Esportes

Acesso: o que vai pesar mais
na definição dos vencedores?

DANIEL LIMA - 21/09/2020

Acho que a interrogação na manchetíssima é um desafio a quem acompanha a Série A-2 do Campeonato Paulista, que define a partir de amanhã as duas equipes que integrarão a Série A-1 na próxima temporada. Entre os quatro semifinalistas há duas equipes da região (São Bernardo e São Caetano) e duas do Interior (São Bento de Sorocaba e XV de Piracicaba). A questão é a seguinte: o que pesará mais na definição dos dois finalistas – individualidade, coletivo ou treinador? 

Parto do pressuposto metodológico de que são esses os três vetores essenciais a uma equipe de futebol. Outros atributos (equilíbrio emocional, preparação física, concentração tática e técnica, banco de dados e tudo o mais) decorrerem da espinha dorsal desse triângulo intrinsecamente interdependente.  

Considerando, portanto, um equilíbrio de potencialidade entre individualidade, coletivo e comando técnico, qual desses fatores terá um pouco mais de importância e, portanto, transformaria o triângulo equilátero em eventual triângulo isóscele ou triângulo escaleno?  

Definição de triângulos 

Em qualquer nível de competição, não haveria como escapar dessa encruzilhada definidora de vencedores e vencidos. Do mais alto grau de disputa a uma Segunda Divisão Paulista, caso da Série A-2, os pesos relativos desses ingredientes se manifestarão. Resta saber as variáveis que os caracterizarão. Para mais e para menos. Isso mesmo, porque o triângulo equilátero dificilmente se manterá. Haverá oscilações que mudariam os desenhos.  

Considerando-se essa pole-position da competição, não arriscaria apontar nenhuma das quatro equipes como já garantida na Série A-1 do Campeonato Paulista de Futebol. Afinal, não consigo ter segurança de que um dos três pontos cardeais que nortearão os jogos é mais saliente que os demais. Essa avaliação preliminar vale para qualquer equipe entre as quatro semifinalistas. 

Numa competição de alto nível como, por exemplo, a final do Mundial dos Clubes do ano passado, pesaram para valer na vitória do Liverpool as bobagens do grande técnico do Flamengo, Jorge Jesus, ao substituir dois jogadores de meia-armação e infiltração por alternativas que eliminaram a capacidade de a equipe organizar-se ofensivamente com mais contundência.  

O peso do técnico foi decisivo no resultado final. Jorge Jesus devolveu com juros e correção a entregada do ouro do técnico do River Plate, na final da Libertadores, quando as três substituições em seguida deram ao Flamengo a liberdade de um meio de campo até então encalacrado por forte marcação e, em consequência, o contragolpe demolidor com aqueles dois diabos à frente, Gabibol e Bruno Henrique.  

Réplica tropicalizada  

É possível que uma réplica tropical e bem mais modesta se manifeste na semifinal da Série A-2. Ou seja: treinadores podem meter os pés pelas mãos e entregarem o abacaxi tanto quanto, quem sabe, descubram viés insondável no banco adversário e pouco explícito no gramado.  

Também é possível que uma ou outra individualidade marque poder demolidor nos jogos, quer com jogadas que fujam do trivial, quer em especificidades como cobrança de falta, cabeceio, passe milimétrico, essas coisas do futebol.  

E o coletivismo, então? Quem garante que um time mais arrumado, como parece ser o XV de Piracicaba, não encontre o acesso à Série A-1 como resultado natural? E que, portanto, ultrapasse os limites da individualidade e da contundência do treinador à beira do gramado?  

Não há entre os quatro semifinalistas da Série A-2 uma banda suficientemente larga de diferenças sob os três aspectos relacionados a indicar tanto favoritismo quanto desclassificação antes que a bola role.  

Equilíbrio prevalece  

A falta de uma equipe com potencial comprovadamente superior às demais significa que aqueles três vetores estão em harmonia, mesmo com diferenciações quando vistas de perto.  

O XV é mais coletivo e mobilizador, o São Bernardo e o São Bento parecem mais contundentes e o São Caetano potencialmente mais individual. São impressões, apenas impressões, retiradas dos jogos pós-pandemia. Um período breve, de recomposições de elenco e de arranjos na preparação física.  

