Santo André e São Caetano encerraram o primeiro circuito da Séria A do Campeonato Paulista com saldos positivos. O Santo André está no chamado G4 e o São Caetano vem logo em seguida, em sexto lugar. Poderia ser melhor. Mesmo errando, o São Caetano poderia ter vencido o Monte Azul no final de semana. Menos mal que saiu de uma derrota de 2 a 0 para um empate satisfatório. Para o leitor entender o significado de circuito, dividi o campeonato em cinco etapas, cada uma com cinco jogos. Apenas a etapa final contará com quatro jogos, porque cada equipe disputará 19 partidas na competição.
O aproveitamento das equipes do Grande ABC no primeiro circuito é superior a 50% (exatamente 56,6%), o que sugere certo conforto porque se distancia da zona de rebaixamento, que engolfará os quatro últimos colocados e cuja marca histórica de degola é de 33%. O problema dos times da região é que não enfrentaram nenhum dos quatro grandes até agora. E historicamente, sobremodo no caso do Santo André, a produtividade cai nesses encontros.
As turbulências começam neste meio de semana quando o Santo André enfrenta um Santos que tem pouca ciência tática mas muita virtude técnica e o São Caetano joga com um São Paulo ainda à procura de formato tático e que por isso mesmo recorre à velharia aérea herdada de Muricy Ramalho.
Mais importante mesmo é constatar a evolução do São Caetano e do Santo André. As equipes estão confirmando a expectativa de que têm tudo para terminar a competição preparadas para a Série B do Campeonato Brasileiro, que é o que de fato importa. Essa projeção não deve ser traduzida como descaso a eventuais reforços. Nada disso. Mas a estrutura tática e técnica está se delineando.
No Santo André, em vez de Branquinho, que joga com a cabeça baixa e por isso mesmo compromete a visão periférica e sensibilidade ao conjunto, individualizando demais as jogadas, quem é o cerne técnico-tático chama-se Gil, falso ponta-direita que compõe e dá densidade ao meio de campo e também alimenta o contragolpe — como no segundo gol de ontem contra o Ituano. Gil é desses jogadores que passam despercebidos aos olhos que se fixam apenas na bola, quando de fato é a movimentação coletiva e a capacidade de intervir sem grandes alardes que costumam fazer a diferença. Principalmente para quem não é craque.
Quem dá o tom, a régua e o compasso no São Caetano é um Vanderlei cada vez mais lépido, mais clarividente, mais contundente. Um atacante que, a continuar no ritmo de evolução técnica, provavelmente não terá outro destino senão um grande time. Vanderlei consegue ser múltiplo no ataque. Desloca-se às costas dos zagueiros, abre espaços pelas laterais e, quando preciso, torna-se contundente como atacante que vem de trás. É incompreensível que ainda não tenha explodido como talento na arte de infernizar a vida de zagueiros. Talvez lhe falte apenas sequência de jogos. Assim ele definirá de vez um estilo aterrorizador: parece movimentar-se com lentidão mas de fato, verdadeiramente, é estupendamente racional na redução ou ampliação de espaços.
Ainda é muito cedo para traçar o destino de Santo André e São Caetano na Série A do Campeonato Paulista, mas não é exagero dizer que as perspectivas para o Campeonato Brasileiro são motivadoras porque a modelagem está se definindo. Basta que dirigentes afoitos ou sedentos de personalismo não metam os pés pelas mãos.
Vou traduzir o que quero dizer: há dirigentes que não suportam o sucesso de uma equipe. Principalmente quando se atribui a maior parcela desse sucesso aos treinadores que são, em última instância, os responsáveis maiores pelo planejamento, montagem e estruturação dos elencos.
Como são personalistas e não se satisfazem com a condição de dirigentes, esquecendo-se portanto que sucessos e fracassos também lhes são creditados ou debitados, exageram em medidas intervencionistas.
Principalmente porque escancaram as portas para empresários que, quando vislumbram equipes potencialmente vencedoras numa temporada, querem que querem incorporar ativos técnicos — no caso jogadores cujos direitos federativos lhes pertencem. O cerco nas equipes que começam a dar sinais de que podem brilhar é intenso e se não houver controle de gestão, a bagunça estará instaurada. Não é diferente o comportamento que atinge as equipes que se vêem em maus lençóis, porque não faltam empresários milagreiros com receitas redentoras.
Em suma, o futebol nestes tempos inescapáveis de empreendedorismo privado é um pulsar constante de interesses multilaterais que costumam sequestrar quem não tem preparo para resistir a pressões. O Santo André e o São Caetano não terminaram por acaso a última temporada com elencos de mais de quatro dezenas de jogadores. Quanto maior o elenco, mais complicações gerenciais e mais possibilidades de o ambiente deteriorar-se.
Ao enxugarem os quadros para esta temporada e ao entregarem aos técnicos Antonio Carlos Zago e Sérgio Soares a independência relativa que deve definir a função, tanto os dirigentes do Santo André quanto do São Caetano reconheceram os descaminhos da temporada anterior e, portanto, demonstraram amadurecimento. Agora precisam estar preparados para novos assédios.
Que não se perca a perspectiva de que o que mais interessa mesmo é a Série B do Campeonato Brasileiro. O Campeonato Paulista é um ótimo campo de provas.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André