Continuamos a publicar supostamente quase todos os principais parágrafos do Parecer Jurídico que desclassifica a insistente tentativa da Federação Paulista de Futebol de incluir na Série A1 do Campeonato Paulista da próxima temporada o terceiro colocado da Série A2, por conta da provável retirada compulsória do Red Bull. Trata-se de uma aberração às normas da competição.
Como temos explicado desde o primeiro capítulo desta minissérie (este é o terceiro, correspondendo à soma de 12 trechos do Parecer Jurídico), o emissário do material que reproduzimos não dá maiores informações sobre a ordem numérica dos textos. Apenas assegurou a veracidade das informações. Veracidade posta à prova por este jornalista em comunicação direta com o autor do documento.
E o autor é sumidade no mundo jurídico. Tanto que vamos expor mais alguns dos atributos do currículo liberado pelo emissário. A identidade do profissional só será tornada pública quando assim o entender o representante do movimento, ação individual ou algo que o valha que decidiu recorrer ao especialista para desmascarar a Federação Paulista de Futebol.
Como se sabe, a FPF ainda não oficializou a agressão ao regulamento, mas está a caminho disso, já que nos bastidores e, inclusive em reuniões com dirigentes de clubes filiados, fez repassar o que já houvera feito antes mesmo de a disputa da Série A2 ser encerrada: o terceiro colocado da Série A2 ocuparia o espaço vacante na Série A1.
Comissão Jurídica?
Os dirigentes da FPF (inclusive os titulares de uma mais que estranha Comissão de Assuntos Jurídicos, cujos alguns integrantes merecerão capítulo à parte, agora deste jornalista) fizeram massificar junto à Imprensa do Interior que o Artigo Nono, Parágrafo primeiro, do regulamento da Série A2 deveria ser a prova de uma decisão que, observada e analisada minuciosamente pelo especialista, deveria ser jogado no lixo.
Apresentamos na sequência mais algumas qualificações do responsável pelo Parecer Jurídico que ganhará forma de ação na Justiça Esportiva e também, se necessário, segundo o mesmo emissário, junto à FIFA. Além disso, o São Caetano recorreria à Justiça Comum por perdas e danos. O mesmo São Caetano que descarta qualquer iniciativa na Justiça Comum quanto à defesa dos direitos regulamentares que o Parecer Jurídico consolida. Ou seja: o São Caetano não vai invadir juridicamente espaço estranho às disputas esportivas, mas não se aquietaria diante de uma barbaridade interpretativa emanada, segundo informações, de interesses que corrompem a legitimidade do regulamento.
O autor do Parecer Jurídico é titular da Academia Paulista de Letras Jurídicas, membro do Conselho Superior de Direito da Federação do Comércio de São Paulo, Coordenador-Geral da Revista Brasileira de Estudos Constitucionais da Editora Fórum, examinador de aproximadamente 400 bancas de qualificação, mestrado, doutorado, livre-docência e concursos públicos em todo o Brasil e no Exterior.
Na edição de amanhã mais competência será exposta. Agora vamos aos quatro blocos de textos desse terceiro capítulo de desmascaramento do golpe pretendido pela Federação Paulista de Futebol com a anuência das vaquinhas de presépio de sempre – inclusive da silenciosa parcela da mídia reprodutora de oficialidades encabrestradoras:
Primeiro bloco
Do ponto de vista tanto do Regulamento da Série A1, quanto do Regulamento da Série A2, é inquestionável que a exigência é, no tema que nos interessa, de que haja possibilidade ascensional para Clubes não integrantes da referida Série A1. Neste ponto, os Regulamentos realizam um movimento convergente, para regular a hipótese da abertura, quer dizer, de clubes que alteram posições seriais ou que deixem a Série à qual pertenciam. Ao ascenderem a uma Série superior, os trânsfugas simbolizam a essência competitiva, seja a passada, seja a futura, estimulando que todos demais busquem esse mesmo resultado em campeonato posterior. Para tanto, como sabemos, é necessário que haja a abertura das respectivas “vagas” na Série A1. Essas vagas, é certo, podem ocorrer pela desclassificação (e subsequente rebaixamento), mas também por outras ocorrências não-corriqueiras, mas igualmente legítimas. No caso do Regulamento da Série A1, está contemplado o acesso de dois clubes da Série A2, pela abertura, que é impositiva nessa normativa, de duas vagas dentre os integrantes desse Campeonato em 2019. A regra geral dessa abertura está no art. 9o, parágrafo único, que a assegura por meio do rebaixamento de dois clubes. “Parágrafo Único - Concluída a primeira fase os 02 (dois) Clubes que obtiverem o menor número de pontos ganhos, independente do grupo, serão rebaixados à Primeira Divisão - Série A2 de 2020, observando-se, caso necessário, os critérios de desempate previstos neste REC.” (original não grifado).
