Já faz um mês que revelei o que a imprensa esportiva em geral, que trata do chamado futebol do Interior, ainda não se deu ao trabalho de noticiar, mas que terá de noticiar porque não há como fugir da realidade publicada em primeiro lugar por quem não é exclusivamente cronista esportivo: o Santo André, também conhecido por Ramalhão, virou Água Santa.
E se virou Água Santa vão ter de se enfrentar em breve, na Copa Paulista. Teremos, portanto, Ramalhão versus Ramalhão. Vai ser interessante.
Juro que gostaria de estar na pele do técnico Fernando Marchiori e dos jogadores do Santo André, que ergueram a taça de campeões da Série A-2 (Série B), quando, agora com a camisa do Água Santa, virem do outro lado do gramado, ou mesmo antes, durante a execução do Hino Nacional, o Santo André totalmente modificado em campo. Que sensação memorável os impactará? O jogo, como se o destino pretendesse brincar ou zombar dos protagonistas, está marcado justamente para o Estádio Bruno Daniel, dia 21 de julho.
Acidente esportivo
Por mais que sejam profissionais, todos que vestiram a camisa do Ramalhão recentemente vão se sentir algo incomodados porque não deixaram o clube vitorioso por outra razão senão porque o clube vitorioso em campo não tem estrutura para se sustentar em nível competitivo mesmo na Segunda Divisão.
O Santo André campeão foi mais uma vez um acidente esportivo, gerado pela força da experiência em cortar atalhos. Era um dos mais baixos orçamentos da competição, flertou com o rebaixamento até as rodadas finais e, de repente, lá estava na série de mata-matas e, mais que de repente, lá estava festejando o título.
Foi em 15 de maio que, mais que noticiar a transferência de praticamente todo o time titular do Santo André para o Agua Santa de Diadema, além do técnico Fernando Marchiori, também dei tratos à bola de analisar a situação do time que foi campeão desta temporada do principal campeonato de acesso do País.
O Santo André que virou Água Santa está consolidado mesmo. Nada fugiu ao que descrevi. Só achei desnecessário dar nomes aos bois das transferências, ou seja, nominar os jogadores que se escafederam.
O mais importante era e continua a ser o conceito que procurei destilar. Ou seja, o Santo André é o primo pobre embora rico em tradição e o Água Santa é o primo rico, embora pobre em tradição.
Trata-se de contrassenso que se explica pelo modus operandi administrativo das duas agremiações.
Modelos distintos
O Santo André é tocado na base do voluntarismo e persistentemente distante da política partidária, enquanto o Água Santa é mobilizado por gente que vê muito além de uma bola no gramado e conta com forte influência político-partidária.
O Água Santa é uma organização político-esportiva. Disso a mídia não trata porque a mídia em geral tem medo de tratar. Podem os jornalistas ser desrespeitados no Estádio do Inamar, onde o Água Santa manda os jogos, que ninguém levantará a voz para contestar. Estive no Inamar uma única vez e vi tanta coisa feia que jamais voltei. Nem pretendo.
Há certas situações que a vida nos reserva e da qual não toleramos repetição. Quando uma classe de profissionais é humilhada, como o foi naquele jogo entre Água Santa e São Caetano, e não existe reação alguma, é melhor fechar o caixão da indignação e se limitar a ignorar novas possibilidades.
Clássico? Calma
Ainda está longe o dia em que o confronto entre Santo André e Água Santa deva ser catalogado como clássico. Considerar esse jogo além de um confronto entre adversários da mesma região é exagerar na dose. A etimologia esportiva de “clássico” supõe tradição e grandes confrontos. Não é o caso de Água Santa versus Santo André.
Por isso mesmo o que mais chamará a atenção no encontro que farão em breve é que um time praticamente inteiro do Santo André, dirigido pelo técnico Fernando Marchiori, estará vestido com a camisa de desenho de péssimo gosto do Água Santa, com aquela cruz estilizada a ocupar todo o espaço frontal.
Salvo engano –e bote salvo engano nisso – o que teremos no dia desse jogo que um dia haverá de ser clássico, mas ainda não é, certamente será algo inédito no futebol brasileiro, quem sabe internacional. Ou o leitor discordaria da interpretação de que um time praticamente inteiro que troca de camisa e enfrenta um time cujas camisas foram trocadas não é um prato cheio à Imprensa que pretenda sair da mesmice?
Pois é exatamente disso que se trata. E, salvo um novo milagre, desta vez o Água Santa tem tudo para vencer o Santo André. Ou melhor: o Santo André tem tudo para vencer o Santo André. Afinal, o competente técnico Fernando Marchiori já tem as linhas azeitadas, depois de testá-las e aprová-las até outro dia com a camisa do Santo André contra o então favoritíssimo Água Santa, cujo destino, pós-desclassificação pelo Santo André, foi se livrar praticamente de todos os jogadores que fracassaram.
Mais responsabilidade
No pragmatismo típico de um time que precisa de resultados positivos a qualquer custo, o Água Santa agiu com sabedoria ao rebocar um time inteiro que não precisa ser testado. Basta disputar a competição que está se aproximando. Agora, entretanto, com o peso do favoritismo do título conquistado com outra camisa e outra gestão.
Será que vai dar certo? Vamos ver. E para os mais detalhistas, eis os nove jogadores que atuaram pelo Santo André e que já estão prontos para vestir para valer a camisa do Água Santa: Tomazella, Rhuan, Denis, Jonathan, Fabiano, Rafael Toledo, Jobinho, Anselmo e Maikinho. O meia-armador Christian, um dos destaques da campanha do Santo André, só não continuará vestindo azul, do Água Santa, porque resistiu à proposta e preferiu a camisa grená da Ferroviária de Araraquara.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André