Esportes

Por que a ausência de equipe de
massa causa estresse na Série B?

DANIEL LIMA - 30/08/2010

Em competição de pontos corridos, caso da Série B (e também da Série A) do Campeonato Brasileiro, uma multiplicidade de fatores determina o resultado final. Quem não tiver equilíbrio emocional além de fatores técnicos, táticos e estratégicos corre o risco de nadar, nadar e morrer na praia. A definição cabe tanto às equipes que já se deram conta de que não podem abrir mão de disputar os primeiros quatro lugares, com direito à Série A no ano que vem, como àquelas que, embora relutem, já começam a admitir que, quase metade da disputa alcançada, têm mesmo de se virar para fugir da obscura Série C. No primeiro caso está o São Caetano do técnico Sérgio Guedes e no segundo o Santo André do técnico Sérgio Soares.


E querem saber, por conta disso, qual declaração mais me agradou entre as expostas pelos dois treinadores na rodada desdobrada entre sexta-feira e sábado? Do técnico Sérgio Soares.


O treinador e a equipe que iniciaram a competição no embalo do vice-campeonato paulista, inebriados pelo sonho da Série A do presidente Ronan Maria Pinto como se não houvesse um desmanche no meio do caminho, já sabem que a parada é dura para continuar na Série B. Com isso, se explica claramente o comportamento do Ramalhão também no jogo contra o Sport. Como se a retranca contra o Ipatinga já não fosse suficiente à guinada defensivista após show de ofensivismo no Campeonato Paulista.


O Santo André busca com maior segurança defensiva mais que eventual refúgio covarde, mas sim uma saída inteligente, embora constrangida, para dar a volta por cima depois de esperada estabilização. Mesmo que a estabilização num primeiro estágio seja forrada de empates.


O treinador Sérgio Soares liderou o time com todos os méritos na memorável campanha que culminou com a decisão contra o Santos ao colocar o ataque como prioridade absoluta. Também contribuiu para a derrota do primeiro jogo daquelas finais por insistir em privilegiar a feitura de gol quando a ausência do lateral Carlinhos recomendava um terceiro zagueiro à improvisão de Rômulo. Agora, dá sinais de maturidade ao retroceder no ímpeto ofensivo. Jogar na defesa até que a borrasca passe é prova de humildade. É melhor recuar um passo para avançar dois a virar saco de pancadas.


Chegará o momento de soltar as amarras, porque três pontos num único jogo são três pontos, muito melhor que três pontos em três empates. Entretanto, esse não é o tratamento indicado ao Santo André no momento. Vale mais, por enquanto, um, dois ou mais empates psicologicamente reparadores do que uma vitória esparsa rodeada de derrotas seguidas. Sem recuperar a confiança, tudo será perdido, sabe bem Sérgio Soares.


O empate com o Sport, embora indesejado, deve ter leitura otimista. Faltou pouco para uma virada no placar. Aquele resultado dá mais ânimo e confiança contra o Bahia, nesta terça-feira no Bruno Daniel, do que o ambiente que cercava a equipe antes do jogo como os pernambucanos. O Ramalhão jogará um pouco menos preso ao temor de sair derrotado antecipadamente.


Sim, houve excesso de cuidados no primeiro tempo contra o Sport, no Bruno Daniel. Menos mal que a recuperação no segundo, com um time mais ofensivo e um Sport crente de que já liquidara a fatura, tenha correspondido com mais um ponto ganho. Um ponto insuficiente para sair da zona da degola, é verdade, mas de certo modo animador à reconstrução da auto-estima estilhaçada.


No caso do técnico Sérgio Guedes, sempre comedido, sempre com repertório coerente de fundamentação explicativa a cada resultado do Azulão, o que se viu nos vestiários, tempos depois do último apito, foi uma certa intolerância com o rendimento do time. E que rendimento mais uma vez foi esse? Uma espécie de Espanha — guardadas as devidas proporções — capaz de fazer da bola um brinquedo a girar por todos os cantos, mas com enormes dificuldades para balançar as redes, principalmente fora de casa. E, diferentemente da Espanha, um time convidativo ao contragolpe.


Disse Sérgio Guedes, mais nas entrelinhas do que de forma escancarada, que promoveria mudanças na equipe nesta terça-feira fora de casa contra o Duque de Caxias. Mais que isso, que a ausência de quatro titulares no próximo jogo será até interessante para que possa formular novos ensaios. Nada condenável, que fique bem claro, o depoimento de Sérgio Guedes, porque o São Caetano está mesmo se excedendo no direito de levar todos — inclusive os críticos — a acreditar que afundará o adversário e, de repente, lá se vai mais um jogo a contabilizar passivo na classificação. O problema é que não é hora de o técnico perder a classe e a paciência, porque a Série B está recheadíssima de surpresas em cada rodada.


Tenho a impressão que as quatro vagas do acesso à Série A do Campeonato Brasileiro — e também as quatro vagas da zona do rebaixamento — se sacramentarão mesmo de acordo com o grau de equilíbrio fora de campo tanto dos técnicos quanto dos dirigentes. Se não houver por parte de todos a conscientização de que a Série B desta temporada ganhou um significado diferente das edições anteriores, se não houver cuidados especiais, possivelmente a criança da qualificação técnica-tática será lançada fora do balde classificatório juntamente com as águas da impaciência.


O que se passa, afinal, de diferente na Série B desta temporada?


Escrevi outro dia sobre o assunto apenas de passagem, mas acho que vale a pena repisar a ideia e aprofundá-la um bocado. Trata-se do seguinte: sem um time grande, de massa, desses que, em rede nacional, chama mesmo a audiência das emissoras de TV, todos os 20 concorrentes se sentiram, antes mesmo da primeira rodada, em condições de constar da lista dos quatro primeiros. Sem Vasco, Corinthians, Grêmio, Palmeiras e Botafogo, que se revezaram no rebaixamento, a possibilidade de subir pareceu mais à mão de todos. Com todas as repercussões que se possa imaginar.


Na virada para o segundo turno, fatalmente teremos pelo menos 10 equipes em condições de continuar disputando uma das quatro vagas. Nenhuma, absolutamente nenhuma, será observada como favoritíssima a uma das vagas. Nem mesmo o Figueirense, um pouco à frente dos demais, com 34 pontos. Ora, diante desse quadro, é natural que esse grupamento se sinta praticamente na obrigação de subir. Sim, na obrigação de subir, “porque não tem nenhum bicho-papão” na competição. Daí advém certa inquietação por resultados que possam definir de imediato um desenho mais visível dos favoritos a uma das quatro vagas. Quem se sentir pressionado demais nesse sentido, como me pareceram as declarações de Sérgio Guedes ao final do jogo contra o América Mineiro, pode entornar o caldo.


Por isso, me parece que, nem afobação pelo arremate antecipado de uma das quatro vagas, nem um certo ar de desdém exatamente porque a ausência de um bicho-papão possibilitaria recuperação de descuidos, são ingredientes de quem quer chegar lá.


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