Os times que ainda estão disputando espaço na Primeira Divisão (Série A-1) do Campeonato Paulista do ano que vem só têm uma vaga a preencher. Se o futebol não for violentado nos jogos que restam, o Água Santa de Diadema homologará o título de campeão da temporada. Isso quer dizer que o Santo André, adversário do Água Santa, já está marcado para morrer? Não é bem assim, mas quase assim.
No outro jogo de semifinalistas, XV de Piracicaba e Internacional de Limeira vão decidir quem será derrotado pelo Água Santa na final.
Se que a torcida do Santo André não vai gostar dessas linhas, mas nada posso fazer exceto levantar a bandeira branca da paz e sugerir que se acredita no imponderável para que a chegue à finalíssima. E o imponderável pode ser chamado também de “clássico”.
Embora sem tradição, as duas equipes representam a região e por isso o jogo se apresenta como especial. Clássico é clássico e vice-versa – eis o mote para o Santo André tentar salvar a lavoura improvável.
Quase outro adversário
Faltou muito pouco para o Santo André não enfrentar o Agua Santa. No jogo de ontem à noite, que completou mata-matas das quartas de final, o time de Limeira chegou a sofrer uma virada de dois a um aos 48 minutos do segundo tempo. O resultado o classificaria, mas o colocaria, no saldo de gols, diante do Água Santa. Dessa forma, o Santo André enfrentaria o XV de Piracicaba. Mas não é que em seguida ao gol da Portuguesinha o Internacional empatou e fugir do embate mais indigesto da fase decisiva?
O Água Santa do técnico Márcio Ribeiro é tão melhor que os outros, mas tão melhor, que, houvesse algo como um fair-play qualificado, uma reunião entre os demais competidores poderia dispensar a fase final, que formalizará os dois melhores da temporada. Ou seja: quem ganhar o outro jogo da semifinal saberia antecipadamente que se classificaria como vice-campeão.
Sei que tudo isso parece precipitado, como o é de fato quando se considera que em futebol tudo pode acontecer. Mas há uma razão explícita, não o deboche ou o sabetudismo: quero dar a dimensão do fosso técnico e coletivo do time de Diadema em relação aos demais. Ou seja: para que seja possível repassar um conceito de grandeza, escolhi o caminho ousado da certeza em forma de previsão.
Fico muito à vontade para escrever sobre o Água Santa. Na escala de torcida pelos times da região, está em último lugar. Não vou explicar as razões, mas para bom entendedor, um trecho basta.
Melhor entre todas
Entretanto, negar o inegável seria estupidez: a equipe que liderou toda a fase classificatória e se deu ao luxo de poupar jogadores sem temer a perda de invencibilidade é tão superior às demais que chega a ser acintoso a Federação Paulista de Futebol não a ter consagrado nova integrante da Primeira Divisão.
Brincadeira à parte, o fato é que o Água Santa que vai subir este ano é bem diferente do Água Santa que subiu anteriormente e só durou uma temporada na Primeira Divisão. Ao invés de chutão, força física, valentia, pressão sobre o árbitro, torcida hostil, o Água Santa é talento. Usa um arsenal para superar os adversários. Tem técnica, estratégia de jogo, variação de jogadas, talento individual e tudo que se imagina de um concorrente praticamente imbatível num campeonato de acesso.
Os dois jogos das quartas de final contra o Taubaté foram uma covardia. O placar agregado de sete a zero (cinco a zero no Interior e dois a zero sábado em Diadema) não reproduz com fidelidade a distância entre as duas equipes. Não puxasse o freio de mão no segundo jogo, o Água Santa teria repetido o placar do primeiro jogo.
Risco calculado
Sei que corro o risco de o futebol me aprontar uma surpresa, porque tudo é possível quando a bola rola, inclusive a Seleção Brasileira recheada de craques perder a Copa do Mundo de 1982.
