Tenho uma boa e uma má notícia para torcida do Santo André e do Grande ABC na Série A do Campeonato Brasileiro.
A boa notícia é que o técnico Sérgio Soares, prestes a completar um mês de trabalho e, provando mais uma vez que futebol é coletivismo, já está esculpindo a cara tática e técnica do Santo André, algo parecido com o que concebeu no ano passado e que levou o time à mesma Série A, como vice-campeão, atrás apenas do recordista Corinthians.
A má notícia é que provavelmente, muito provavelmente, a melhora não será na intensidade, na profundidade e no tempo impostos à equipe na competição, em contraste com a evolução e a auto-estima do Botafogo do Rio, adversário com o qual, salvo grande surpresa, disputará a última vaga para fugir do rebaixamento. Fluminense, Náutico e Sport já têm a alma encomendada.
O primeiro dos três últimos minitorneios de cinco jogos cada em que subdividi a Série A, como o fazem os principais treinadores do País, apontou saldo negativo do Santo André em relação à pontuação mínima necessária, enquanto deu mais embalo ao Botafogo do Rio.
O Santo André que precisava fazer sete em cada 15 pontos nos cinco jogos de cada um dos três minitorneios agora precisará somar oito em cada um dos dois minitorneios que restam para escapar do descenso.
Para escapar do descenso, como se sabe, são necessários garantidamente 45 pontos ganhos em 114 da competição, ou 40% de índice de aproveitamento. Esse é o corte histórico.
Todas as equipes que atingiram esse patamar de pontos nas edições anteriores deixaram a ameaça de queda para trás. Hoje o Santo André tem 35% de aproveitamento contra 37% do Botafogo. O Coritiba, com 40%, está bem mais confortável e fora de qualquer lista de rebaixáveis.
Já o Botafogo do Rio precisará somar sete pontos em cada 15 nos dois minitorneios que restam para fugir do descenso. A vantagem de dois pontos sobre o Santo André na classificação geral, depois de vencer o Atlético Mineiro nesta quinta-feira e do empate do Santo André em Barueri, dá certa folga aos cariocas. Qualquer ponto nestas alturas do campeonato é água no deserto.
O favoritismo do Botafogo à escapada do rebaixamento tem também forte componente estrutural. A equipe parece ter deslanchado na competição, depois de muito tempo encruada. A sequência de empates e derrotas parece que ficou no passado, após as vitórias contra o Goiás fora de casa e contra o Atlético Mineiro no Rio.
Sob o comando de Estevam Soares, que trocou o Barueri em situação confortável por uma empreitada de risco, o time carioca parece ter encontrado a dose certa de técnica e competitividade. É muito superior ao Santo André dentro de campo. Fora de campo, então, não dá nem para comparar.
Basta ver como ficará o Engenhão nesta segunda-feira quando a equipe enfrentará o Avaí e confrontar com os gatos pingados que vão ver o Santo André neste sábado no Estádio Bruno Daniel contra o Fluminense.
Aliás, por mais estranho que possa parecer, o confronto com o Fluminense é problemático demais para o Santo André. As dificuldades vão muito além do aspecto psicológico de duas equipes ameaçadíssimas de rebaixamento. O Santo André precisa torcer para o Fluminense não jogar mesmo a toalha antes da hora e que saia em busca do gol. Se ficar atrás, esperando por descuidos do Santo André, o Fluminense retirará do time de Sérgio Soares o que tem de melhor: a malandragem do contragolpe, do jogo malemolente que parece estar retornando depois da temporada de descaracterização sob a direção de Sérgio Guedes e de Gallo.
A dificuldade do Santo André em aplicar roteiro de dissimulação produtiva é que, diferentemente do passado que transformava o tempo em aliado, agora o tempo é adversário. Não é possível deixar o jogo escorrer sob a tranquilidade de um mosteiro, por conta da aflitividade de uma enxurrada de complicações classificatórias.
O Santo André que vi contra o Barueri, principalmente o Santo André do segundo tempo, lembrou aquele time traiçoeiro que sugere ao adversário um certo desdém pelo resultado, uma certa inapetência pelo resultado mas que, de repente, pimba, está lá metendo uma bola na trave.
É esse o Santo André com a cara de Sérgio Soares, um Santo André que poderá sofrer sim as consequências de ter se afastado de Sérgio Soares durante toda essa temporada.
Ou seja, é um Santo André em busca da identidade perdida com a saída de Sérgio Soares num negócio típico de português da anedota: perdeu o treinador, que virou um fantasma por onde passou desde o começo do ano, e perdeu o Santo André, entregue a experimentos táticos válidos, emanados dos treinadores que passaram por aqui, mas que não deram bons frutos. Exceto no Campeonato Paulista, quando a base deixada por Sérgio Soares impediu contravenção mais drástica do cromossomo tático.
Observando o restante da tabela da Série A e seguindo à risca a divisão dos 10 jogos em dois minitorneios, é nítida a vantagem do Botafogo sobre o Santo André. Vou tentar definir as razões.
Primeiro, porque o Botafogo joga seis vezes em casa (um dos quais o clássico contra o Flamengo e os demais contra Avaí, Náutico, Coritiba, São Paulo e Palmeiras) e apenas quatro fora (Cruzeiro, Internacional, Barueri e Atlético Paranaense). O Santo André joga cinco vezes em casa (Fluminense, Palmeiras, Grêmio, Avaí e Náutico) e cinco vezes fora (Atlético Paranaense, Cruzeiro, Corinthians, Goiás e Internacional). Quem tem torcida como o Botafogo e quem não tem como o Santo André sabe a importância do apoio das arquibancadas na reta de chegada.
Segundo, evidentemente, porque precisa de menos pontos. O ciclo de pelo menos sete pontos em cada um dos dois minitorneios parece menos complicado no segundo do que no primeiro. Terminar a competição jogando em casa com um Palmeiras que poderá ter a situação já definida seria vantagem considerável, já que o mesmo Palmeiras enfrentará o Santo André bem antes, quando a classificação estará mais acirrada.
Terceiro, se o passado recente serve para alguma coisa, nesses mesmos 10 jogos do primeiro turno o Botafogo se saiu bem melhor que o Santo André. Contra os mesmos adversários que vai enfrentar no returno, o Santo André ganhou apenas sete pontos no primeiro turno, enquanto o Botafogo ganhou 13. Quem entende que esse confronto é irrelevante, provavelmente juntará uns 10 motivos para provar, mas não custa nada desfilá-los. É muito importante, porque é uma sequência de jogos que vai se repetir, com mandos trocados.
Não há na literatura esportiva nenhuma evidência de que um conjunto de jogos do primeiro turno, quando colocado em enfrentamento com os mesmos jogos do segundo turno, apresente probabilidades de resultados semelhantes. Mas também não há nada em contrário. Só uma profunda pesquisa poderia elucidar a questão. Não é hora para isso, mas acredito que no mínimo a especulação, no sentido literal, tem algum valor.
Gostaria de contabilizar argumentos francamente favoráveis ao Santo André, como o fiz em outras situações (basta acionar o mecanismo de “busca” deste site) mas insisto na teimosia de não vender ilusões para agradar a platéia.
O Santo André está melhorando dentro de campo mas transmite a sensação de que é aquela melhora do desenganado. O Botafogo seria a eutanásia do Santo André na Série A do Campeonato Brasileiro.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André