Política

Pesquisa fora de tempo torna
Auricchio cabo eleitoral forte

DANIEL LIMA - 21/03/2023

A pesquisa do Instituto Paraná publicada na edição de hoje do Diário do Grande ABC tem inconformidades congênitas que a tornam praticamente inócua, mas, paradoxalmente, serve para consagrar o que se pretenderia contestar: o prefeito José Auricchio Júnior anda com prestígio relativamente robusto. Tanto que é  até prova em contrário o melhor cabo eleitoral que concorrentes ao Paço Municipal gostariam de contar em outubro do ano que vem. 

Repito o que escrevi outro dia sobre pesquisa semelhante do Instituto Paraná que pretendeu tomar o pulso do eleitorado municipal em São Bernardo: trata-se de afobação cronológica que deve ter alguns propósitos que passam longe da racionalidade política no sentido mais nobre. 

Mas vamos ao que interessa agora e o que interessa agora são os números de São Caetano.  

PONTOS PRINCIPAIS  

Antes disso, faço uma lista breve do que chamo de inconformidades congênitas que, no fundo, subvertem qualquer sentido de solidez dos dados, tornando-os elásticos demais à imaginação e a interpretações espertas. Vejam os pontos:  

1. Margem de erro cavalar. 

2. Obviedades dos resultados. 

3. Insustentabilidade numérica.   

 

Relacionados os pontos principais, vamos então a breves considerações: 

 MARGEM DE ERRO CAVALAR 

Uma pesquisa eleitoral, qualquer pesquisa eleitoral, que tenha mais de dois pontos percentuais de margem de erro, não é pesquisa eleitoral. É pura especulação, quando não esculhambação em nome da ciência.  

Margem de erro de quatro pontos percentuais, caso da pesquisa do Instituto Paraná, é margem de manobra, não mais que margem de manobra, parente próxima de marginalidade relacionada ao Código de Processo Penal Ético.  Não existe? Que se crie.   

Vou dar um exemplo da situação posta. Segundo dados apresentados no Diário do Grande ABC, a disputa eleitoral em São Caetano envolveria sete candidatos. Três dos quais, destaca o jornal (“Regina, Fabio Palacio e Tite embolados pelo Paço de São Caetano”) estão praticamente empatados numericamente.  

Regina Maura, Secretária de Saúde e supostamente apoiada mais uma vez pelo prefeito, contaria com 16,4% dos votos validos, ante 15,3% de Fabio Palacio e 14,5% de Tite Campanella, vereador que em 2021 virou prefeito diante o impedimento legal de Auricchio.  

GRUPO DE CINCO  

Levando-se em conta a metodologia e a margem de erro, são cinco e não apenas três os concorrentes embolados. O ex-prefeito Paulo Pinheiro com 10,8% e o professor Pio Mielo, com 10,3%, também devem ser catalogados como favoritos compartilhados. 

Favoritos compartilhados é o que chamaria de uma suruba eleitoral na qual todos participam com o que tem e alguém ou alguns saem chamuscados, para não dizer outra coisa.  

A equação é simples, sempre tendo a margem de erro como indexador de análise. Margem de erro de quatro pontos percentuais significa uma banda larga de oito pontos percentuais para se trabalhar à vontade em forma de interpretações variadas. 

A líder Regina Maura, com 16,4%, poderia ter 20,4% como também 12,4%. Não esqueça o leitor que são um tango quântico: são quatro passos para lá, quatro passos para cá.  

DOIS DE FORA  

Ora, se Regina Maura pode ter 12,4%, seria superada por Paulo Pinheiro, que saltaria de 10,8% para 14,8% e também por Pio Mielo, que passaria de 10,3% para 14,3%. Sempre é bom lembrar dos quatro para cima e dos quatro para baixo. Se esquecer, o raciocínio vai para o beleleu.  

Esse mesmo exercício matemático, sempre ancorado na margem de erro, poderia ser repetido com todos os candidatos listados pelo Instituto Paraná. Menos com os dois últimos, Caio Salgado, que tem 6,9% e Leandro Prearo, com 2,1%. Afinal, por mais que saltem, não saltarão o básico para penetrar no grupo de supostos favoritos. Temos, portanto, na margem de erro, um erro crasso de interpretação dos dados.  

 OBIVIEDADE DOS RESULTADOS 

A lógica de que os resultados numéricos da disputa em São Caetano dispensariam uma pesquisa apressada levando-se em conta o calendário eleitoral se dá simplesmente porque são esses os agentes que mais frequentam o noticiário formal e informal. Tê-los numa disputa preliminar em forma de pesquisa seria desnecessário agora, portanto. Até porque, a metodologia aplicada mistura os resultados de cinco deles, tornando-os favoritos ou descartáveis na medida em que se utilizam os quatro pontos percentuais para cima ou para baixo para potencializar ou esterilizar candidaturas.  

