Esportes

Ramalhão de futebol moleque;
Azulão sob nova expectativa

DANIEL LIMA - 22/02/2010

Encerrado o segundo circuito da Série A do Campeonato Paulista, a participação de São Caetano e Santo André é melhor que o esperado. O Ramalhão está em segundo lugar com 21 pontos e o Azulão em sexto com 17. Ao final do primeiro circuito o Santo André estava em quarto com nove pontos e o São Caetano em sexto com oito. Convém lembrar que cada circuito é formado de cinco jogos. O Campeonato Paulista reúne cinco circuitos. O último tem apenas quatro jogos. Depois vêm as fases semifinal e final.


O São Caetano pagou o preço da competência ao exceder-se em eficiência contra o Palmeiras. No dia seguinte perdeu praticamente toda a Comissão Técnica. É claro que tudo isso é força de expressão. Antonio Carlos Zago se foi por conta do que fez na temporada passada ao assumir uma equipe na zona de rebaixamento na Série B do Brasileiro para levá-la ao sétimo lugar. Pelas contas que fiz em termos de produtividade, se a Série B tivesse começado quando ele chegou ao São Caetano, a equipe teria subido à Série A.


Já o Santo André de futebol moleque semelhante ao do Santos, sem os craques extraclasse do Santos, caminha para uma campanha provavelmente inesquecível. A vice-liderança não é obra do acaso. A recuperação do fracasso na Série A do Campeonato Brasileiro parece definitiva.


Pelo andar da carruagem teremos dois times fortíssimos na Série B do Brasileiro.


Uma grande dúvida paira sobre o São Caetano — e é pertinente. Trata-se do seguinte: quem vai ocupar o lugar de Antonio Carlos Zago?


Tomara que seja alguém do mesmo perfil, porque o grupo que está disponível e que vem fazendo boa campanha no Campeonato Paulista foi moldado sob prismas preferenciais do treinador que agora está no Palmeiras.


Antonio Carlos é adepto de futebol de marcação forte, de volume de jogo, de contragolpes, de responsabilidade coletiva. Experiente jogador que passou por grandes clubes e que também atuou fora do País, Antonio Carlos observa a equipe sob cuidados táticos. O individualismo espetaculoso não lhe apetece, embora também não abra mão de valores que demarquem o território da individualidade como aliada do conjunto. Vanderlei e Everton Ribeiro são provas disso.


A escolha do substituto de Antonio Carlos Zago é a travessia da ponte do São Caetano para o restante da temporada. Se errar na mão, poderá colocar tudo a perder. É claro que não é fácil encontrar alguém com as especificidades do ex-zagueiro. Quando faço essa afirmação não estou necessariamente consagrando um técnico que mal iniciou a carreira. O que quero dizer é que o choque da mudança de comando não pode ser impactante demais, além do que já é por natureza. Imaginem se o São Caetano contrata um substituto que seja a antítese de Antonio Carlos? Alguém que prefira um futebol menos cuidadoso coletivamente, mais ostensivamente ofensivo. Alguém, em suma, que seja o homem errado na hora errada.


Querem que cite um exemplo emblemático de que não seria a competência, simplesmente a competência, que determinaria uma boa escolha do São Caetano?


Imaginem o São Caetano dirigido por Sérgio Soares, o técnico que mais uma vez está provando no Santo André que, como o ex-titular do comando do São Caetano, sabe organizar uma equipe. O problema é que Sérgio Soares, muito mais que Antonio Carlos, precisa de tempo e de um ambiente inteiramente favorável para aplicar as virtudes que o colocam como profissional comprovadamente montador de grupo. Nas vezes em que pegou o bonde andando, deu-se mal. E poderia se dar mal agora, tanto quanto alguém de seu perfil, se pegar um São Caetano moldado técnica e taticamente de forma diametralmente oposta à do Santo André.


Entre Antonio Carlos Zago e Sérgio Soares há um abismo. O treinador do Santo André joga francamente no ataque, despreza riscos de contragolpes, usa e abusa de triangulações curtas, de passagens de bola, de toque em movimentação constante. Já Antonio Carlos Zago prefere a jogada mais longa, mais veloz no sentido vertical. Um Sérgio Soares no São Caetano montado por Antonio Carlos Zago possivelmente seria um desastre. E a recíproca é verdadeira. Daí a sugestão de que se encontre espécie de clone do treinador que agora está no Parque Antártica.


Quem sabe não esteja na escola gaúcha o profissional ideal para assumir o São Caetano? Uma vasculhada por lá, entre os times médios, não seria interessante? O Santo André não trouxe Mano Menezes antes de o Grêmio descobri-lo porque lhe faltavam recursos financeiros. E o Mano Menezes daqueles dias de XV de Campo Bom, adversário da semifinal da Copa do Brasil de 2004, não era assim tão Mano Menezes.


Diferenças à parte, Antonio Carlos Zago e Sérgio Soares são provas provadas de que em futebol não há modelo único de sucesso. Como tudo na vida, não há protótipo de vencedor nem de perdedor. O que circunstancialmente é um desastre para um determinado modelo de profissional, em outra situação é a grande solução. O vencedor de hoje não é necessariamente o vencedor de amanhã. O homem é suas circunstâncias, já diziam os filósofos.


Está aí Muricy Ramalho como exemplo. Três títulos brasileiros e uma carreira brilhante foram jogados ao lixo por cronistas movidos por resultados tópicos e também por interesses nem sempre explícitos. Como tantos outros profissionais de tantas outras áreas, maus resultados são uma porta aberta a exageros. A sociedade é implacável principalmente com os vencedores, mas é leniente com perdedores contumazes que eventualmente encontram o caminho do sucesso episódico. Poucos observam a carreira de um profissional sob temporalidade longa. Preferem o aqui e agora.


Faltando nove rodadas para o encerramento do Campeonato Paulista, uma coisa é certa: dificilmente o Santo André e o São Caetano deixarão de apetrecharem-se para a Série B do Campeonato Brasileiro, que é o que mais interessa. As possibilidades de participarem das semifinais do Paulista existem, mas não podem ser tratadas de forma traumática. O Santo André não transmite nenhum sinal de que esteja preocupado com a responsabilidade de chegar às semifinais. Joga um futebol quase irresponsável, repito. O São Caetano é menos encantador, mas nem por isso menos eficiente.


Ainda considero que o time ideal seria a fusão dos dois estilos. Talvez isso venha com o tempo nesta própria temporada, porque já há claros sinais de que as jogadas começam a fluir de forma mais natural. A compactação entre os setores, que encurta espaços para os adversários, já começa a aparecer. Estou confiante desde as primeiras rodadas.


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