Política

Paulinho-Morando: entre a
casa da sogra e o cão raivoso

DANIEL LIMA - 10/05/2023

Do ponto de vista político e também administrativo, a gestão de seis anos e cinco meses do prefeito de Santo André, Paulinho Serra, é uma réplica de casa da sogra. Já a gestão de Orlando Morando, em São Bernardo, é típica de moradia guardada por cão raivoso. Isso vai ser fundamental às definições eleitorais do ano que vem nos dois municípios. 

A casa da sogra de Paulinho Serra está mais que impressa, está impregnada, na fluvialidade de pré-candidatos à sucessão do ano que vem. Há concorrentes para todos os gostos, interesses e subordinações. Quem pensa que vai mandar, se ganhar a eleição, vai mandar menos do que imagina.  

A casa de cão raivoso de Orlando Morando é justamente o contrário. Até agora prevalece um ambiente de escassez de concorrentes ao apoio da máquina e, com isso, o eventual vencedor terá mais liberdade e voz para cuidar da administração. 

CANDIDATOS DEMAIS  

Em Santo André, há solavancos a dar com pau. Grande parte do secretariado e mesmo de entorno mais próximo se sente em condições de disputar a sucessão. O prefeito de poder relativo baixo diante do conglomerado de operadores da administração incentiva a pluralidade.  

Até outro dia, dava-se a vitória da situação em Santo André como certa. Aí entrou em campo a pesquisa do Instituto Paraná e mostrou o óbvio: o PT tem garrafa para vender depois de Lula da Silva obter 48% votos válidos no segundo turno presidencial do ano passado. 

Em São Bernardo, há previsibilidade notória de que o PT sempre entrará em campo em condições de combate. A exceção já se consumou, quando a herança maldita de Dilma Rousseff arrasou o partido e destruiu o Grande ABC, especialmente São Bernardo.  

DESASTRE DILMISTA  

A Capital Econômica do Grande ABC perdeu uma frota de caminhões do PIB Geral nos dois anos nefastos de Dilma Rousseff, entre 2015-2016. Muito mais que a média do Grande ABC. 

Sabendo como sabe que o PT de São Bernardo é mais aguerrido e competitivo que o PT de Santo André, porque de formato sociológico diferente, Orlando Morando faz uma administração com mão de ferro.  

O que mais diferencia os grupos relacionados a Orlando Morando e a Paulinho Serra é que o prefeito de São Bernardo tem o controle dos cordéis em grau suficiente para não flertar com posição de marionete dos poderosos. Paulinho Serra virou marionete dos poderosos.  

LANCE SURPREENDENTE 

Por essas e outras Orlando Morando talvez faça um lance surpreendente no ano que vem e dê suporte logístico à candidatura do secretário de Saúde, Geraldo Reple, ao invés de apoio mais que esperado ao ex-vice-prefeito e agora deputado federal Marcelo Lima.  

Nas últimas semanas surgiram indicativos de que Geraldo Reple precisa ser combatido. A mídia contrária a Orlando Morando não dá trégua ao secretário. Há pecados e pesadelos na infraestrutura física e material do setor de saúde de São Bernardo tanto quanto, menos ou mais que em tantos municípios semelhantes.  

Precariedade localizada ou ampliada de atendimento à saúde é matéria-prima abundante à crítica. Nem poderia ser diferente.  

SOBRA E ESCASSEZ  

São Bernardo ganhou neste século mais que uma São Caetano de moradores e perdeu PIB astronômico. Mais gente para cuidar e menos dinheiro para investir. 

Em Santo André essa mesma mídia tão exigente faz vistas grossas no campo da saúde e esconde o quanto pode as travessuras de Paulinho Serra no gerenciamento do Município. A distribuição de poderes do Executivo é tão diversa e muitas vezes conflitiva que qualquer cobrança mais aguda será um tiro no próprio pé.  

O resumo da ópera envolvendo os prefeitos dos dois municípios mais importantes da região, responsáveis por 60% do PIB e pelo disseminar da cultura do Grande ABC, é que o que sobra a um de governança e governabilidade falta ao outro. E aí está a raiz da fragilidade política. 

NOTA DAS GESTÕES  

Sobram governança e governabilidade a Orlando Morando e escasseiam governança e governabilidade a Paulinho Serra justamente porque o recheio de tudo isso é o calendário eleitoral deflagrado no primeiro ano de gestão de cada um deles.  

O que distancia Orlando Morando de Paulinho Serra é que o prefeito de São Bernardo se elegeu em outubro de 2016 sem ultrapassar a linha de fundo de excessos de parceria. Já Paulinho Serra chegou lá graças à festança de coalizões oficiais e oficiosas. 

Ao final dos dois mandatos dos dois prefeitos pretendo estabelecer uma nota de gestão com base em alguns quesitos relevantes.  

Preliminarmente, a nota média de Orlando Morando é sete, numa escala de zero a dez, enquanto a nota média de Paulinho Serra não passa de três. Até dezembro do ano que vem pode ser que alguns pontos se alterem. Acho difícil.  

MUNDOS DIFERENTES  

É importante destacar preliminarmente, como vacina impeditiva a críticas açodadas, que a nota de gestão aos dois prefeitos não tem relação alguma com sucesso ou fracasso nas próximas eleições. O tempo já provou que não faltaram prefeitos bons de voto, mas medíocres em gestão.  

A gênese das respectivas notas está no abismo de governança (interna, do Paço Municipal) e de governabilidade (de amplidão institucional).  

E nesse ponto volto ao título deste artigo. É impossível a Paulinho Serra assumir o controle do que jamais teve. E o que teve e tem é um festival de gente de todos os espectros sociais, econômicos e políticos, principalmente.  

AMPLIDÃO E LIMITES  

Paulinho Serra fez acordo com deuses e diabos. Lideranças externas de partidos nacionais fortemente estabelecidos em São Paulo e mesmo em Brasília, caso de Gilberto Kassab, tomaram conta do barraco de flexibilidades administrativa.  

Orlando Morando não chegou a esse nível de alienação do patrimônio eleitoral adquirido nas urnas. Não é que não chegou a esse nível. Orlando Morando praticamente determinou um limite de governança e governabilidade compartilhada e foi em frente.  

Há que se levar em conta nessa disputa que pode ser indelicada para alguns, mas é essencial à compreensão destes tempos da política do Grande ABC, que Orlando Morando é mais maduro, mais experiente, mais tudo que Paulinho Serra.  

Se tudo isso não fosse suficiente, acrescente-se o fato de que a escola política de São Bernardo é muito mais exigente em graduação de controle de poder quando contraposta a de Santo André.  

Desde que o PT decidiu priorizar as urnas de São Bernardo, o combate local se intensificou.  

Diferentemente de Santo André, que viveu e ainda vive a viuvez de Celso Daniel. Ganhar eleição em São Bernardo meio avermelhada, meio azulada ou agora amarelada (dos tucanos para os bolsonaristas de Tarcísio de Freitas) é muito mais difícil que em Santo André de um avermelhado e de um azulado-amarelado semelhantes, mas de texturas menos conflitivas.   



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