A crônica esportiva, porque dispersa, porque clubística, demora para detectar problemas e virtudes, aferrando-se ao passado como algo imutável. Geralmente se espera algo como uma certa unanimidade de reposicionamento para emergir da omissão coletiva.
A quebra do dinamismo de uma equipe, como a do São Paulo, ou é precipitadamente aprofundada e vira decadência por causa de uma ou outra derrota, ou é grotescamente negada. O que se vê de fato na equipe de Muricy Ramalho são sinais de alerta de que o principal insumo do grupo, o equilíbrio tático, começa a fazer água.
Vejam o caso do Corinthians, de Paulo César Carpeggiani. É inquestionável que, finalmente, os alvinegros têm um time de futebol. Pode não ser o melhor da temporada, possivelmente não o será, mas é um time de futebol. Bem diferente dos tempos recentes de Émerson Leão, quando o bumba-meu-boi de chutões para todos os lados substituiu a tosca organização que pelo menos impediu o rebaixamento da equipe à Série B do Campeonato Brasileiro do ano passado.
A atuação de Paulo César Carpeggiani aniquila uma das muitas frases feitas e aparentemente invioláveis do futebol — a de que técnico não ganha jogo.
Negar a influência de um treinador numa equipe esportiva, qualquer que seja a modalidade, é algo como acreditar que um prefeito é igual a outro, que um gestor corporativo não oferece nada de especial diante de tantos outros, que diretores de cinema são todos japoneses, ou seja, têm a mesma cara.
Treinador ganha e perde jogos porque é da capacidade de gerenciamento emocional, tático, técnico, psicológico e espiritual que emanam ações e reações coletivas.
Técnico nem ganha nem perde jogo sozinho porque futebol é esporte coletivo, mas que influencia para o bem ou para o mal, não tenham dúvidas. Tenho tantos anos de janela em campos de futebol, cronista esportivo que fui e que ainda acho que sou nas horas vagas de incorrigível observador da bola, que não cometeria a heresia de me juntar aos simplistas.
Também considero demasiado prematuro apontar agora os favoritos às primeiras colocações do Campeonato Brasileiro, mas não há dúvida de que o Corinthians, salvo abusiva trapalhada diretiva sempre possível, pode ser uma das surpresas da competição. Ou alguém se esqueceu que antes da primeira rodada encomendou-se à equipe de Parque São Jorge o epitáfio do rebaixamento?
A crônica esportiva em larga margem ainda não se deu conta de que os torcedores corintianos ganharam de fato um time no Campeonato Brasileiro, depois do arremedo que se arrastou no Campeonato Paulista. Estão, os cronistas, esperando pela manada da obviedade gestada nos bastidores.
São poucos os profissionais do jornalismo esportivo capazes de explicar as principais mudanças táticas do Corinthians. Só não o faço aqui porque o espaço é exíguo, mas que a equipe já tem cara, corpo e alma, podem acreditar. Sem contar a revelação chamada William, o maior talento egresso do clube, depois de Rivelino.
E que o São Paulo vem perdendo a viscosidade tática, podem apostar também. Mas, mesmo assim, é sério candidato ao título brasileiro.
Uma casa nem cai nem se constrói da noite para o dia.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André