Escolha a casa metafórica que você quiser. Goste ou não, você faz parte da casa escolhida. Você pode até escolher todas as casas como sinônimo da mesma coisa, porque a mesma coisa significa, simplificando, uma bagunça organizada tanto quanto uma bagunça desorganizada.
Entendeu? Se não entendeu, vai entender. O ambiente eleitoral em favor do voto regional no Grande ABC é tudo isso aí e mais uma ou mais casas maliciosas e possivelmente menos publicáveis que me vieram à cabeça hoje de manhã.
Brinco com os amigos mais próximos ao dizer que posso dizer e escrever as maiores bobagens do mundo que tenho a licenciosidade poética ou criminal de um tiro na cara e suas consequências.
Portanto, não me levem a mal com as figuras de linguagem que utilizei na manchetíssima de hoje. Todas representam a mesma situação, que é paradoxal.
EXPLICANDO A BABUNÇA
E o paradoxo está justamente nas expressões “bagunça organizada” e “bagunça desorganizada”. Vou explicar os dois casos e os leitores vão entender.
Bagunça organizada é quando não se faz nada de forma prospectiva e estruturada numa região tão carente de projetos e iniciativas. O intuito principal de assegurar um lugar na Assembleia Legislativa ou na Câmara Federal, independentemente de qualquer coisa. Joga-se um jogo de cartas marcadas. Jogo legítimo, diria, mas que é um jogo de cartas marcadas e como todo jogo de cartas marcadas é unilateral e incompleto. Mas é um jogo organizado. Goste-se ou não.
Bagunça desorganizada é o outro lado da bagunça organizada, integrada por outros agentes políticos que pretendem a mesma coisa dos concorrentes protegidos pela bagunça organizada. São candidatos que vão apenas concorrer mesmo, sabem disso, e a maioria mal sabe o que faria em termos de pauta regional caso chegasse ao intento numa tremenda zebra eleitoral.
FÓRUM REVOLUCIONÁRIO
Não vou destrinchar nenhum dos 10 pontos que listei como vetores que explicam o fato de o Grande ABC, sete temporadas eleitorais após o sucesso do Fórum da Cidadania, em 1994, entrar em nova disputa de votos proporcionais à Assembleia Legislativa e à Câmara Federal na mesma situação de cachorro que cai de mudança.
Se o cachorro que cai de mudança caísse em frente à minha casa, teria uma retaguarda, embora conheça muito mais gente habilitada para tanto. Sou apenas um aprendiz. O problema é que o ambiente eleitoral no Grande ABC em pleno agosto de 2022 é de cachorro que cai de mudança próximo a um matadouro.
A relação que vou publicar em seguida, que trata dos pontos centrais da bagunça organizada e da bagunça desorganizada do voto eleitoral nesta temporada, possivelmente será destrinchada em outra ocasião, ou já o foi, aqui e ali, em textos passados, e de passagem.
São aspectos que explicam o fato de que estamos num mato sem cachorro de perspectivas de mudanças significativas no ambiente regional e mesmo municipal após as eleições de outubro que está chegando. Sejam quantos forem os eleitos. Que, sinceramente, espero que sejam muitos. Melhor tê-los do que não os ter.
O individualismo e os interesses de grupos sobressaem porque há estímulos e omissões para tanto.
BENDITO 1994
Em 1994, a primeira vez em que o voto regional foi tratado como um bem em comum, algo que partiu do princípio de que uma agenda regional deveria ser seguida e valorizada, está num passado tão distante que poucos hoje se recordam.
Até porque depois de 28 anos muitos se foram desta vida e os que vieram não tiveram a pachorra de buscar nos compêndios razão para avançar rumo a uma cidadela de regionalidade mais robusta. Diferentemente disso, aliás.
Naquele 1994 surgiu o Fórum da Cidadania, instituição suprapartidária que reunia cabeças pensantes e lideranças ávidas por alguma coisa que retirasse o Grande ABC do provincianismo político.
13 DEPUTADOS
Vou resumir a história, porque o Fórum da Cidadania tem muitas histórias para contar. Só nesta revista digital há nada menos que 420 textos sobre a instituição.
O Fórum da Cidadania foi tão eficiente no projeto Vote no Grande ABC que chegamos ao recorde histórico de 13 eleitos, oito para a Assembleia Legislativa e cinco para a Câmara Federal.