A impressão de que o XV de Piracicaba é o conjunto mais bem-acabado entre os quatro semifinalistas poderia ter ruído não fossem os erros de arbitragem no primeiro jogo, em casa, contra a Portuguesa. Depois de sofrer dois gols e estar praticamente a nocaute, o XV ganhou fôlego emocional com a interrupção do jogo por conta de um drone invasor e, na sequência, foi beneficiado pela arbitragem que viu duas penalidades máximas onde uma foi arranjada e a outra mais que duvidosa.  

O jogo ganhou nova configuração, que se repetiu no Canindé, quando o XV de Piracicaba venceu por um a zero uma Portuguesa excessivamente planilhada. O que é uma equipe excessivamente planilhada? É a mania das equipes brasileiras, escravas de mineradores de dados. Esses profissionais imaginam que a tecnologia pode substituir o convencional, que é tradicional e efetivo. O que pode ajudar à melhoria do futebol como aperfeiçoamento técnico e tático virou obsessão técnico- científica. 

Semelhantes na objetividade 

O São Bernardo e o São Bento são semelhantes, mas não iguais. Será possível que na tarde de amanhã (15h) com transmissão do SporTV essa avaliação fique mais nítida ou se desfaça. São equipes de baixo repertório coletivo quando se traduz essa questão como posse de bola, controle tático explícito, mobilização entre os setores. São Bernardo e São Bento são equipes pragmáticas. O São Bento é mais bem apurado nos contragolpes, rapidíssimos e verticalizados. O São Bernardo é letal nas bolas paradas. Tem um centroavante de quase dois metros que confirma a vocação do técnico Marcelo Veiga pelo jogo aéreo. E também é uma equipe que marca forte. Joga feio, mas geralmente resolve. Marcelo Veiga é a antítese do espetáculo.  

Para completar, o São Caetano do técnico Alexandre Gallo conta com jogadas fatais de bola parada (tanto escanteios como em infrações próximas à área) e uma organização tática que, mesmo abaixo do XV de Piracicaba, não se desgarra do equilíbrio do triângulo essencial. Ou seja: não há descompasso alarmante entre o ponto principal em forma de individualidades, do coletivo e do preparo do técnico. Poderá expor tudo isso na quarta-feira às 17h em Piracicaba. Também com SporTV.  

Técnico ganha e perde  

Se tivesse que apostar num único fator definidor dos finalistas, juro que não saberia responder se a individualidade, o coletivo ou o treinador seria colocado em posição avançada.  

Será que -- como na final da Libertadores e do Mundial de Clubes -- prevalecerá o banco de reservas, para o bem ou para o mal?  Ou seja: o vetor “técnico” definiria quem subiria na temporada?  

Diferentemente de muita gente que não entende bulhufas de futebol e acredita que técnico não ganha jogo, não só me entrego à doutrina em contrário como também ao reverso, ou seja, de que técnico de futebol também perde jogo. E quando faço essa referência não estico a análise aos vestiários e à preparação durante a semana, que se refletem em campo. Estou me referindo exclusivamente aos 90 minutos. Ao que se faz de acerto e de desacerto no gramado. 

Virtual e real  

Quem mexer melhor durante os 90 minutos de cada jogo da semifinal da Série A-2 pode sim agir como agente de modificação do resultado final. Individualidade e coletivismo exercem valores funcionais na medida em que, também, o profissional que está no banco de reservas é capaz ou incapaz de detectar perigos e oportunidades.  

Mexer nas peças do tabuleiro no banco de reservas é especialidade de poucos. A leitura de um jogo de futebol na prática, no fervor do jogo jogado, é diferente da leitura antes e depois do jogo. Há um fosso profundo entre virtual e real.  

Quem constrói diferentes cenários a enfrentar em cada jogo, de acordo com conhecimentos acumulados da equipe que dirige e o máximo de informações sobre o time adversário, tem uma vantagem imensa de determinar com mais viabilidade o rumo do resultado dentro de campo. Sempre, claro, relativizando-se esse poder num esporte em que também o imponderável faz moradia.



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