Novos trechos do Parecer Jurídico de um prestigiadíssimo especialista em Direitos Constitucionais e Direitos Esportivos (de identidade ainda mantida em sigilo) colocam a Federação Paulista de Futebol em situação delicada do ponto de vista ético e moral e também de Justiça Esportiva, caso insista na tentativa de burlar o regulamento da Série A1 e da Série A2 do Campeonato Paulista. A iniciativa da FPF, ainda limitada aos bastidores, mesmo com ares oficiais, seria um tiro no pé.
Quatro novos blocos de trechos do instrumento que será remetido a instâncias esportivas para preservar os direitos do São Caetano foram repassados a este jornalista pelo emissário do especialista em Direito Constitucional e Direito Esportivo.
O material só não é bombástico porque foi antecedido de outros volumes já revelados aqui. Mas o conjunto da obra, que ainda não se esgotou, demonstra com clareza, sofisticação técnica e equilíbrio analítico o quanto o presidente Reinaldo Bastos e seus assessores, notadamente do Departamento Técnico e auxiliares jurídicos, podem comprometer o ambiente esportivo paulista e nacional se o São Caetano decidir mesmo recorrer às instâncias recomendadas pela FIFA.
Apenas Justiça Esportiva
O São Caetano descartaria integralmente qualquer iniciativa junto à Justiça Comum, mas, esgotadas todas as instâncias esportivas nacionais, recorreria à FIFA. O especialista, aliás, num dos trechos já publicados, indica essa especificidade legal, conforme o Código de Disciplinar da entidade máxima do futebol mundial.
As estripulias legislativas de entidades controladoras do futebol poderiam ser enquadradas nas esferas internacionais. O período de pode-tudo já teria se encerrado. Não seria mais possível manter os clubes encabrestados em territórios domésticos.
O especialista constitucional conta com denso currículo e tem como uma das características profissionais o fato de que raramente atuou nos poderes esportivos. Ou seja: não tem nenhum grau de relação com as instituições esportivas a ponto de se sentir desconfortável ou comprometido com a demanda que dinamita as pretensões da Federação Paulista de Futebol.
Transparência total
Ainda não se tem informação sobre as razões que o teriam levado a analisar a situação da chamada “vaga da discórdia” da Série A1 do Campeonato Paulista. Há várias versões desencontradas. O emissário da fonte possivelmente responsável pela produção do Parecer Jurídico assegura que tudo será transparentemente levado ao público no momento adequado.
O mesmo emissário não fez qualquer sinalização do conceito de “momento adequado”. Talvez o disparador de uma crise na Federação Paulista de Futebol seja a programação do Conselho Técnico da Série A2 ou da Série A1 do Campeonato Paulista, eventos que definem os regulamentos da próxima temporada.
Não faltam ignorantes na praça que já colocam o terceiro colocado da Série A2 como integrante da Série A1 da próxima temporada, no caso o Água Santa de Diadema. A decisão é própria de quem não conhece a legislação.
Tanto num caso quanto no outro, ou seja, na Série A1 e na Série A2, o Regulamento Específico das Competições determina que somente antes do Conselho Técnico serão conhecidos os componentes das competições, porque há condicionantes regulamentares a instruir o processo de preenchimento de vagas definidas em cada regulamento. Também falta qualificar o sentido da expressão “antes do Conselho Técnico”. Não há no regulamento definição temporal. Por isso, mudanças poderão ser anunciadas até poucos minutos da abertura da reunião entre FPF e clubes.
Prestígio internacional
O especialista que produziu o demolidor Parecer Jurídico foi professor permanente do Curso de Doutorado em Direito na Universidade de Bari (Itália), foi professor visitante da Cardozo Scholl of Law em Nova Iorque (2006), da Universidade Fordham em Nova Iorque (2007), da Universidade de Bologna (Itália) em 2012, da Universidade de São Petersburgo (Rússia) em 2012 e da Universidade de Glasgow (Escócia) em 2019. Esses são apenas mais alguns dos destaques de um vasto currículo, parte do qual já revelamos neste espaço.
