Política

PT ligado a Serra vira
alvo de Serra pela crise

DANIEL LIMA - 25/03/2024

Em mais um capítulo da errática tentativa de reverter a crise sucessória de um jogo que caminhava até então a uma vitória esmagadora, o prefeito Paulinho Serra e seu grupo partem para novo ataque com cheiro, suor e resultados de uma botafogada.

A ordem agora é jogar nas costas de um aliado de primeiro hora, o PT de Santo André, a responsabilidade pela convulsão provocada principalmente pela candidatura dissidente do vice-prefeito Luiz Zacarias.

Agora a decisão é transformar em vilões da crise os aliados petistas de Santo André. Há sete anos os petistas ocupam cargos importantes no Paço Municipal, cumprindo acordo firmado nos bastidores que levaram Paulinho Serra ao comando da Prefeitura nas eleições de 2016 -- em vitória contra o próprio PT, então estiolado eleitoralmente.

Responsabilizar o PT pela crise genuinamente do Paço Municipal é mais uma tática de guerra na tentativa de resgatar relações interpartidárias que se esgarçaram com as trapalhadas sucessórias a partir da patetice da formação do Grupo dos Nove Privilegiados, que ruiu.

TEMPESTADE FORTE

Há indicativos de que a emenda da terceirização de responsabilidade pela botafogada que se insinua no horizonte eleitoral de Santo André soará pior que o soneto de reflexões internas que poderiam encontrar algum caminho restaurador.

Partir para o ataque quando o melhor seria recuar e planejar reorganização não consta da campanha eleitoral do Paço Municipal. Apesar de tudo o que ocorreu nos últimos dias, ainda se respira ou se procura passar publicamente a ideia de que não há tempestade em curso. Uma tempestade que se agrava porque a cada movimento do Paço Municipal, mais enroscos brotam.

O Paço Municipal de Santo André comporta mais de cinco dezenas de petistas em postos de comando direto ou de assessoramento. Esse é o resultado do acordo firmado durante o segundo turno da disputa de 2016, quando o então prefeito petista Carlos Grana sucumbiu à reeleição sob o peso dos destroços do governo Dilma Rousseff.

Como se sabe, o PT foi implodido em termos eleitorais. Venceu em poucas prefeituras no Estado de São Paulo.

SECRETÁRIO PETISTA

Paulinho Serra foi secretário de Mobilidade Urbana da Administração Carlos Grana até que seu grupo sentisse a possibilidade de sucesso eleitoral na medida em que o governo Dilma Rousseff aprontava pedaladas irreversíveis que lhe custou o mandato e gerou no Brasil-- e especialmente na região -- a maior recessão econômica da história.

De secretário petista Paulinho Serra virou candidato de oposição, já com o suporte de petistas que saltaram do barco de Carlos Grana por instinto de sobrevivência.

São os petistas egressos da gestão de Carlos Grana que relutam, com menos ímpeto de antes, em abandonar o barco neste último ano de dois mandatos do prefeito Paulinho Serra. Eles ainda não se sentem seguros em deixar o Paço Municipal ou de se manifestarem favoráveis a qualquer candidatura que não seja situacionista.

Há temores entre esses petistas de que correriam risco de perder cargos. Por isso, preferem esperar os próximos tempos. Outros petistas não instalados no Paço Municipal querem ver o time petista em campo. A crise na Administração de Paulinho Serra é o oxigênio que fez o PT sair das catacumbas da inoperância política em Santo André.

MARANGONI À FRENTE

Do grupo do vice-prefeito dissidente Luiz Zacarias não faltam demissões, garantem aliados do agora concorrente de oposição. Atribui-se a Luiz Zacarias a pecha de traidor. A ofensiva já era esperada.  O vice-prefeito era avaliado como uma carta de aquiescência total no baralho da disputa majoritária.  Jamais Zacarias foi observado como fonte de rebeldia. Muito menos ainda como participante de operação externa provavelmente com apoio do governador Tarcísio de Freitas, entre outras agremiações.

O deputado federal Fernando Marangoni seria o abre-alas extramunicipal. Ele rompeu relações com o grupo de Paulinho Serra e se juntou a Zacarias.

 Já o PT de Santo André e o PT Federal estão em disputa interna para definirem o que vão fazer nos próximos tempos. Tem-se como certo que o desgaste do Paço Municipal vai calibrar possíveis iniciativas mais agressivas.

