Esportes

Azulão no céu e Ramalhão
no inferno pela primeira vez

DANIEL LIMA - 23/08/2010

Pela primeira vez na Série B do Campeonato Brasileiro o São Caetano e o Santo André ocupam paralelamente o céu e o inferno. Explico: em várias rodadas o São Caetano ficou entre os quatro primeiros e também em algumas outras o Santo André ficou entre os quatro últimos, mas as duas equipes ocuparem essas posições ao final de uma rodada, isto não havia ocorrido ainda.


E tudo corre dentro da lógica. O que resta saber depois de 15 rodadas (ou de três pacotes de cinco jogos já consumidos) é quem tem mais possibilidades na competição: o São Caetano de continuar entre os primeiros ou o Santo André de escapar dos últimos lugares. Estou mais próximo da sensação de que a viabilidade do Azulão subir para a Série A é semelhante à do Ramalhão ser rebaixado à Série C.


No caso do São Caetano, as declarações do técnico Sérgio Guedes nos dias subsequentes à goleada sofrida para o Sport em Recife indicam que ele seguirá novo roteiro em jogos mais complicados fora de casa, para não continuar colecionando derrotas e muitos gols contra: reforçará a marcação no meio de campo, provavelmente com um segundo volante, e recomendará ao restante da equipe que deixe de olhar para o próprio umbigo de virtuosidades quando a posse de bola for do adversário, aplicando severa marcação.


É importante ressaltar que um nível maior de competitividade do São Caetano fora de casa não pode ser confundido com amesquinhamento tático ou com agressividade técnica. Nada disso conduzirá o São Caetano à melhoria no desempenho em campo adversário. O time de Sérgio Guedes precisa sim de alguns retoques, de uma alma menos espetaculosa e mais guerreira diante de público contrário, mas sem se exceder tanto em disciplina quanto em defensivismo. Encontrar o meio termo tático para melhorar o rendimento como visitante é a pedra de toque que daria ao São Caetano um salto qualitativo com influência direta na classificação.


No caso do Santo André, as declarações do presidente Ronan Maria Pinto publicadas no Diário do Grande ABC, de sua propriedade, são um aviso prévio ao o técnico Sérgio Soares. O dirigente apareceu oferecendo ampla retaguarda ao treinador, depois de, há 10 dias, esculhambar publicamente o grupo de jogadores e, indiretamente, a comissão técnica, da qual faz parte Sérgio Soares, fragilizando-a junto aos comandados.


Como era de se esperar, o destempero verbal não surtiu efeito algum, porque o terceiro time montado por Sérgio Soares na temporada sofre do mal crônico de carência de coletivismo. O apoio de Ronan Maria Pinto tem cheiro de preparação do terreno para a substituição do treinador que levou o time ao título de vice-campeão paulista mas cometeu o maior dos pecados entre quem vive a fugacidade do sucesso inesperado no futebol: deixou de trocar de equipe enquanto o recall daquelas memoráveis finais contra o Santos o lançava nos braços de muitos clubes interessados em seus préstimos. Da mesma forma que o Santo André vice-campeão virou fumaça, o técnico Sérgio Soares, igualmente vice-campeão, virou currículo nem sempre reconhecido.


A situação do Santo André será agravada com eventual derrocada à Série C do Campeonato Brasileiro. Perder uma vaga na Série B seria uma calamidade, porque retiraria o Santo André do calendário nacional. A Série C é apenas tapa-buraco. A Série B pode não representar diretamente muitos recursos financeiros porque a CBF privilegia o Clube dos 13, mas é vitrine importantíssima a quem faz da venda de jogadores a maior fatia de recursos orçamentários.


As reclamações do presidente Ronan Maria Pinto ainda outro dia sobre o magérrimo repasse de recursos financeiros ao Santo André pela CBF foram duplamente negativas. Primeiro porque o dirigente simplesmente descarta a vitrine dos jogos transmitidos em canais pagos e que, vistos pela comunidade de treinadores e dirigentes de todas as divisões, podem abrir muitas portas a negociações. O próprio Santo André, na Série B de 2008, usufruiu dessa visibilidade ao vender Maicon Leite, Pará e Williams, apenas para citar alguns talentos que brotaram nos tempos em que Jairo Livolis e Celso Luiz de Almeida comandavam o clube. Segundo porque hostilizar quem comanda o futebol brasileiro não é receituário diplomático que dirigentes mais experientes ousam praticar.


A estrela do São Caetano brilhou no final de semana porque, depois da goleada diante do Sport, só lhe restou torcer por tropeção de equipes que o perseguiam na classificação de modo que os 60% de índice de aproveitamento garantissem uma vaga na zona de acesso. E não é que Náutico e Portuguesa se trumbicaram?


Agora, para seguir entre os quatro primeiros colocados no quarto e último pacote de jogos do primeiro turno (as quatro rodadas que restam) o São Caetano precisará ganhar os dois compromissos em casa e descolar dois pontos nos dois jogos como visitante. Pode ser que com menos de 60% de aproveitamento a equipe consiga virar o turno entre os quatro primeiros colocados, mas o melhor mesmo é não abusar.


Já a tarefa do Santo André é mais extenuante, porque precisa chegar a 40% de índice de aproveitamento para fugir da zona de rebaixamento. Encara o Ipatinga nesta terça-feira em Minas Gerais e terá dois jogos em casa, contra Sport e Bahia, candidatíssimos ao acesso. Sim, o Sport, mesmo lá embaixo na classificação, tem tudo para disputar uma das quatro primeiras colocações.


O adversário mais indigesto do Santo André é o próprio Santo André. O time oscila demais, perde-se no sistema defensivo, sofre de implacável dificuldade à criação de jogadas e entrou numa fase autofágica de substituir desesperadamente jogadores a cada partida.


É possível que rebaixamento não tenha fórmula única, da mesma forma que o acesso, mas que o Santo André anda caprichando no infortúnio, disso não tenho dúvida.


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