Segundo bloco
É certo que qualquer compreensão do tema “rebaixamento” requer que se leve em consideração, como ponto de partida essencial, o quanto foi disposto nesse parágrafo único do art. 9®. Mas a leitura de uma norma jamais poderia ocorrer legitimamente de maneira isolacionista. Essa norma, juntamente com outras que analisarei abaixo, está no centro da celeuma instaurada. Nela se fala do rebaixamento de dois clubes. Uma das soluções aventadas na grande mídia está conectada a uma leitura enviesada dessa norma. Trata-se da tentativa de transformar o mencionado parágrafo único do art. 9o em regra superior quanto às demais e, concomitantemente, como regra que haveria de ser lida em esplendor isolacionista, como uma norma plena em si mesma, independentemente de outros acontecimentos e regras do mesmo Regulamento. Essa é uma proposta que não se coaduna com o próprio Regulamento, como veremos, e ignora a organicidade de um corpus próprio de regras.
Terceiro bloco
O objetivo do campeonato não é, necessariamente, rebaixar os dois últimos colocados integrantes da sua Primeira fase, mas sim o de abrir duas vagas, dentre os integrantes dessa Série, para que funcione o sistema de incentivos e a conexão mínima com a Série seguinte, a A2. Ou seja, é necessário que se abram duas vagas na Série A1. O parágrafo único traz apenas a hipótese mais comum de abertura dessas vagas, não impedindo a ocorrência de uma hipótese excepcional, desde que não atente contra os postulados do Regulamento (como seria o caso, por exemplo, de uma fraude ou de um “convite” para retirar-se). Mais ainda, há uma regra de ouro para o caso presente, que fornece uma normativa expressa para soluções demandadas em face de hipóteses excepcionais. Ela está contida no art. 50 do Regulamento da Série A1: “Art. 50 - Os casos não previstos neste REC serão interpretados pelo DCO, observando-se os termos do RGC, prevalecendo este REC sobre o RGC na existência de conflito. ”
Quarto bloco
Insisto neste último ponto com o registro de que tanto o REC como o RGC são peremptórios em afirmar que em caso de conflito deve sempre prevalecer a normativa do REC, por ser este o Regulamento mais específico. Adota-se, expressamente, o princípio da especificidade, que deve sempre reger e guiar o intérprete atento. O Regulamento Geral (RGC) reforça essa mesma precedência dos Regulamentos das Competições (mais específicos) para solucionar as questões específicas, fazendo-o em seu art. 4o, parágrafo único, no que é seguido pelo REC da Série A1 de 2019 em seu art. 50, como visto acima. A especificidade do Regulamento da Série A1 é característica incindível desse sistema de normas. É que, indubitavelmente, há previsão de outras fontes de produção de normas, cujos poderes e limites cumpre compreender. Estou me referindo, especialmente, ao art. 33 do Regulamento Geral, que deve ser detidamente abordado a fim de esclarecer o que vai nele disposto: “Art. 33 - Caberá ao DCO expedir instruções complementares necessárias à aplicação deste RGC, bem como resolver eventuais casos omissos. ”. Observo que o art. 50 do REC e o art. 33 do RGC estão tratando de situações distintas. O art. 50 trata da interpretação (de resto, sempre necessária) a ser feita pelo DCO, impondo que se realize com estrita observância “[d]os termos do RGC”. É o que vínhamos falando e o quanto nos interessa. Já o art. 33 do RGC está reconhecendo uma capacidade normativa para o referido Departamento (DCO), que se distancia de nosso interesse. Vejamos o que esta significa, exatamente para espancar qualquer dúvida e afastá-la do presente caso. O Departamento de Competições da FPF pode, nos termos regulamentares, expedir essas instruções, com base no art. 33 do RGC. Mas para editar essas instruções complementares, ainda que relacionadas a pontos omissos (do Regulamento Geral, como veremos), estas instruções i) devem ser prévias ao campeonato em questão e ii) devem respeitar aos pressupostos indicados no próprio Regulamento Geral, ou seja, estamos diante de uma normatização possível, mas secundária e limitada. Ela é secundária em relação ao Regulamento Geral, e a este se dirige exclusivamente. Quanto ao primeiro item, é possível concluir que cada vez mais tem havido maior especificação e detalhamento das regras relacionadas às competições esportivas, como consequência de uma maior civilidade, como dizia Brugi e gerando melhor qualidade das competições. E, no atual estágio civilizatório, são inadmissíveis normas ex post factum a alterar modelos e resultados das competições. O esporte é exercício de poder e, como tal, há de se adequar estritamente a regras jurídicas, ainda que próprias (autonomia do esporte em relação ao Estado), mas editadas com respeito à previsibilidade e segurança jurídicas, proibindo-se, assim, a surpresa. Como já assinalei a esse respeito, em lição de todo aproveitável para o caso específico aqui relatado. Assim, quando o REC, de 2019, da Série A1, objeto de nosso interesse, refere-se ao DCO para abordar sua atividade interpretativa, e não sua atividade normativa (via instruções), temos como resultado inequívoco desta análise que as regras a serem adotadas em casos omissos são as regras do RGC, não as instruções do DCO sobre o Regulamento Geral, nem muito menos novas instruções, ainda que transvestidas de decisões interpretativas concretas.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André