Esportes

Deixem de preguiça: tratem de
ler o regulamento da Série A2

DANIEL LIMA - 09/08/2019

A propósito do que chamo de “vaga da discórdia” do Campeonato Paulista da Série A1 da próxima temporada, que ainda permeia debates e pode ter desdobramentos inclusive do Código em Defesa do Consumidor, o que impediria a realização da competição, vou reproduzir mais uma vez, e agora de forma mais enfática, o Artigo Nono, Parágrafo Primeiro do regulamento da Série A2 desta temporada. 

Antes disso, para dar aos leitores mais uma prova de que não tenho compromisso com o erro, listo algumas tipologias de fraudadores potenciais do que está expresso à ocupação do espaço que seria aberto pelo Bragantino Red Bull. Ou seja: vou categorizar os apologistas da tese de que o terceiro colocado da Série A2 teria direito a acesso. Quem são eles? Pervertidos interpretativos? Inocentes úteis? Vamos às variáveis possíveis: 

 Torcedores disfarçados de jornalistas.

 Leitores preguiçosos.

 Mau-caratismo em estado bruto.

 Vendilhões da alma profissional.

 Ignorantes renitentes. 

 Covardes profissionais.

 Deformadores de opinião.

 Marias vão com as outras. 

 Vaquinhas de presépio. 

Vou parar por aqui porque possivelmente se tornam desnecessárias outras individualizações que estimulam combinações entre si. Ou seja: há muito potencial de covardes profissionais também trafegarem no terreno típico de vaquinhas de presépio, quando não de deformadores de opinião, e muito mais. 

Leiam, leiam

Se o leitor me perguntar qual dessas categorias mais se manifesta sobre o caso, diria que é a de ignorantes renitentes, ou seja, de gente que simplesmente não se dá ao trabalho de ler com a devida atenção o núcleo mais importante do regulamento da Série A2. 

Pois vou dar a eles, agora, mais uma oportunidade de deixarem a escuridão de especulações movidas por gente sem escrúpulos e, também, pela arrogância dos simplistas. Seguem o Artigo Nono e o Parágrafo primeiro do regulamento de acesso. 

Artigo Nono – Terão direito de acesso à Primeira Divisão (Série A1 de 2020, os dois clubes classificados para a fase final da competição.

Parágrafo Primeiro – Em caso de não participação de algum clube classificado para o Campeonato Paulista de Futebol Profissional (Primeira Divisão, Série A1 de 2020), terá também acesso o clube que obtiver a 3ª melhor campanha no Campeonato Paulista de Futebol Profissional, Primeira Divisão, Série A2 de 2019, dentro os que disputaram a fase semifinal. 

Vamos agora ao que chamaria de exegese do exposto. 

Primeiro: embora o regulamento tenha sido redigido de forma a eliminar qualquer interpretação em contrário se o mundo do futebol não fosse alimentado por oportunistas de plantão, qualquer profissional de comunicação que se junte a um profissional da área jurídica formularia uma redação mais explicitamente esclarecedora. Algo que bloquearia tentativas que se tornaram frutíferas de levar no bico jornalistas incautos e preguiçosos. 

Segundo: o Artigo Nono é peremptório na definição do universo de equipes que se classificariam para a Série A1 da temporada seguinte. Ou seja: são apenas duas. Repetimos: são apenas duas, no caso Santo André e Internacional de Limeira, que chegaram em primeiro e em segundo lugares após passarem pela semifinal.

Terceiro: o Parágrafo primeiro admite o acesso do terceiro colocado entre os semifinalistas da Série A2, no caso o Água Santa de Diadema, somente se um dos dois primeiros colocados entre os semifinalistas desistir do acesso. Repetimos: o Água Santa de Diadema só subiria se o Santo André ou o Internacional de Limeira comunicar desistência da Série A1 à Federação Paulista de Futebol antes da realização do Conselho Técnico, conforme define o Parágrafo segundo do mesmo Artigo Nono. 

Quarto: voltem à leitura e constatem mais uma vez: o terceiro colocado da Série A2 poderia levar um caminhão de dúvida interpretativa quanto à possibilidade de ocupar a vaga do Bragantino Red Bull (que se incorporaram e detêm duas vagas na Série A1, uma das quais indevidamente por força de lei) se não houvesse a restrição explícita, ou seja, o condicionante de pleitear o acesso. Que condicionante? A imperiosidade de um dos dois primeiros colocados da Série A2 desistir da Série A1 do ano que vem. 