Fazem-se cálculos sobre a movimentação que esquerdistas e centro-esquerdistas, e parte do eleitorado de centro, poderiam dar de respaldo à corrida pelo prolongamento da disputa ao segundo turno e, com isso, as combinações que dariam sustentação à vitória no segundo turno.

O referencial de 48% dos votos válidos de Lula da Silva para presidente em Santo André nas últimas eleições presidenciais é espécie de âncora de expectativas.

PIXOTADA HISTÓRICA

A crise no grupo de Paulinho Serra é avaliada como uma das maiores pixotadas da história política de Santo André. Um novo mandato do grupo incumbente era tão certo que o PT não pretendia concorrer para valer, mas apenas para marcar presença com a ex-vereadora Bete Siraque.

Os recursos financeiros de apoiadores do grupamento seriam direcionados ao deputado federal Alex Manente, que concorrerá a prefeito de uma São Bernardo comandada pelo inimigo Orlando Morando.

A arrogância da Administração Paulinho Serra fez o barco do favoritismo absoluto afundar após desfilar garbosamente a ideia de que o apontamento de nove candidatos do Paço era uma combinação de coalização de interesses uniformes que teria o efeito mágico de arrasar os adversários.

Faltou combinar especialmente com Luiz Zacarias, duas vezes eleito vice-prefeito e avaliado por isso mesmo como o mais provável indicado a vestir a camisa dos situacionistas.  

O Paço de Paulinho Serra e os arredores que dão suporte a Paulinho Serra estão em convulsão. Transferir a crise a supostos adversários políticos é uma inversão cronológica equivoca dos acontecimentos. A rebeldia de Luiz Zacarias, que se sentiu desprestigiado porque o preferido do Paço seria o jovem Gilvan Junior, secretário de Saúde, foi o estopim do rompimento. Até então, o PT de Santo André controlado pelo Paço Municipal gozava de tranquilidade, inclusive com apoio federal.

MAIS COMPLICAÇÕES

A barbeiragem do governo de Paulinho Serra é vista como cegueira estratégica que comprometeu os movimentos preparados para que as eleições de outubro fossem um jogo amistoso com goleada no placar. Imaginava-se no desenho lógico de uma Administração de forte aprovação popular que um time de profissionais enfrentaria um bando de capengas.

Pretendia-se não só fazer com larga vantagem o sucessor de Paulinho Serra num primeiro turno de calmaria como também eleger força-tarefa poderosíssima no Legislativo.

Tudo isso integra o plano de domínio político-eleitoral de Santo André durante os próximos mandatos, além dos dois já consumados.

Na medida em que a Administração de Paulinho Serra acirra a disputa de bastidores para retomar o favoritismo perdido, mais se acentuam dificuldades para conter os ânimos e as perspectivas de sucesso.

APAGÃO ENCOMENDADO

Na semana passada, num novo lance escorregadia, a gestão de Paulinho Serra interferiu nos bastidores para evitar uma cerimônia de homenagem à Acisa, Associação Comercial de Santo André, na Câmara Municipal.

As comemorações de aniversária de criação da entidade foram suspensas por conta de interrupção no abastecimento de energia elétrica. O apagão tem as digitais da torre ao lado do Legislativo. A origem da retaliação estaria na impropriedade cometida pelo vice-prefeito Luiz Zacarias. Já rompido com o Paço, ele enviou aos associados da Acisa centenas de convites personalizados à cerimônia aprovada pelos legisladores em atendimento à indicação do vereador Lucas Zacarias, seu filho. 

A reação do Paço Municipal foi imediata. Assessores de Paulinho Serra recomendaram intervenção ao projetarem ganhos político-eleitorais de Luiz Zacarias, visto como principal adversário do grupo de Paulinho Serra depois de anos de convivência. Até que inventaram o Grupo dos Nove Preferidos. Desses, o Coronel Sardano, ex-secretário de Segurança e vereador, já lançou candidatura própria sem hostilizar o Paço Municipal. Eduardo Leite, vereador, também o fez e mantém bom relacionamento com o grupo de Paulinho Serra.

Outros integrantes da lista se mantêm fieis à Administração. Eles teriam assegurado vantagens nas campanhas para vereador e eventuais acessos à grade de secretários da próxima gestão.  Essas compensações foram o preço acertado para que constassem da lista de favoritos, embora soubessem antecipadamente que tudo não passaria de marketing para favorecê-los durante a campanha eleitoral.

O problema é que alguns ficaram inconsoláveis porque passaram a acreditar que poderiam mesmo concorrer a prefeito com suporte do Paço Municipal.



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