O que eles, os eleitos, fizeram nas respectivas casas legislativas é outra coisa. Ficaram em dívida porque faltou ao Fórum da Cidadania acompanhamento mais criterioso da pauta regional.
O Fórum da Cidadania era um movimento de poucos recursos financeiros. Regionalidade não tem retaguarda num território que insiste em permanecer dividido em sete pedaços.
Eram outros tempos, tempos sem as facilidades destes tempos, principalmente das redes sociais.
MAIS FACILIDADES
Hoje a aproximação entre as partes de um todo chamado Grande ABC é muito mais factível, com as facilidades tecnológicas de que todos dispõem, mas a roda pega por razões que listo abaixo.
Como escrevi outro dia, não se tem base de dados confiável para assegurar qual de fato é a quantidade de votos possíveis aos candidatos do Grande ABC nas próximas eleições.
Deduz-se que não passariam de 30% do total de 2,1 milhões. É muito pouco, mas é parecido com o que as cidades do Vale do Paraíba obtiveram nas últimas eleições proporcionais.
Lá como cá eles choram o leite derramado de votos que vazam a outros candidatos, candidatos de fora da região, e dos votos que migram para nulos, brancos e abstenções.
VALE SEM FÓRUM
A diferença que se está estabelecendo entre o Vale do Paraíba e o Grande ABC é que 28 anos depois, mesmo sem um Fórum da Cidadania formalizado, eles fazem campanha pelo voto regional, tendo o jornal OVALE como centro das operações.
Em 1994 o Diário do Grande ABC, então comandado pelo jornalista Alexandre Polesi, tomou a iniciativa. Os tempos, agora, são outros.
O Diário do Grande ABC (e tantos outros jornais do mundo inteiro) deixou de ser o que era (espécie de Rede Globo do Grande ABC) e não tem o peso que imagina ter à sensibilização do eleitorado. Mais que isso: não tem o menor interesse em reproduzir a estratégia de Alexandre Polesi.
PASSARINHOS À MÃO
O raciocínio que parece dominar o Diário do Grande ABC nos leva a concluir que é melhor ter alguns passarinhos na mão do que não ter nenhum, ou ter alguns poucos que comunguem com os mesmos ideais. Um direito legítimo que peca apenas porque não está atrelado a uma agenda de regionalidade para valer.
No fundo, é um tiro no próprio pé porque, como se sabe, ser porta-voz relativiza o conceito de prosperidade que uma ação de ombudsman abunda.
Para completar essa espécie de preliminar do que temos como Casa da Mãe Joana, Casa de Irene ou Casa da Sogra (quem sabe também uma Casa da Luz Vermelha?), eis os aspectos viscerais que entendo como explicação à carência de uma ação regional deliberadamente voltada a adensar de representantes locais os dois parlamentos em disputa:
1. Supremacia dos paços municipais na definição e apoio aos principais concorrentes, ação que pode ser traduzida como um nicho de eficiência quando se observa, sem mistificação, que são interesses legítimos, mesmo que não necessariamente ancorados em prioridades sociais e econômicas.
2. Sociedade desorganizada e insensível à importância do voto regional.
3. Instituições em geral extremamente frágeis nos dias de rotina e inúteis em temporadas específicas de votos.
4. Lideranças partidárias sem vínculos doutrinários com instituições supostamente organizadas.
5. Incompreensível insensibilidade aos invasores bárbaros, ou seja, aos candidatos de outras paragens que agora usam e abusam de ferramentas tecnológicas para obterem votações expressivas. As maquininhas diabólicas portáteis são desafiadoras.
6. Seletividade de cobertura política da mídia regional, sempre em torno dos interesses dos mandachuvas da política.
7. Desprezo absoluto à construção de uma pauta com as prioridades sociais e econômicas da região.
8. Apatia e desunião de representações da classe dos empreendedores.
9. Contaminação do ambiente macropolítico por extremismos ideológicos.
10. Inexistente governança regional, que consistiria em contar numa mesma instituição com representes do Mercado, do Estado e da Sociedade.
LEMBRANDO 1997
Para completar a jornada, não custa lembrar a Reportagem de Capa da revista LivreMercado/CapitalSocial de dezembro de 1997 (portanto há 25 anos) que tratou especialmente do sucesso do Fórum da Cidadania. Vale a pena acompanhar o que se segue. O texto completo está no estoque desta publicação. Repassamos em seguida apenas os primeiros trechos. Que são muitos.
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