Querem saber o que acho do céu e do inferno projetados outro dia neste espaço em metáforas do que poderia ocorrer com o São Caetano e o Santo André após as duas rodadas que restavam para a parada técnica na Série B do Campeonato Brasileiro?
O céu reservado a um dos primeiros quatro colocados não chegou para o São Caetano, e isso, ao contrário do que parece, é muito bom. Embora a apenas três pontos da liderança, na oitava colocação, os números mostram que as 38 noites que separavam o Azulão da retomada da competição serão muito úteis, sem qualquer risco de empáfia. Mais que a ausência entre os quatro primeiros, há outros três que, pelos termos regulamentares, anteciparam-se na tábua de classificação. Isso prova o quanto o campeonato é competitivo. Não seria a provisoriedade entre os primeiros que deveria iludir a equipe quanto às dificuldades que se apresentam.
E o Santo André, com então contabilizadas 37 noites para descansar, escapou por pouco da zona de rebaixamento. Não terá a desculpa de que perderá totalmente o sono até que a Copa do Mundo termine, mas que emite sinais de que pode entrar na zona de erupção, é melhor não duvidarem.
O céu do chamado G-4 de classificação à Série A do Campeonato Brasileiro pode mesmo esperar pelo São Caetano. Ainda não chegou a hora e talvez demore um pouco senão para chegar, pelo menos para consolidar posição. A equipe de Sérgio Guedes comprovou contra o Brasiliense, no Distrito Federal, que é uma das fortes candidatas ao acesso. Reparos técnicos e táticos serão providenciados durante a parada técnica e vão contribuir com essa avaliação.
Os ajustes estão se encaixando, mas não podem ser minimizados. O que parecia solidificado não está tão seguro assim. Refiro-me ao sistema defensivo. Deixaram-se demais alguns buracos aos contragolpes do Brasiliense. O posicionamento também contou com vacilos, como no gol do adversário, quando a defesa não conseguiu evitar o desfecho do lançamento em diagonal. Iranildo, armador do adversário, também teve liberdade demais no segundo tempo. Cuidados defensivos devem ser priorizados contra valores individuais que podem mudar a história de um jogo.
Nada disso, entretanto, foi desastroso. Até porque o São Caetano sofreu com a ausência de dois titulares do meio de campo, Augusto Recife, um rastreador de espaços, e Fernandes, um motorzinho na marcação e no apoio. De qualquer maneira, o banco do São Caetano possivelmente ajudará a fazer a diferença. Há jogadores de níveis semelhantes em campo e na reserva. O que pesa mais é o entrosamento.
Já o sistema ofensivo compensa com impressionante evolução de movimentos individuais e coletivos o que os resultados ainda não exprimem.
O Azulão ainda exagera no preciosismo ofensivo. Deixa de finalizar quando tudo parece escancarado. Protela o arremate mais simplificado. Exagera na dose de uma arquitetura mais sofisticada. Disparadamente, além de Everton Ribeiro, o lateral-ala Arthur vem se traduzindo no mais bem acabado exemplar que tanto marca quanto apóia e finaliza. O time ofensivamente sem graça e limitado do Campeonato Paulista ficou no passado. Há triangulações laterais e centrais que frequentavam apenas a prancheta dos técnicos que antecederam a Sérgio Guedes. O meio-de-campo junta-se muito mais ao ataque.
O céu classificatório pode esperar porque o São Caetano vai chegar lá se persistir na toada de evolução. Sérgio Guedes é cuidadosíssimo na organização da equipe. A Copa do Mundo deverá ser plataforma de muito sucesso. Mas nada será fácil. A edição da Série B está-se confirmando disputadíssima. Os bichos-papões estão todos na Série A. De onde só despencam por muita incompetência. A dinheirama que recebem com a divisão do bolo do Clube dos 13 carimba quem deve ter vida quase perpétua na Série A e quem tem de fazer das tripas coração para deixar a Série B.
Já o Santo André só está a dois passos da zona de rebaixamento porque a Ponte Preta e América de Natal salvaram a equipe de Sérgio Soares na rodada do final de semana. Menos mal, porque tudo indica que a permanência de 37 noites no inferno poderia abalar ainda mais o moral da tropa. A vizinhança da degola, entretanto, sinaliza que, consumidos 18% dos pontos disputados, o melhor é colocar as barbas da rearrumação de molho. Talvez 18% não sejam uma prévia confiável e preocupante. Talvez sejam.
O Santo André destroçado pós o sucesso no Campeonato Paulista é sério concorrente à Série C do Brasileiro caso não melhore acentuadamente o rendimento individual da maioria dos jogadores e também o sistema de jogo. A equipe é um bando desorientado, nervoso, previsível na movimentação ofensiva (quantas vezes Cicinho tenta cavar faltas em manjadíssimas penetrações em diagonal?) e desastrado na defesa. Um queijo suíço.
Quando afirmo que o Ramalhão é candidatíssimo ao rebaixamento, como base de avaliação as sete primeiras rodadas, não quero provocar terrorismo.
Muito pelo contrário. Quero mesmo é recomendar a jogadores, comissão técnica e dirigentes que acordem para a realidade. Quem ainda está respirando o vice-campeonato paulista precisa de sacudidela. Aquele time ficou para a história, mas história faz parte do passado. Sobram exemplos de glória e fracasso na literatura esportiva. O time derrotado por 3 a 1 pelo Coritiba no Estádio Bruno Daniel está a léguas de distância da competitividade que o adversário mostrou quando correu para valer. Não fosse a acomodação coritibana, o placar seria muito mais elástico.
A bengala de esperança de semanas de preparação até o recomeço do campeonato não pode ganhar a forma e a magia de um bastão capaz de satisfazer todos os desejos. Basta lembrar que os outros 19 competidores também gozarão da mesma regalia.
Está certo que o gongo da paralisação do campeonato soou na hora certa para o Santo André, mas isso é pouco. Rebaixamento não é episódio, é processo. A desconfiança de que as peças de reposição do desmanche não são da mesma envergadura técnica e tática pode virar areia movediça e engolir de vez a autoestima lustrada no Campeonato Paulista.
O Santo André da derrota para o Coritiba estava em frangalhos emocionais. Não lhe faltará tempo para esfriar a cabeça e azeitar as linhas. Resta saber se, ingenuamente, não estão pretendendo repetir a limonada paulista com outro tipo de insumo tropical.
O tom de repreensão do técnico Sérgio Soares aos jogadores não é o mais justo nem o mais sensato no contexto de reformulação a toque de caixa.
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05/08/2024 Conselho da Salvação para o Santo André