Esportes

Ramalhão desdenha, Azulão
racionaliza e Tigre é pragmático

DANIEL LIMA - 26/04/2010

O Santo André desdenhou demais o risco de jogar sem medo do Santos, por isso perdeu um jogo que poderia ter vencido. O São Caetano preferiu a racionalidade e a segurança de um resultado magro a ter de correr do prejuízo no final de semana que vem contra o Botafogo em Ribeirão Preto. E o São Bernardo fez para o gasto, com pragmatismo, no empate com o Pão de Açúcar, para subir à Série A do Campeonato Paulista. Eis o resumo resumido do futebol do Grande ABC no final de semana. Um final de semana que poderia ter sido melhor se o Santo André não se encantasse demais com as próprias virtudes. Caiu no conto da louvação paulistana.


Primeiro, as explicações para a derrota do Santo André diante de um Santos agora praticamente campeão.


O técnico Sérgio Soares acertou em cheio ao mandar o time cuidar mais do sistema defensivo, recuando armadores e ponta-de-lança e deixando apenas Rodriguinho e Nunes no ataque. O bloqueio na entrada da área restringiu os espaços para um Santos quase estático que se submeteu docilmente no primeiro tempo à marcação. Foi a primeira vez no campeonato que o Santo André se dedicou tanto à compactação defensiva. O que é natural por conta da superação própria de uma decisão.


O Santo André foi mais defensivo com praticamente os mesmos jogadores dos compromissos anteriores.


O problema é que Sérgio Soares surpreendeu negativamente ao improvisar o lateral direito Rômulo na esquerda. Com isso, nem teve um substituto à altura da técnica e da velocidade de Carlinhos, titular da função que cumpriu suspensão automática, e ainda aprofundou a inapetência defensiva. Teria sido mais lógico se escalasse o jovem Arthur, mais marcador que Carlinhos e que Rômulo. Ou, principalmente, que optasse por um terceiro zagueiro para adensar o interior de dois zagueiros de área pesados demais. Principalmente Toninho.


O cadafalso de Sérgio Soares foi a opção pelo estabanado Rômulo. Reparem nos três gols do Santos, todos no segundo tempo. Prestem atenção.


No primeiro, veja onde estava Rômulo enquanto Ganso, na grande área, cruzava a bola da esquerda para a trave oposta, onde André apareceu livre para marcar de cabeça. Repararam? Pois é: Rômulo estava na entrada da grande área, completamente fora de função. Ele deveria estar exatamente onde André apareceu livre. A função defensiva de um lateral de qualidade é cobrir os zagueiros de área em cruzamentos do lado oposto. Rômulo não faz isso nem quando ocupa a lateral direta, quanto mais na esquerda. Rômulo é mais ala que lateral; ou seja, é um armador pela direita sem cacoete de marcação e cobertura.


Nos outros dois gols do Santos, Rômulo também estava no mundo da lua. No segundo gol, em rápido contragolpe santista, quando Wesley apareceu livre pela direita, quem tentou cobrir a ausência de Rômulo foi o armador Bruno César. Só poderia dar no que deu. No terceiro gol, bola perdida no meio de campo e lançada nas costas de Rômulo para a penetração de Wesley, o lateral improvisado por Sérgio Soares tropeçou nas próprias pernas e o santista só teve o trabalho de completar.


Nenhum cronista paulistano se deu conta dos tropeços funcionais de Rômulo. Se ocorressem tantos erros com Roberto Carlos, por exemplo, o mundo cairia sobre o lateral do Corinthians. Rômulo está numa outra dimensão de exigibilidade técnico-tática.


Seria demais acreditar que, mesmo jogando no extremo da competência defensiva, como fez o Santo André num primeiro tempo em que o meio de campo foi bastante solidário, seria possível derrotar o Santos com uma peça-chave do setor falhando tanto. Ainda se Rômulo tivesse feito ofensivamente a diferença naquela arrancada no primeiro tempo, o risco não teria sido compensado.


O técnico Sérgio Soares é o principal responsável pela campanha do Ramalhão ao introduzir o conceito de liberdade e de criatividade que Dorival Júnior também adotou no Santos. Entretanto, esteve numa tarde bastante infeliz ao optar por Rômulo, escalado em outros jogos menos complicados. Um terceiro zagueiro teria oferecido resultado defensivo muito melhor.


O Santo André que entrou nas finais do Campeonato Paulista sugere desdobramento compulsório do Complexo de Gata Borralheira — o sentimento de inebriar-se com os elogios de terceiros, dos quais necessita intensamente para ajustar a auto-estima. Nada mais ingênuo. A história não costuma ser generosa com os perdedores. Talvez uma dosagem menos intensa de técnica e uma injeção de pragmatismo poderiam ter mudado a história do jogo no qual um Santos com meio time pendurado com cartões amarelos atuou claramente preocupado em manter o grupo intacto para as inesquecíveis fotos de campeão, domingo que vem.


Já o São Caetano que venceu o Botafogo de Ribeirão Preto por 1 a 0 no sábado no Anacleto Campanella corre sim o risco de ficar sem o título de campeão do Interior. A vantagem é estreita demais, conseguida que foi num segundo tempo em que a expulsão de um adversário e a soltura de amarras excessivamente cautelosas contribuíram para o resultado final. Talvez o que possa embalar a expectativa de que o São Caetano voltará de Ribeirão Preto com o título seja a solidez defensiva e a formação do grupo para explorar os contragolpes, marca que Antonio Carlos Zago deixou para Roberto Fonseca que, apesar de várias tentativas de melhora, ainda permanecem como impressões digitais.


O São Caetano pode voltar campeão de Ribeirão Preto se não deixar o Botafogo traduzir o maior volume de jogo em finalizações. A equipe de Ribeirão Preto tem um futebol mais criativo, de maior mobilidade, mas não traduz a movimentação geral com o mesmo grau de eficiência de ataque. Se estiver naquelas tardes de contundência ofensiva, derivadas de contra-ataques arrancados principalmente em jogadas longas, o São Caetano surpreenderá quem acredita que posse de bola é tudo no futebol.


Já o título da Série B conquistado pelo São Bernardo diante de 14 mil pagantes revela tantas coisas que seria preciso muito mais espaço a explicações. Talvez o momento decisivamente mais importante do São Bernardo tenha sido a humildade da diretoria em romper com o próprio planejamento iniciado no ano passado ao demitir o técnico Luciano Dias quando a equipe frequentava a zona de rebaixamento após as sete primeiras rodadas. Não é toda direção de clube ou de qualquer corporação que decide rever compromissos. A situação dramática na competição superou todas as barreiras que impermeabilizavam o treinador escolhido a dedo para comandar o projeto em campo.


Quem diria, quem diria, que, ano que vem, a Santíssima Trindade do Grande ABC vai estar no principal campeonato estadual do País? Vou escrever esta semana sobre algo que não pode ficar para depois: a importância de juntar, fora de campo, forças diretivas para adensar a representação popular de nossas equipes. Não podemos passar mais pelo vexame de ontem à tarde no Pacaembu, quando o Tobogã não ficou ainda mais vazio porque discretos torcedores santistas invadiram o espaço que os gatos pingados ramalhinos ocuparam com muito entusiasmo.


O mínimo que a direção do Santo André tem a fazer para o jogo de domingo que vem é deixar que os santistas ocupem de vez aquele espaço e, com isso, concentre os poucos ramalhinos no cantinho reservado a todos os adversários do Corinthians, ao lado das cabines de imprensa.


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