Esportes

Ramalhão ameaçado de desmanche;
São Caetano deve manter estrutura

DANIEL LIMA - 05/04/2010

O sucesso na Série A do Campeonato Paulista pode custar caro ao Santo André. O rendimento nem espetacular nem decepcionante pode ajudar o São Caetano a manter a estrutura. Eis as duas principais manchetes que deverão marcar a trajetória inicial das duas equipes do Grande ABC no próximo Campeonato Nacional.


Como o mundo do futebol está de cabeça para baixo e não existe, aparentemente, nenhuma regra que não tenha a potencialidade de ser violada, nem mesmo o possível desmanche do Santo André indicaria que a equipe teria roteiro de horrores no Campeonato Brasileiro. Afinal, está aí o Grêmio Prudente, ex-Grêmio Barueri que, mais que mudar de nome, praticamente montou novo elenco para o Campeonato Paulista e, mesmo assim, pode chegar entre os semifinalistas.


O peso da estrutura administrativa e técnica faz a diferença neste futebol em que o conjunto compensa a ausência de grandes craques.


O Santo André está na marca do pênalti porque resolveu abusar da ordem natural do futebol e, com uma campanha espetacular, se meteu entre os semifinalistas do campeonato.


Não estivesse na hora e no lugar errados, já que o Santos apareceu para estragar a retumbância da equipe de Sérgio Soares, nestas alturas do campeonato o Ramalhão estaria provocando muito mais frisson. E os resultados de eventual desmanche seriam mais espetaculares. Para o bem e para o mal.


Basicamente não há diferença entre a preparação do São Caetano e do Santo André para o Campeonato Paulista porque tanto um quanto outro lançaram as bases para disputar a Série B do Brasileiro. Mas nada resiste ao sucesso, assim como ao fracasso. No caso, apenas ao sucesso.


Há poucos jogadores do Ramalhão cujos contratos se encerram após o Paulista e, portanto, têm tudo para bater asas, como é o caso do atacante Rodriguinho, artilheiro do campeonato. Já o São Caetano, depois da experiência dolorida do ano passado, quando refez a equipe durante o Brasileiro, tratou de assegurar margem mais ampla de sustentação do elenco.


Como o Santo André faz mais sucesso nesta temporada e sofre a possibilidade de assédio insuportável, corre mais riscos de desmanchar a equipe sem compensação financeira redentora, porque a Lei Pelé terceirizou para os empreendedores de futebol os riscos e os lucros de investimentos em pé de obra.


Aliás, por falar em compensação financeira, o Santo André destes novos tempos de organização empresarial não se apresenta como exemplo de transparência das numeralhas que o envolvem.


Esse é um comentário que faço de passagem, mas prometo que não vou ficar apenas na superficialidade. Até porque, está prestes a se completar o terceiro ano de constituição oficial do clube-empresa e automaticamente há interesse em se conhecer os resultados.


Principalmente porque a negociação que culminou com o surgimento do clube-empresa tem participação e responsabilidade do clube poliesportivo.


Apenas para se entenda o caso: a sociedade civil responsável pelo futebol do Santo André é uma coisa, o clube socioesportivo com sede no Parque Jaçatuba, é outra. O problema é que pode sobrar para o clube poliesportivo todo o ônus legal por eventuais prejuízos que se acumulem no futebol. O que posso antecipar é que em três anos de composição de uma sociedade limitada, o Santo André Poliesportivo não viu a cor de qualquer tostão em forma de dividendos. E não sabe a quantas vão as despesas e eventuais dívidas.


Vão dizer os mais eufóricos que não é hora de jogar água no chope. Nem essa é a intenção. Mas também não se pode sequer pretender blindar as relações entre poliesportivo e futebol por conta do calendário esportivo. Ainda mais que, repito, aproxima-se o complemento do terceiro ano da concretização dessa negociação. Algo precisará ser feito para impedir que eventual desastre econômico-esportivo comprometa o clube do Parque Poliesportivo.


Por isso, a omissão da direção do clube poliesportivo e também dos acionistas do clube-empresa é uma calamidade ética. Têm-se a impressão que há um pacto do silêncio a permear as relações institucionais entre o clube poliesportivo e o clube-empresa, com o envolvimento geral e irrestrito de todos. Ou pelo menos da grande maioria dos dirigentes e investidores comprometidos com o futuro do futebol profissional de Santo André e também do clube poliesportivo.


A introdução de temário extra-esportivo neste momento não é fortuita. Tem tudo a ver com eventuais respostas financeiras que o Santo André obteria na venda do que antigamente se chamava de atestado liberatório dos jogadores. A situação contratual de atletas que despertam interesse de clubes de porte não assegura que os cofres serão recheados de reais. Há fatiamentos de todos os tipos à distribuição dos valores eventualmente amealhados.


É claro e certo que é muito melhor ter uma equipe que desperte desejos de terceiros por conta do brilho nos gramados do que contar com pernas-de-pau. Nesse ponto, a direção do Santo André não só está de parabéns, como também está convencida de que deve sempre entregar a profissionais da área, no caso o técnico Sérgio Soares e o diretor executivo Carlitos, autonomia controlada para a reestruturação do elenco, como se entregou para a montagem desse mesmo elenco. O rebaixamento à Série B do Campeonato Brasileiro no ano passado foi uma lição dura que o presidente Ronan Maria Pinto parece ter assimilado.


Por mais que futebol não seja um bicho-de-sete-cabeças, os dirigentes devem reconhecer que, da mesma forma que sabem distinguir cabeça-de-bagre de craque, somente os especialistas conseguem juntar as peças e dar sentido coletivo à individualidade tanto quanto individualidade ao sentido coletivo.


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