Esportes

Grande ABC, sinônimo de
veículos e também de futebol

DANIEL LIMA - 29/03/2010

O futebol profissional do Grande ABC encerrou o primeiro trimestre desta temporada com fartos motivos para comemorações: o Santo André é semifinalista da Série A, o São Caetano ainda tem possibilidades, embora remotas, de classificação na mesma divisão e o São Bernardo chegou entre os oito primeiros que disputarão as semifinais da Série B.


Dirão os perfeccionistas que não se trata da Série B, mas da Série A-2 do Paulista. Pura bobagem da Federação Paulista de Futebol, que, com trucagem semântica supostamente para valorizar as divisões de acesso, quer subestimar a lógica. Série A-2 é Série B e está acabado. Portanto, não saiam por aí dizendo que este cronista esportivo (cronista esportivo?) está por fora.


Cronista esportivo? Juro que botei a interrogação de propósito e de forma, mais que abusada, provocativa.


Como jornalista esportivo na origem, jovem de 15 anos em 1965 na revista Cinelândia e na Radio Luz, em Araçatuba, jamais deixei essa função. Até porque, militei durante muito tempo como repórter e depois editor no Diário do Grande ABC. Também no extinto jornal O Repórter tratei de correr atrás da bola. Na sucursal da Agência Estado atuei durante mais de uma década. E, para completar, jamais deixei de ver futebol com lentes de criticidade. Aliás, não consigo ver nada como profissional de jornalismo sem questionar.


Faço essas explicações para que ninguém me chame de penetra no mundo da bola. Tanto que sei exatamente quem é bamba nessa seara e quem não passa de enganador. Juca Kfouri, Tostão, Paulo Vinícius Coelho, e o agora saudoso Armando Nogueira, entre uma dezena de bons de bola, estão na lista de profissionais que admiro. Há um batalhão que vive do esporte mas é tão desinformado que dá pena. Outros fazem do esporte excelentes negócios.


Mas o que interessa mesmo nestas alturas dos campeonatos é o futuro próximo que pode consagrar o Santo André como segunda equipe da região a conquistar o principal título estadual do País, um São Caetano que deu provas de que vale a pena apoiar o grupo de jogadores e o treinador que superaram sábado à noite a Ponte Preta e um São Bernardo que empatou com o Linense e garantiu vaga às semifinais da Série B.


Já imaginaram o Grande ABC em 2011 com três representantes na Série A do Campeonato Paulista?


Jamais isso ocorreu na história regional.


Não interessa nesse momento discutir as bases estruturais de cada uma de nossas representações esportivas, porque sobre isso tenho sérias restrições. Vale mesmo imaginar essa santíssima trindade esportiva a divulgar um Grande ABC que, contraditoriamente, nos momentos de riqueza industrial e de farta mobilidade social, jamais alcançou tamanho êxito.


Sei lá se chegaremos de fato a ocupar três vagas na Série A, sei lá quanto tempo isso vai durar, mas hoje não quero me inquietar com o futuro mais distante. A realidade é que temos possibilidades amplas de terminar o primeiro trimestre com recorde histórico.


É verdade que não gostei do São Bernardo que vi ontem na televisão diante do Linense. Como não acompanho os jogos da equipe, procurei algumas informações. Incomoda-me o fato de o time jogar em câmara lenta, com baixa ocupação de espaço e repetitivas movimentações individuais e coletivas. Talvez não seja suficiente para subir desta vez se o que vi for de fato mais que a exceção, a regra. De qualquer modo, há confiança no elenco e entre os dirigentes, porque a equipe soube reagir na competição, depois de flertar com o rebaixamento.


O que parece ter de melhor o São Bernardo é a torcida. Foram 10 mil torcedores ontem de manhã ao Estádio de Vila Euclides. Está certo que o preço do ingresso é mais em conta do que na Série A, mas nem Santo André nem São Caetano mobilizariam tanta gente com valores semelhantes. Há um entusiasmo em São Bernardo que merece ser capitalizado e multiplicado. O acesso à Série A seria o coroamento de uma organização que parece séria. A comunidade de São Bernardo abraça a equipe, numa conjunção que entusiasma.


O Santo André perdeu um jogo que podia perder, como pode perder para o Rio Claro no final de semana e para o São Paulo no meio da semana que vem. Mesmo que tudo isso aconteça, a equipe estará na semifinal do campeonato. Mas isso não quer dizer que o estado de graça não seja abalado. O Santo André precisa disputar as semifinais com autoconfiança elevada, com aquele sentimento de que tomar gols faz parte do show, porque haverá sempre alguém lá na frente para sapecar o adversário. Por isso mesmo, os próximos jogos ganham conotação especial, de confirmação de uma campanha extraordinária.


Já o São Caetano que venceu a Ponte Preta provou que tem futuro na Série B do Campeonato Brasileiro, se já não bastasse a possibilidade concreta de que poderá lutar por uma vaga à semifinal do Paulista até a última rodada. O jogo de domingo contra o Santos no Anacleto Campanella será ótimo teste para o avanço do sistema defensivo, o ponto forte da equipe, e também para o encaixe mais efetivo dos contragolpes, uma arma mortal que agora conta com um Vanderlei muito mais agudo.


Ainda recentemente prometi escrever sobre a possibilidade de estudar-se variável para o futebol da região, sintetizada na sensibilização em busca de uma única representação regional que conciliasse os interesses diversos de agora. Sei que se trata de verdadeira epopéia da qual não tenho nem mesmo solidificado juízo de valor sobre o acerto que representaria essa condensação de forças.


Esse assunto se tornou proibitivo diante do cenário que se descortina, de um triunvirato regional na Série A do ano que vem. Por mais que se entrelacem argumentos de vantagens em prol de uma única equipe regional, todos se dissolverão como sal em copo fervente diante do que temos em perspectiva.


Defender a tese de um time unificador das cores do Grande ABC no momento vitorioso deste primeiro trimestre é pedir para ser chamado de lunático. O possível racionalismo perderia de goleada para o latente emocionalismo.


Santo André, São Bernardo e São Caetano, o chamado ABC Paulista que o mundo conhece pela economia, especificamente pela força das montadoras de veículos, podem se converter em adjetivo de futebol de primeira linha em âmbito estadual.


Quem diria, quem diria?


Leia mais matérias desta seção: Esportes

Total de 985 matérias | Página 1

05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André
26/07/2024 Futuro do Santo André entre o céu e o inferno
28/06/2024 Vinte anos depois, o que resta do Sansão regional?
11/03/2024 Santo André menos ruim que Santo André. Entenda
05/03/2024 Risco do Santo André cair é tudo isso mesmo?
01/03/2024 Só um milagre salva o Santo André da queda
29/02/2024 Santo André pode cair no submundo do futebol
23/02/2024 Santo André vai mesmo para a Segunda Divisão?
22/02/2024 Qual é o valor da torcida invisível de nossos times?
13/02/2024 O que o Santo André precisa para fugir do rebaixamento?
19/12/2023 Ano que vem do Santo André começou em 2004
15/12/2023 Santo André reage com “Esta é minha camisa”
01/12/2023 São Caetano perde o eixo após saída de Saul Klein
24/11/2023 Como é pedagógico ouvir os treinadores de futebol!
20/11/2023 Futebol da região na elite paulista é falso brilhante
16/10/2023 Crônica ataca Leila Pereira e tropeça na própria armadilha
13/10/2023 Por que Leila Pereira incomoda tanto os marmanjos do futebol?
10/10/2023 São Bernardo supera Santo André também no futebol
10/08/2023 Santo André prestes a liquidar R$ 10 mi de herança do Saged