 INSUSTENTABILIDADE NUMÉRICA 

Essa questão tem tudo a ver com a anterior. De fato está na raiz do enquadramento da anterior sob o conceito de obviedade de resultados. Há em comum entre os concorrentes listados tanto a percepção pública de que são concorrentes quanto a constatação de que ainda não são levados a sério a ponto de comprometimento do eleitor. 

Vou explicar tudo  com uma das respostas apresentadas pelo Instituto Paraná, quando se trata de voto espontâneo.  

Todo mundo sabe que voto espontâneo é uma coisa, e voto estimulado é outra. Voto espontâneo é aparecer diante de você um entrevistador do Instituto Paraná e lhe indagar em quem vai votar para prefeito em São Caetano no ano que vem.  

Por incrível que pareça, entrevistadores do Instituto Paraná fizeram isso ainda outro dia de modo que os resultados fossem levados ao jornal. Há tantos meses a separar a realidade de hoje e a disputa eleitoral em outubro do ano que vem que é praticamente impossível acreditar que o voto explicitado agora seja representativo. 

CEDO DEMAIS  

Tanto não é representativo e por isso se mede com clareza o quanto a pesquisa é apressada que nada menos que 81,2% dos eleitores entrevistados não apontaram nome algum.  

Nada menos que 74% não souberam responder e outros 7,2% disseram que não irão votar em nenhum dos nomes apresentados na pesquisa. Como esses 7,2% seriam eleitores colocados em xeque diante de votos espontâneos ( o texto do Diário não me tirou essa dúvida), vou ficar apenas com os 74% que disseram espontaneamente que não saberiam em quem votar. Sobraram, portanto, 26% de votos válidos espontâneos.  

Um total de 26% de votos válidos no critério espontâneo é praticamente nada. E é muito menos quando se verifica que o  prefeito José Auricchio, que não pode concorrer por razões de estar num segundo mandato dos quatro em que foi eleito, ter recebido 11% dos sufrágios. Sobraram de fato, portanto, 15% dos votos espontâneos a serem escrutinados. 

Traduzindo: apenas 15% dos eleitores de São Caetano ouvidos pelo Instituto Paraná disseram na lata, sem pestanejar, em quem votariam para prefeito no ano que vem.  

VOTOS MIRRADOS  

Sabem os leitores o que aconteceu com os concorrentes em São Caetano diante do questionamento em quem os eleitores votariam sem que nada de material metodológico os estimulasse? Quem mais conseguiu votação foi Fabio Palacio, com apenas 2,3% das intenções. Os demais favoritos, segundo a pesquisa, seguiram trilha semelhante. Para baixo, claro.  

Para completar a operação-desastre no quesito de votos, 23,8% dos eleitores entrevistados resistiram na rodada de explicitude de voto estimulado e não escolheram nenhum dos concorrentes listados. Ou seja: ao distanciamento memorial do primeiro quesito de espontaneidade somou-se a resistência prática do estimulado.  

Nenhum dos candidatos listados, esteja em primeiro lugar precário ou em sétimo lugar igualmente precário, deve cantarolar sucesso ou lamentar fracasso nessa rodada inicial de pesquisa apressada do Instituto Paraná. Trata-se muito mais de marketing do que de ciência. 

VEZ DO PREFEITO  

Agora, e finalmente chegamos aonde pretendíamos em relação à manchete deste dia, a situação do prefeito José Auricchio é relativamente privilegiada.  

O titular do Paço de São Caetano, à parte qualquer avaliação sobre o desempenho ao longo desse mandato e dos três anteriores, ainda se apresenta como o principal cabo eleitoral da disputa.  

A pesquisa do Instituto Paraná constatou que Auricchio conta com avaliação bastante positiva porque são 13,3% dos eleitores que o consideram ótimo e 38,9% o colocam em situação de administração “boa”. Somando-se os dois públicos, chega-se a 52,2% de aprovação. 

Tenho também reservas ao critério definidor de aprovação levando-se em conta estritamente as respostas favoráveis explicitamente dos eleitores pesquisados, em forma de “ótimo” e “bom”.  

E os entrevistados que optaram por “regular”? Até prova em contrário, “regular” é o caminho do meio entre “aprovação” e “reprovação”, mas, ao mesmo tempo, é um critério em termos de positivo e negativo. Estaria o “regular” de Auricchio mais próximo de “aprovação” ou de “reprovação”? 

Diria que o maior filão dos 29,4% de “regular” está mais inclinado à “aprovação” do que à “reprovação”. Por que? Simplesmente porque é pequeno o nicho de eleitores que desaprovam a gestão ou as gestões de José Auricchio. São 8,2% que entendem ser a administração “ruim” e 7,9% que o colocam no compartimento de “péssimo”. Total de reprovação explicita de 16,1%. Mais ou menos o tamanho do petismo em São Caetano.



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