Esportes

Um novo Ramalhão em campo;
e um São Caetano mais forte

DANIEL LIMA - 11/08/2010

Calma, calma, não se precipitem, porque, no caso do Santo André que venceu ontem à noite o América Mineiro no Estádio Bruno Daniel, o “novo” não é necessariamente extraordinário. E no caso do São Caetano, o “mais forte” não significa literalmente o que os leitores imaginam. Vou tentar explicar como as vitórias das equipes do Grande ABC na 13ª rodada da Série B do Campeonato Brasileiro acalentam a possibilidade de que o acesso à Série A não é apenas um sonho do São Caetano e o rebaixamento à Série C não deveria ser o fantasma a assustar o Santo André.


Primeiro, sobre o novo Santo André.


Que o resultado e a atuação da equipe não sejam interpretados como consequência da alcaguetagem pública do presidente Ronan Maria Pinto contra jogadores e comissão técnica. Nada disso. Fosse essa a melhor terapia, não um tiro no próprio pé porque o regime é empresarial e a desvalorização do produto uma tamanha besteira, não seria preciso outra coisa aos cartolas senão soltar o verbo e desopilar o fígado em situações análogas. O Fluminense, detentor da maior façanha nacional, praticamente rebaixado no ano passado, é prova de que o melhor remédio contra maus resultados são outras coisas, menos ameaças públicas.


O técnico Sérgio Soares fez cirurgias radicais no Santo André que venceu o América Mineiro. Dos titulares sobraram poucos, por razões técnicas e físicas, mas sobraram poucos.


Apenas o goleiro, os dois laterais e o volante Alê. Os demais então titulares amargaram o banco de reservas ou as arquibancadas. Mais que novos nomes, o que se viu em campo foi a mudança de filosofia.


O time pesado, moroso, desprotegido, insosso da maioria dos jogos, cedeu lugar a uma molecada leve e solta que se movimentou o tempo todo, que combateu o adversário, que ocupou os espaços ofensivos e defensivos.


Nada extraordinariamente revolucionário, nada grandemente confiável no curto prazo, mas muito melhor que o futebol indolente das rodadas anteriores. Indolente no sentido de que as características individuais dos então titulares diferem fortemente dos novos titulares.


Exigir de Xuxa, Sandro Hiroshi, Anderson Gomes, Anderson Costa, e também dos zagueiros de área, a mobilidade dos novos titulares, é colidir com a gênese de cada um. Eles são diferentes, são de roupagem tática conservadora.


Sérgio Soares optou por um time mais veloz, mais solidário. Um time quase reserva. Tanto que não fossem as circunstâncias, as manchetes poderiam dizer que o Santo André jogou com um time misto contra os mineiros. Ou vinha jogando com um time misto até então.


Nada disso, convenhamos, tem a ver com a entrevista do presidente Ronan Maria Pinto. A simplicidade avaliativa do dirigente máximo do Saged, empresa que assumiu o futebol de Santo André, talvez o faça acreditar que suas declarações tenham sido a razão da reviravolta. Nada a ver. O Santo André é um “novo” time no sentido literal da qualificação.


Agora, sobre o “mais forte” São Caetano.


Ganhar do Coritiba em Joinville, teoricamente campo neutro mas de fato reduto dos paranaenses, tal a frequência com que ali se apresentam com apoio de uma torcida pequena mas participativa, veio na hora certa para o São Caetano. Estava na hora de a equipe arrancar um resultado expressivo fora do Anacleto Campanella. Estava na hora de mover-se definitivamente em direção à consolidação no G-4.


Por isso a equipe de Sérgio Guedes está “mais forte” — agora no sentido psicológico. As derrotas para Bahia e Portuguesa, fora de casa não foram obras do acaso, como poderiam parecer, por conta de o São Caetano ter apresentado maior volume de jogo e desperdiçado muitas oportunidades. Aqueles jogos não podem ficar perdidos no passado. Tampouco a vitória contra o Coritiba.


Há uma simetria entre aquelas duas derrotas e a vitória redentora em Joinville. Desprezar o que reina subjacente e que poderia ficar encostado por conta da vitória de ontem à noite não é o mais indicado. O técnico Sérgio Guedes deve ter observado com atenção que, resultado à parte, o São Caetano ainda exibiu contra o Coritiba, notadamente em dois terços do segundo tempo, uma insegurança técnico-tática inquietante para quem vencia por dois gols de diferença e o adversário estava reduzido a 10 jogadores.


Por que o São Caetano deixou escapar o controle do jogo? Está certo que o Coritiba é concorrente seriíssimo ao acesso, que não deve deixar escapar a oportunidade de voltar à Série A, mas estava debilitado numericamente nos dois sentidos, no placar e em campo.


Que o São Caetano entregasse apenas de araque o campo de jogo para o Coritiba avançar, contragolpeando-o, tudo bem. Mas o que se viu foi um domínio do adversário que por pouco chegou ao empate. Ao avançar a marcação o Coritiba pressionou de tal forma que praticamente sufocou o time de Sérgio Guedes. Só nos últimos 15 minutos, quando passou a valorizar mais a posse de bola, descentralizando-a com invertidas laterais, o São Caetano demonstrou maturidade para administrar o resultado e quase dilatá-lo.


Entre aquelas duas derrotas anteriores fora de casa e a vitória em Joinville o São Caetano revelou em comum uma queda a apagões temporários que comprometem o todo.


Tudo isso é exigência demais para um time que ainda está em depuração tática? Claro que sim. Mas quem não quer o melhor para nossas cores na Série B do Brasileiro?


De qualquer forma, no balanço daquela oportuníssima vitória o que mais entusiasma é o desbloqueio psicológico de uma vitória tão expressiva fora de campo. Talvez essa perspectiva tenha influenciado o comportamento nervoso do segundo tempo de um time que avança em todos os sentidos para consolidar-se entre os quatro primeiros. O que não é uma tarefa fácil porque à falta de um grande clube nacional a dominar a classificação, a competição tornou-se mais equilibrada — a maioria se acha no direito de sonhar com uma das quatro vagas, o que é bem melhor do que se imaginar apenas candidato a um de três vagas.


Provavelmente as vagas sejam definidas em detalhes sobrepostos, rodada a rodada. Por isso o São Caetano precisava tanto de uma vitória retumbante contra o líder. Agora, provavelmente com a cabeça em ordem, cuidará mais do equilíbrio estrutural durante os 90 minutos.


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