Administração Pública

Demissões e muitas dúvidas
marcam a venda do Semasa

DANIEL LIMA - 03/08/2020

Sim, o que temos é uma coleção de dúvidas jamais levantadas, mas que precisam ser esclarecidas. Isso não é uma acusação e muito menos uma especulação; apenas uma curiosidade que pode, agora sim, se transformar em intervenção de órgãos competentes. Quem tem de responder a tudo é o prefeito de Santo André, Paulinho Serra, e o superintendente da autarquia, o engenheiro Ricardo da Silva Kondratovich.  

O tucano que comanda Santo André teve a coragem de acabar com a farra do Semasa, um trambolho metido em sistemática corrupção, inclusive no mercado imobiliário. Mas a história da transferência à Sabesp não está bem contada. E precisa ser bem contada. Sem conto da Carochinha.  

Para começar, há centenas de trabalhadores do Semasa pendurados na folha de pagamentos da autarquia municipal, mas que prestam serviços de água e esgoto à Sabesp, conforme contrato firmado entre as partes. Tudo isso se dá desde que tanto uma coisa quanto outra, ou seja, água e esgoto, foram transferidos para aquela empresa sob controle estatal e que conta inclusive com ações na Bolsa de Valores de Nova Iorque.  

Falta de transparência  

Estou muito à vontade para abordar a questão. Não poderão me confundir com uma ponta de interesse recalcitrante em defesa do estatismo do setor. Todos sabem que sou liberal-social, portanto, muito mais que favorável àquela empreitada do prefeito de Santo André. Pena que tenha faltado transparência nas negociações e também houvesse uma pressa louca de chegar aos finalmentes, sabendo-se como se sabia que o Congresso Nacional estava em vias (como se deu) de aprovar nova legislação. 

Uma nova legislação que acabou com a reserva de o Estado mandar e desmandar (muito mal por sinal) nesses dois delicados pontos de infraestrutura com ampla repercussão na saúde pública.  

O modelo de transferência imposto ao Semasa não é o desejado em nenhum regime que se pretenda democrático. A obscuridade que se implantou como fórmula protetiva a eventuais cambalachos (isso não é uma acusação, agora é mesmo especulação ditada pelo modus operandi num País que não prescinde jamais de uma Operação Lava Jato) recomenda que o prefeito Paulinho Serra, ao superintendente do Semasa e a direção executiva da Sabesp venham a público explicar todas as razões que levaram à condução de um contrato supostamente desiquilibrado entre as partes. 

Custos dos trabalhadores  

Ou, sinceramente, alguém é capaz de defender (até que contra-argumentos supostamente sólidos sejam apresentados) que uma empresa ligada à Prefeitura de Santo André (é como opera o Semasa, que continua a existir, embora sem água e esgoto) ceda durante nove meses à empresa compradora do domínio sobre a mesma água e esgoto (Sabesp), centenas de trabalhadores, arcando, o Semasa, pelos pagamentos de salários e direitos trabalhistas? Teria sido esse o desenlace. Provas são indispensáveis à negação. 

Devo ser mesmo um mentecapto ao sugerir essa prestação de contas ou sou uma extensão mesmo que arbitrária, mas nem por isso à revelia dos interesses dos moradores e contribuintes de Santo André. 

Perguntas pertinentes   

Algumas questões desdobram-se dessa cobrança pública e não creio que elencar alguns pontos intrigantes seja um desserviço à sociedade, como alguns empedernidos defensores de cores administrativas e partidárias esgrimem.  

1. Qual é o custo mensal dessa cessão de servidores sem ônus para a empresa compradora dos direitos até então exercidos pela autarquia de Santo André?  

2. Qual é o passivo trabalhista no sentido mais amplo da expressão desse contingente enorme de trabalhadores e quem vai arcar com os resgates?  

3. Qual será o destino reservado aos trabalhadores ao fim do contrato de cessão da mão de obra, em 31 de dezembro próximo?  

4. Como se daria a realocação desses profissionais em caso de a Sabesp abrir mão de seus trabalhos, tendo como base de inquietação o fato de que eles atuam diretamente na especialidade da compradora? 

5. Qual foi o critério estabelecido entre as partes para definir o período de empréstimo de trabalhadores do Semasa à Sabesp tendo como trajeto passagem pelas eleições municipais para, em seguida, na virada do ano, encerrar-se?  

6. Consta do contrato firmado entre as partes, um contrato ao qual poucos têm acesso, todas as informações que respaldam essa aparente inconformidade que tem tudo para se caracterizar como gentileza além da conta com o dinheiro público?  

7. Teria a Sabesp repetido na compra do Semasa alguma operação similar em outros municípios sobre os quais também lançou mão da política expansionista ou se tratou apenas e exclusivamente de iniciativa específica, pontual, estratégica?  

Pegadinhas e definições  

Devo antecipar aos navegantes de águas e esgotos (mais de esgotos de que de águas) que algumas das questões apresentadas acima se configuram sim e sem meias palavras uma série de pegadinhas. Poderia jogar estrategicamente e omitir esse ponto crucial na pretendida interlocução com o chefe do Executivo de Sato André. Não o faço por uma razão nuclear: ele não sabe o que é armadilha no bom sentido do termo e o que é informação já robusta.  

Portanto, na dúvida entre o que tenho como jornalista e o que ele pode dispor em nome da transparência como prefeito de Santo André, o que se espera é que de alguma forma Paulinho Serra responda. Ou diretamente ou por terceiros. Alguns terceiros são guerrilheiros digitais que oficialmente ou não estão nas redes sociais a distribuir pancadarias em quem ousa opor qualquer tipo de dúvida sobre a gestão de Santo André.  

Pontos a esclarecer 

Paulinho Serra é um administrador público que não se limita a contar com o apoio muitas vezes mais que descarado de parte da imprensa de papel e digital, como tantos outros prefeitos da região. Paulinho Serra também goza de prestígio entre militantes digitais. Ou seja: segue o figurino dos gestores públicos do País, cada vez mais incomodados com o outro lado da moeda da democracia informativa.  

O caso Semasa/Sabesp recomenda atuação incisiva da Prefeitura e da empresa de capital misto e controle estatal. Há uma porção de pontos obscuros firmados a toque de caixa e consolidados em contrato em julho do ano passado. Desconfia-se seriamente que mais que aquisição dos ativos do Semasa relacionados a água e esgoto em troca de uma dívida que virou precatório (e também de outros valores financeiros) exista uma conjugação de ações delituosas em prejuízo dos cofres públicos de Santo André. 

Quando digo que há essa possibilidade de delito e que aquele contrato representaria prejuízos aos cofres públicos de Santo André quero dizer com todas as letras e cifras que não se trata de uma ninharia qualquer. E não se limitaria exclusivamente à demissão de trabalhadores. O silêncio nas próximas 24 horas dos envolvidos direta e indiretamente naquela negociação vai determinar o nível de compadrismo entre eles e, mais ainda, até que ponto é possível chegar em forma de irresponsabilidade quando muito dinheiro está em jogo.  

Estou dando uma colher de chá a todos para que se posicionem. As dúvidas apresentadas são pertinentes e inquietantes. As certezas advirão da retirada de interrogações. Tomara que não seja necessário solicitar a ajuda de ex-universitários, hoje diplomados e atuantes em áreas nobres da representatividade social.  



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