A Federação Paulista de Futebol prepara para as próximas semanas a oficialização de um duplo assassinato regulamentar: vai dar asas protecionistas ao Red Bull de Bragança Paulista e benção oportunista ao Água Santa de Diadema.
A FPF conta com assessores jurídicos extravagantemente fora do padrão ético. Eles acumulam funções de advogados-assistentes do presidente da FPF, Reinaldo Bastos, e defensores oficiais do Água Santa e do Red Bull. As relações são estreitíssimas. Portanto, esperar que fossem imparciais nas decisões que envolvem as duas equipes seria muita ingenuidade.
O que a Federação Paulista de Futebol prepara para divulgar em reunião com os clubes no Conselho Técnico da Série A1 é que o Red Bull deixará de ser rebaixado à Segunda Divisão, o que equivaleria à Quarta Divisão do Estado, e o Água Santa pulará a cerca regulamentar e, com isso, disputará a Série A1. Justamente na vaga a ser deixada pelo Red Bull. Uma tabelinha perfeita.
Agressão à hierarquia
O São Caetano, 15º colocado da Série A1 e igualmente na hierarquia do futebol paulista, vai sobrar. O Água Santa, 19º colocado, vai tomar conta da vaga da discórdia. Ou seja: o São Caetano dança mesmo com todo o arcabouço jurídico legal que o protegeria se a FPF não fosse uma articulação de amigos do peito do presidente e dos interesses do entorno de vantagens mútuas.
Tudo isso conta com a conivência de parte da Imprensa esportiva que, mais que fechar os olhos à estupidez a uma interpretação equivocada, chega ao desplante de aprovar o regulamento da Série A2 de forma tão profana como quem consome catecismos de Carlos Zéfiro camuflados pela capa dura da Bíblia. São hereges ante a responsabilidade social da profissão.
As duas equipes que serão beneficiadas oficialmente durante o Conselho Técnico da Série A1 e da Série A2 da Primeira Divisão (que também conta com a Série A3) não têm direito assegurado nos respectivos regulamentos a nenhuma das duas vagas que receberão de presente. Regulamento é a Constituição de uma competição. É o instrumento máximo a ser seguido. Fora isso, é golpe.
Advogados suspeitos
Os advogados André Sica, que representa o Red Bull, e Cristiano Caús, do Água Santa, têm relações muito próximas com o presidente da FPF. São consultores especiais na Comissão de Assuntos Jurídicos. Eles influenciaram decididamente na definição da questão desde abril deste ano. Contrariaram as normas que indicam que somente o Conselho Técnico tem poderes para tanto. Apressaram-se na iniciativa porque tudo faz parte de uma estratégia de convencimento induzido.
Especialistas condenam o que chamam de promiscuidade diretiva na Federação Paulista de Futebol. Mas isso não tem muita importância para quem considera que o mundo do futebol é um mundo à parte. Os políticos também agiram assim durante temporadas seguidas até que as roubalheiras despertaram a fúria da Operação Lava Jato.
Ou seja: o futebol brasileiro nas respectivas federações é uma farra geral. Impera a lei do mais forte politicamente. Regulamentos são feitos para ganharem a forma de lixo ou para aproximação de interesses. Ninguém ousa contestar mandachuvas e mandachuvinhas da bola. Eles trafegam em espaço de neutralidade, à prova do Judiciário.
Rumo à FIFA
Há, entretanto, possibilidade de a decisão da FPF terminar nos tribunais esportivos, inclusive na FIFA. Nada, portanto, de Justiça Comum, banida das relações esportivas. Há informações que dão conta de que o Parecer Jurídico do professor André Ramos Tavares, especialista em Direitos Constitucionais e Direitos Desportivos, publicado na íntegra por este site, deverá respaldar medidas específicas nos tribunais esportivos.
A iniciativa seria deflagrada assim que a FPF consumar o delito que agride os regulamentos das duas principais competições do Estado. Mesmo em crise diretiva provocada pelo anúncio da retirada do mantenedor e empresário Saul Klein, o São Caetano irá às últimas consequências nos tribunais esportivos. O próprio Saul Klein tomou essa decisão porque, segundo afirma, não deixaria o São Caetano ser vítima de arbitrariedades.