Com os novos quatro blocos de trechos repassados na sequência, chegamos ao total parcial de 16 do Parecer Jurídico. Possivelmente, segundo o emissário, duas novas rodadas de revelações serão publicadas. Ainda segundo o emissário, o documento letal à aberração da Federação Paulista de Futebol (ainda em fase de orquestração de bastidores, com escorregões legais sobre os quais já escrevemos e voltaremos a escrever nos próximos dias, porque não se esgotaram) reúne aproximadamente nove mil palavras – ou 56 mil caracteres. Seis vezes mais o total deste texto.
Lembramos que nas edições anteriores repassamos blocos do documento aparentemente emitidos em ordem numérica aleatória. No caso desta edição, parece haver maior conexão de exposição do Parecer Jurídico entre os blocos. Só será possível chegar a uma conclusão sobre a sequência lógica quando o documento for liberado à Imprensa, segundo promessa do emissário.
Primeiro bloco
Em assim sendo, cumpre agora aplicar, dentro do Regulamento da Série A1, o entendimento técnico, que qualifica o resultado esportivo, a fim de solucionar a hipótese omissiva aqui aventada, qual seja, o que ocorre um clube classificado da Série A1 desistir ou deixar de existir. Essa resposta envolve, necessariamente, a própria compreensão de como se compõe a Série A1 com seus integrantes. O elemento técnico primário a ser respeitado decorre da forma como se desenhou essa Série especial, pressuposto de todo o campeonato e dos regulamentos manejados até agora: todos os 16 (dezesseis) clubes que iniciaram a competição na Série A1 em 2019 são considerados como portadores do mais alto nível técnico dentro desse campeonato. E a competição ocorrida em 2019 entre todos esses clubes da elite do futebol paulista só reforçou suas posições iniciais de técnica superior. Trata-se de critério que está, inclusive, reafirmado por Lei. O mesmo Estatuto do Torcedor citado linhas atrás determina, em seu art. 10, na nova redação dada pela Lei 13.155, de 2015, que: “§1o. [...] considera-se critério técnico a habilitação de entidade de prática desportiva em razão de “I - colocação obtida em competição anterior”.
Segundo bloco
É só assim que se compreende a razão pela qual os integrantes da Série A1, de 2019, pelo seu nível técnico, preservam uma série de posições (como o §1o do art. 5o), para 2020, justamente por já estarem na referida Série A1. Isso demonstra que esses clubes receberam, do ponto de vista normativo, o reconhecimento de seu mérito técnico sobre todos das demais Séries pelo simples fato de já integrarem na Série A1 em 2019. Se já existem clubes integrantes da Série A1 de 2019 que, somados os dois clubes vitoriosos da Série A2, compõem número suficiente para o próximo Campeonato, sequer surge a indagação sobre qual clube da Série A2 poderia também (um terceiro) ascender. Se não se pode fazer, legitimamente, a pergunta, tenho por certo que a resposta, por muitos cogitada, indicando o terceiro classificado da Série A2, é, nesse sentido, descabida e totalmente arbitrária. Ainda que se queira revesti-la de normatividade, tenho por certo que se trata de uma tentativa de contornar o que é vedado. Como sabemos, todo o sistema esportivo de competições e, especificamente, o Estatuto do Torcedor, vedam o ingresso em qualquer Série na forma de “convite”, quer dizer, violando as condições técnicas para integrar determinada campanha. Uma falsa normatividade não alterará a essência, nesse caso, que é a de um convite, atentatório ao modelo esportivo.