Campo e regulamento

Escrevi vários textos durante a disputa da Série A2 do Campeonato Paulista desta temporada. Não vi até que houvesse os confrontos com o Santo André, nenhuma equipe que chegasse aos pés de qualidade do Água Santa. Disparadamente a melhor equipe da competição até então. O sucesso desceu às chuteiras, a arrogância dominou o elenco e a eliminação diante do Santo André foi a consequência natural da falta de controle do ambiente corporativo na fase mais importante do campeonato.

Tudo isso, entretanto, não me leva de forma alguma a cair em dupla armadilha. Que armadilha dupla? De que por força de ter sido a melhor equipe ao longo da competição o Água Santa teria o mérito esportivo de chegar à Primeira Divisão, nem que para tanto se utilizasse de uma fraude regulamentar. 

E também, segundo os cultivadores da fraude, de que é possível definir como insofismável o caráter meritocrático da ocupação da vaga por uma equipe que chegou em terceiro lugar na Segunda Divisão, diante de uma equipe (São Caetano), que terminou a Série A1 em 15º lugar na classificação final. Medir meritocracia quando os adversários são outros é subjetividade pura. O São Caetano enfrentou equipes muito mais qualificadas que o Água Santa. Basta compará-las na hierarquia do futebol paulista.

Subjetividades, não 

Mas subjetividades não interessam de fato agora. A questão é técnico-regulamentar. E não há quem sustente com provas ter o Água Santa ou qualquer equipe que chegasse em terceiro lugar na Série A2 o direito de ocupar a vaga que se abrirá com o rebaixamento ou auto-rebaixamento do Bragantino Red Bull na próxima temporada. 

O regulamento está aí para provar. Quem, após essas novas e repetidas explicações, entender o contrário, exercitará o direito democrático de livre opinião com o complemento comprometedor de que assumiria também a burrice autoritária de apego à fraude. 

Leiam, leiam 

Para complementar, como já escrevi em outras ocasiões, é possível que a Federação Paulista de Futebol tenha confundido as bolas ao incentivar nos bastidores que o terceiro colocado da Série A2 tem legitimidade ao acesso. Prendem-se os dirigentes da FPF ao regulamento da Série A2 que vigorou até a temporada de 2016. Leiam com atenção o Artigo Nono, Parágrafo primeiro, daquela disputa:

Artigo Nono – terão direito de acesso à Primeira Divisão (Série A1 de 2017) dois clubes classificados para a fase final da competição.

Parágrafo primeiro – Em caso de desistência formal de algum clube participante do Campeonato Paulista de Futebol Profissional (Primeira Divisão, Série A1 de 2017), terá também acesso o clube que obtiver a 3ª melhor campanha no Campeonato Paulista de Futebol Profissional (Primeira Divisão, Série A2 de 2016), dentro os que disputaram a fase semifinal.

Explicando a mudança

Leram com a máxima atenção? Então vamos para os detalhes comparativos em relação ao regulamento da Série A2 desta temporada:

Existe uma substituição elucidativa a distinguir uma competição da outra (ou seja, a disputa do acesso em 2016 e 2018) quanto ao uso do verbete “participante” e do verbete “classificado”. Traduzindo: se no regulamento desta temporada houvesse a manutenção do primeiro, de 2016, o Água Santa de Diadema não precisaria contar com mágicas interpretativas para requerer o Acesso. 

Na temporada de 2016, o Água Santa seria remetido diretamente à vaga da equipe “participantes” da série A1 que desistisse da competição. Já nesta temporada, o Água Santa depende da desistência de uma das equipes “classificadas” para a Série A1 de 2020. 

Por essas e tantas outras, repito que aquelas categorizações acima são uma maneira possivelmente menos diplomática, mas essencial a acabar com essa besteiragem de que o terceiro colocado tem direito de Acesso. Tem nada. 

Se o Código do Consumidor for acionado por qualquer torcedor, o Campeonato Paulista do ano que vem vai para o espaço. Qualquer um pode tomar essa iniciativa, porque simplesmente há uma fraude a caminho para satisfazer interesses que poderiam ser desmascarados. 

O jornalismo esportivo que ainda não se deu conta do que se passa e insiste em martelar bobagens regulamentares (embora haja cada vez mais profissionais que já entenderam o riscado) perde uma grande oportunidade de reduzir a carga de maliciosidades que alimentam engrenagens mais que suspeitas. 



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