Esportes

Um possível pentacampeonato
festivo e também esclarecedor

DANIEL LIMA - 29/04/2019

O torcedor do Santo André deve comemorar nesta quarta-feira, feriado de primeiro de maio, o pentacampeonato da equipe na Segunda Divisão (Série A-2) Paulista. Provavelmente, preferiria ser torcedor do Ituano, que desde 2001 está na Primeira Divisão (Série A-1). Afinal, o desempenho do Santo André na competição, de bate-e-volta entre as duas divisões, revela dificuldade imensa de se acertar como agremiação também fora das quatro linhas. O Ituano é um caso raro de equipes de menor expressão que não conhecem rebaixamentos seguidos. O arcabouço empresarial que o sustenta explica tudo.  

É claro que os torcedores do Santo André devem comemorar a conquista que se aproxima. Afinal, a derrota de dois a um em Limeira diante de um Internacional que não é nada disso, mas também não é galinha morta, é perfeitamente reversível. Mas o resultado da competição é emblemático da situação do futebol regional. 

Salvo surpresa, o Santo André será o único representante da região na Primeira Divisão do ano que vem. O São Caetano foi rebaixado dentro de campo, enquanto o São Bernardo quase afundou rumo à Terceira Divisão e o Água Santa de Diadema nadou, nadou e morreu na praia. 

Nada de Brasileiro

O pior do momento (e bota momento nisso) do futebol da região nestes tempos (longos tempos, aliás) em que bola e dinheiro fazem parceria inescapável, é que não temos uma única representação no circuito nacional. Traduzindo: não temos um time sequer mesmo na Quarta Divisão (Série D) do Campeonato Brasileiro. O São Caetano está classificado para esta temporada, mas o regime de disputa é quase lotérico: quem não se classifica à Série C, volta à fila classificatória da Primeira Divisão de São Paulo. 

Sei que esse não é o ambiente jornalístico que se deveria abordar poucas horas antes de o Santo André decidir um título importante no principal campeonato de acesso estadual do País, mas aprendi que é sempre conveniente, embora pareça inconveniente, lembrar que estamos na periferia da bola. 

E permaneceremos nessa mesma periferia porque nosso futebol surgiu teimosamente para ficar escanteado. Não temos vaga no Clube dos Ricos. Nem mesmo no Clube dos Remediados da hierarquia do futebol brasileiro. Nosso Capital Social típico de suburbano não nos permite grandes voos. O histórico de exceções confirma a regra. 

É possível que somente com algo semelhante ao que está se dando agora com o Bragantino, incorporado pelo multinacional Red Bull, uma equipe de futebol da região obtenha êxito no cenário nacional por anos a fio. 

O São Caetano foi uma janela que se abriu e se manteve aberta durante a primeira década deste século porque gozava de condições empresariais excepcionais.

Vaga à venda

Quando escrevi logo acima que somente uma surpresa retiraria a exclusividade de o Santo André representar a região na Primeira Divisão do ano que vem me referia à ocupação da vaga a ser deixada pelo Red Bull, após a fusão ou o que seja com o Bragantino. 

Embora o regulamento dê ao São Caetano o direito de permanecer na Primeira Divisão, conforme já esmiucei exaustivamente, duvido que o Red Bull deixará de graça o espaço redundante após o negócio com o Bragantino. 

A diretoria do Red Bull haverá de dar um nó jurídico para reduzir o investimento feito na absorção do Bragantino, de supostos R$ 45 milhões. Não faltam clubes interessados em comprar a vaga na Primeira Divisão Paulista. 

O problema é o encaixe de legalidade que deverá ser obedecido e que provavelmente exigirá alquimia muito especial para não se constatar fraudulenta. Fosse simples a troca de nome o mesmo Red Bull não entraria apenas como patrocinador do Bragantino na Série B do Campeonato Brasileiro. 

Abutres vão atacar 

Voltando ao penta do Santo André, não tive tempo nem paciência para pesquisar, mas como tem uma dúzia de jornalistas que só se dedicam ao futebol da região, não custa nada que o façam: se foram quatro conquistas de título da Segunda Divisão desde 1975 (do Ramalhão de Tulica e outros craques que acompanhei então como jornalista esportivo exclusivo, o que não sou há muito tempo), quantos rebaixamentos teriam ocorrido nessa trajetória, só no futebol paulista? Possivelmente o dobro, não é verdade? 

Minha preocupação passageira ao escrever este texto no tom que escrevo é que abutres de sempre deem ao material conotação destrutiva. Nada pior. Escrevo num contexto que vem de longe e que tem como premissa principal o empenho das diretorias dos clubes da região em manter acesa a chama do profissionalismo neste subúrbio da Capital. 

Reparem os leitores que jamais escrevi um texto de esportes que contenha a expressão “Província do Grande ABC”, de citações fartas em outras temáticas. Sabem por que? Porque tenho imenso respeito pela maioria desses dirigentes, embora também jamais deixasse de destacar alguns aventureiros que aportaram na região por conta de interesses principalmente político-partidários. Caso específico do São Bernardo dos tempos do presidente Luiz Fernando Teixeira.

A falta de Capital Social é o grande entrave a um cavalo de pau na histórica fragilidade do futebol do Grande ABC. Os tempos do São Caetano e os intermitentes sucessos do Santo André são oásis de competência num oceano de complexidades. 

Sem o respaldo da sociedade em todos os sentidos da expressão não teremos outra coisa a fazer senão comemorar títulos da Segunda Divisão. Que são bem-vindos, claro, mas insuficientes. E esclarecedores.



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