Não está fora da bitola da legalidade a intervenção da FIFA. Inclusive com medidas punitivas à Federação Paulista de Futebol. O recurso que estaria sendo preparado por um especialista contratado pelo empresário denunciará a FPF pela destruição da legitimidade de um regulamento aprovado no Conselho Técnico realizado no ano passado. Além disso, mostrará uma das frondosas raízes da medida, no caso os auxiliares jurídicos mais que suspeitos do presidente Reinaldo Bastos. Há provas contundentes dessa relação.
Sincronismo delitivo
Tanto a queda do Red Bull para a única série da Segunda Divisão, chamada informalmente de B-1, como o acesso do Água Santa à Série A1 são observados como anomalias que vão muito além do razoável. A promiscuidade dos dois advogados dos clubes que também atuam na Federação Paulista de Futebol causaria espanto nas esferas internacionais que zelam pelo esporte. Eles defendem causas próprias em nome da FPF.
Seria algo como um agente federal da Lava Jato atuar como executivo de uma das empreiteiras flagradas em delito. Ou assessorando um dos políticos colhido em falcatrua. A interpretação criminosa do regulamento da Série A2 é uma indecência esportiva.
Fiz a primeira denúncia em março, antes mesmo de o campeonato terminar e já por conta da ação maliciosa da FPF de espalhar uma versão fraudulenta do Artigo Nono, Parágrafo primeiro. Sempre com a colaboração de parte da imprensa chapa branca. Imprensa chapa branca diz amém irrestrito a tudo que a FPF decide. É uma espécie de assessoria de imprensa.
Resolução conflitiva
No caso do Red Bull, a impossibilidade regulamentar de disputar a Série A1, porque faz parte do mesmo grupo esportivo-empresarial do Bragantino, que já tem lugar garantido na competição, obriga-o a disputar a Segunda Divisão.
Uma confusa “Resolução da Presidência”, assinada há três semanas pelo presidente Reinaldo Bastos, não tem força normativa suficiente para desconsiderar o regulamento da Série A1 desta temporada. Pior que isso: o texto foi tão mal formulado juridicamente que dá margem a interpretações variadas. Tanto de reserva de vaga na Série A2 quanto de rebaixamento à Série B1. Definitivamente, os assessores jurídicos de Reinaldo Bastos gostam de emoções. Talvez deliberadamente.
Em caso de não-confirmação de inscrição ao campeonato da Série A1 da próxima temporada (é isso que se dará), o Red Bull seria automaticamente rebaixado à Segunda Divisão, Série B-1.
É verdade que a situação tem contornos polêmicos. A impossibilidade de inscrever-se à disputa da Série A1 impediria o Red Bull de seguir na Primeira Divisão, ou especificamente de ocupar uma vaga na Série A2 ou na Série A3.
Entretanto, e é por isso também que André Sica é o braço jurídico do Red Bull na estrutura de poder da FPF, trabalha-se com operação casada em relação ao Água Santa: o acesso de um e o descenso de outro significariam conexão de suposta legitimidade que, entretanto, não resiste a qualquer análise.
Apenas duas vagas
Série A1 e Série A2 são competições autônomas, embora façam parte do guarda-chuva da chamada Primeira Divisão. A única relação estreita que o regulamento da Série A1 mantém com o regulamento da Série A2 é a existência de duas vagas de acesso. Não mais que duas vagas, asseguram todos os termos do regulamento.
Dentro de campo, São Bento de Sorocaba e São Caetano chegaram nas duas últimas colocações na Série A1. Entretanto, como bem explica o especialista André Ramos Tavares, a competição determina a abertura de duas vagas para os dois primeiros colocados da Série A2. Como o Red Bull estará impedido de disputar a Série A1, o São Caetano compulsoriamente se manteria na competição. O São
Bento não teria escapatória.