Mas mesmo assim vou em frente nessa projeção nada maluca: o que está em disputa agora na Série A-2 é o segundo lugar. Essa conclusão poderia, em tese, bombardear a lógica histórica de que não há favorito ou favoritos na Série A-2, inclusive quando a disputa está se afunilando. O Água Santa é a exceção que confirma a regra. É um time muito acima dos demais.
Agora, quem achar que ao ficar em terceiro vai subir para a Primeira Divisão se dará mal. O regulamento da Série A-2 é muito claro, como estou cansado de afirmar.
O problema da Imprensa que não se aprofunda nos regulamentos é o efeito-papagaio, que consiste em alguém desabrochar uma rosa de impropriedades que, em seguida, vira um imenso jardim de incorreções.
Tornou-se, por isso, quase unânime a leitura enviesada de que o regulamento da Série A-2 favorece o terceiro classificado diante da possível vaga que vai se abrir na Série A-1 por conta da fusão entre Bragantino e RB Brasil.
Repetição de bobagem
A repetição de uma bobagem torna a bobagem ainda maior. Uma espécie de suprassumo da bobagem, para ser mais preciso. O Departamento Técnico da Federação Paulista de Futebol já deveria ter-se pronunciado oficialmente sobre isso. Mas ao que parece a FPF gosta de emoções.
O Departamento Técnico não terá outra saída senão confirmar o que escreveu no regulamento da Série A-2. E o que escreveu só dá direito ao terceiro colocado do campeonato subir para a Primeira Divisão em caso de desistência de um dos finalistas da Série A-2. Está tudo no papel. Só não enxerga quem é cego de paixão ou de malandragem. Ou de teimosia. Ou de estupidez. Ou é um descuidado sem cura.
Mas, voltando ao que interessa hoje, ou seja, o futebol de campeão do Água Santa, pensei muito sobre a possibilidade de construir este artigo no tom que se segue. Vi poucas vezes o Água Santa jogar. Os adversários finalistas do mata-mata também. Mas foi o suficiente.
Reconhecimento rápido
Quando um time é bom a gente não precisa de muito tempo para detectar. O Água Santa tem individualidades e coletivismo. Joga fácil, ocupa os espaços defensivos e ofensivos com muitos jogadores, tem espirito competitivo, controla a emoção e faz uso da experiência para aquecer ou desaquecer um jogo. Nenhum dos demais times se aproxima disso.
Devo lembrar, também, que estava decidido a escrever tudo isso sem pestanejar, confiando no meu taco, mas, precavido, ouvi dois treinadores que atuaram na competição. Eles confirmaram a exuberância do Água Santa em relação aos demais.
Isso só me leva a consolidar a ideia central de que um time bom é bom mesmo quando perde. Como foi o caso do primeiro jogo que vi do Água Santa, na derrota para o São Bernardo no Estádio Primeiro de Maio. Na verdade, não foi o time de Diadema que perdeu, foi o técnico Sérgio Soares, do São Bernardo, quem armou uma arapuca tática devastadora.
Talvez a boia inspiradora e de salvação que possa levar o Santo André a surpreender de novo em uma etapa decisiva da Série A-2 do Campeonato Paulista, como em 2016 diante do favoritíssimo São Caetano, seja o desempenho tático. O técnico Fernando Marchiori é um devoto do trabalho intenso de perscrutar os detalhes dos adversários. Vasculha tudo que é possível. Por isso a perspectiva de atrapalhar o Água Santa não pode ser descartada. O problema maior é que tudo tem limite. E o Santo André, como se viu nos dois jogos com o Rio Claro, é bom no cumprimento de tarefas táticas mas conta com individualidades que não fazem a diferença. O veterano Cristian, 39 anos, é quem mais se sobressai.
Os torcedores do Santo André que me desculpem, mas não há como deixar de registrar que o Água Santa é bem melhor. Os números do campeonato provam e comprovam o que os gramados registram, sem oscilações nas últimas rodadas. Por isso, talvez o melhor mesmo seja rezar para o Sobrenatural de almeida aparecer em campo.
Total de 985 matérias | Página 1
05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André