Terceiro bloco
O Regulamento da Série A2 dispõe de maneira taxativa sobre a Série A1 na seguinte passagem: “Art. 9º - Terão direito de acesso à Primeira Divisão - Série A1 de 2020 os 02 (dois) Clubes classificados para a fase final da competição.”. Observe-se, desde logo, que se trata de conexão única com a Série A1. Mas não apenas isso. É preciso acrescentar, desde logo, que, rigorosamente falando, conectam-se os clubes classificados para a fase final da Série A2 com a Série A1 de 2020, e não com a Série A1 de 2019, esta sim o único objeto de preocupação aqui. Logo a seguir, em seu parágrafo único, determina-se, ainda, nesse mesmo Regulamento da Série A2, que: “§ 1º - Em caso de não participação de algum Clube classificado para o Campeonato Paulista de Futebol Profissional - Primeira Divisão - Série A1 de 2020, terá também acesso o Clube que obtiver a 3ª melhor campanha no Campeonato Paulista de Futebol Profissional - Primeira Divisão - Série A2 de 2019, dentre os que disputaram a fase semifinal.”. É um os princípios mais comezinhos da Ciência do Direito o de que parágrafos e alíneas são elementos que especificam a cabeça do artigo, quer dizer, não são normas que tratam de temas diversos. Ainda que se possa cogitar de uma técnica legislativa grosseira, ou mesmo torpe, o certo é que ao operador do Direito resta trabalhar não com o eventual intuito equivocado de quem escreveu a norma, mas sim com o que nela resultou escrito, na forma como foi definitivamente grafado e aprovado. Assim, pouco importa, para a compreensão do Direito, se houve qualquer tentativa enviesada de lançar uma norma conscientemente dúbia em seu sentido e alcance. Digo isso exatamente porque a expressão empregada “terá também acesso” poderia causar, sim, certa confusão mental, sobre ser um acesso para além dos dois acessos atribuídos aos clubes classificados para a final. Mas a regra, rigorosamente, trata da não participação de clubes classificados na Série A2, única que é objeto das regras desse Regulamento e que foi expressamente endereçada na cabeça do artigo, como visto acima. Ademais, ainda que uma palavra (“terá também”) possa ser compreendida como tendo sido empregada de maneira menos técnica ou menos assertiva, levando, em seus estertores, a uma dúvida aceitável já com grande esforço e por amor às ilações mais aleatórias, isso não significa que também se possa ignorar todo o restante do conjunto igualmente textual desse mesmo artigo e, adicionalmente, ignorar também o contexto em que está inserida a norma, o objeto desse Regulamento e seus objetivos, apenas porque uma palavra foi empregada de maneira que pode gerar, quando lida singularmente, uma dúvida interpretativa. Assim, a própria linguagem do restante dessa norma impede que se promova a leitura libertária que alguns mais incautos estão propondo. Lembremos, aqui, que há lição praticamente unânime na Doutrina em considerar a linguagem um limite interpretativo, para além do qual temos apenas arbitrariedade. E, nesse sentido, considera-se que a linguagem do texto “inclui o que se pode inferir do texto, sua estrutura, organização e o relacionamento entre suas diferentes proposições”.
Quarto bloco
A norma contida nesse § 1º emprega expressamente o vocábulo “classificado”, igualmente contido no caput, e que se refere, neste, à Série A2. Outra orientação básica aos intérpretes, que nos aproveita imensamente, foi bem enunciada por Celso Bastos da seguinte forma: “a termos idênticos, utilizados por diversas normas, deve-se atribuir o mesmo significado”. Seria preciso romper radicalmente com essa lógica e com a conexão entre o caput e o parágrafo para estabelecer que o § 1º trata da Série A1 (já uma anomalia em si) e usa vocábulo impróprio (“classificado”) quando, “em verdade”, queria se referir a integrante dessa Série. Seria inconcebível que uma palavra, ainda que nela seja aceitável mais de uma interpretação, permitisse a escolha livre de uma leitura que subverteria todo o resto da própria norma, do Regulamento em geral e, ainda, que de maneira inesperada e surpreendente atingisse o Regulamento de outra competição. Em realidade, ao dispor que “também” terá acesso o clube classificado com a terceira melhor campanha, o parágrafo primeiro apenas admite o acesso (também) do terceiro colocado, com melhor campanha na Série A2, no caso de um dos dois primeiros colocados da Série A2 desistir do acesso. O que a norma está contemplando é o critério, igualmente técnico, de acesso do terceiro colocado, na falta de algum dos primeiros colocados da Série A2.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André