelo Grupo Promotor. Prevalece o conceito de que o espaço público com nova qualidade é o fio que vai costurar todo o tecido urbano do Eixo Tamanduatehy, em especial passeios públicos com características de verdadeiros parques lineares ao longo de ruas e avenidas. Também a ferrovia enquadra-se como elemento revitalizador e irradiador da reconversão da área, entre outras razões porque vai integrar os trilhos sem bloqueios à paisagem.

Entre a Avenida dos Estados e a ferrovia o que se terá com o Eixo Tamanduatehy será uma nova malha viária de trânsito local. O verde e a água serão valorizados e se juntarão ao longo de todo o trajeto em combinações variáveis. A natureza, nesse caso, se completará com a preocupação de misturar os mais diferenciados usos dos espaços, de residências a escritórios, de fábricas a áreas de lazer e entretenimento. Uma mistura só comparável com a decisão de evitar que classes sociais se isolem em guetos, aproximando-as geograficamente. 

Detentor do parque industrial mais antigo, fruto do primeiro ciclo de transformação de matéria-prima em produto acabado e, portanto, com tecnologia em geral antiquada, mais intimamente ligado à ferrovia e menos favorecido em relação às rodovias que levam ao Porto de Santos, Santo André sofreu diretamente os efeitos da redução da atividade produtiva. Em contrapartida, viu florescer empreendimentos do setor terciário e acabou por centralizar as funções de comércio e serviços da região, caracterizando-se como uma das principais subcentralidades da área metropolitana. 

O Eixo Tamanduatehy configura-se, nestas circunstâncias, em novo salto histórico de Santo André. Não só histórico. Um salto de qualidade econômica e social jamais experimentado não apenas pelo Município, mas pela própria Região Metropolitana de São Paulo, vítima da falta de planejamento que harmonizasse as necessidades de produzir e consumir riquezas e a distribuição espacial da população com qualidade de vida que a equipe de urbanistas nacionais e internacionais prepararam para o Eixo Tamanduatehy. O futuro já chegou. Não dá mais para recuar.  



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