É verdade que o regulamento da Série A1 é omisso no que poderia ser chamado de previsibilidade de desdobramentos da situação que se apresenta ao Red Bull. Entretanto, a explicitude do conceito de abertura de duas vagas às duas primeiras colocadas da Série A2 e a premissa legal de valoração do espaço ocupado pelos 16 integrantes da Série A1 destroem qualquer argumento que contrarie os direitos do São Caetano. O Parecer Jurídico do especialista André Ramos Tavares é demolidor. E também irrebatível.
Muito mais complicada
A situação do Água Santa é ainda muito mais inconsistente quando comparada à do Red Bull. A equipe de Diadema classificou-se em terceiro lugar na Série A2, atrás do Santo André e do Internacional de Limeira, garantidos na Série A1 da próxima temporada. O Água Santa só teria direito de disputar a Série A1 caso um dos dois primeiros colocados da Série A2 desista do Acesso – isso está mais que assegurado no Parágrafo primeiro do Artigo Nono.
O Artigo Nono e o Parágrafo Primeiro são tão objetivos e claros sobre isso que a confusão gerada por conta de interpretações caolhas não passa de maquiavelismo. Tudo teria partido da própria Federação Paulista de Futebol. A ideia era formar uma massa de informações que visavam consolidar uma doutrina que proporcionaria leituras subjetivas com finalidades pouco republicanas.
CapitalSocial conta com um documento bombástico sobre o que poderia ser chamado de conchavo de dirigentes da Federação Paulista de Futebol para proteger o Red Bull de Bragança Paulista e o Água Santa de Diadema. Tudo ocorreu desde abril. Portanto, muito distante da realização do decisivo Conselho Técnico, prevista para outubro.
E se fosse um time grande?
A Imprensa que se ocupa do futebol Paulista transformou o regulamento da Série A2 em peça de alucinação interpretativa. Vazamentos propositais de gente influente na Federação Paulista de Futebol, inclusive do próprio presidente em reuniões privadas com dirigentes de clubes associados, visaram criar ambiente favorável à leitura enviesada do Parágrafo Primeiro do Artigo Nono do Regulamento da Série A2.
É claro que tudo isso seria diferente caso a vaga da discórdia fosse de conhecimento da elite paulistana dos jornalistas esportivos. Basta imaginar o que ocorreria caso a situação envolvesse uma grande equipe do futebol paulista. Basta imaginar a situação nesta altura do campeonato caso se desse como líquido e certo o acesso do Água Santa para ocupar a vaga que pertenceria ao Corinthians, por exemplo.
Liberdade para abusar
No fundo, é essa a questão: a direção da Federação Paulista de Futebol e os influenciadores mais próximos, inclusive com poder jurídico extraoficial, se sentem muito à vontade para confirmar uma ilegalidade brutal. Trafegam pela zona do conforto de que o assunto não pertence à massa de torcedores. Por conta disso não contavam com protesto e reação. O temor a represálias inibiria qualquer medida de confronto.
A FPF só não contava com o atrevimento do São Caetano. Um atrevimento muito além do estranho comportamento do presidente do clube, Nairo Ferreira. O dirigente estaria muito colado a interesses cruzados da FPF e dos clubes beneficiários da medida e, por isso, teria aceitado passivamente o rebaixamento à Série A2.
Um rebaixamento que, como todos os rebaixamentos, não se dá definitivamente dentro de campo. Depende, como já ocorreu em várias situações (a Portuguesa está aí para confirmar; e o Fluminense também, na Série A do Campeonato Brasileiro) porque há regulamento a ser cumprido e o regulamento determina medidas nesse sentido. Como, por exemplo, a desistência de um dos clubes que não ficou entre os dois últimos colocados. Caso, claro o Red Bull. E, também, julgamentos nos tribunais esportivos.
O empresário Saul Klein decidiu peitar a malemolência ética do presidente Nairo Ferreira e também do entourage da Federação Paulista de Futebol. A ação é inédita. Talvez a grande mídia se dê conta disso na medida em que a aberração regulamentar ganhar o foro adequado: os tribunais esportivos. Inclusive da FIFA.
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