A integração que se espera como alavanca para a superação de problemas históricos do Grande ABC passa pela racionalidade técnico-institucional dos agentes empresariais subdivididos em diferentes entidades. Enquanto prevalecer o desperdício do separatismo das associações comerciais e dos Ciesps, que, como remadores enlouquecidos, movem suas pás em diferentes sentidos num bote que está à deriva e não consegue sair do redemoinho que o engolfa, dificilmente o desenvolvimento econômico sustentável reunirá essa porção importante do capital social.
Considerando-se o formato atual e pregresso das entidades de classe, no qual prevalece em larga escala a hierarquia de dirigentes cujas atividades principais estão voltadas a seus próprios negócios, a pasmaceira institucional viverá de fluxos e refluxos erráticos, sem táticas nem estratégias definidas. As atividades se darão mais consistentemente como entidades prestadoras de serviços técnicos aos associados. Se por um lado essa vertente é indispensável à manutenção financeira, por outro transforma as entidades em modelo de escritórios de luxo.
Muito se critica e se cobra das organizações públicas do Grande ABC, que a partir do começo dos anos 90 iniciaram morosa e oscilante conjugação de esforços em algumas áreas. As aproximações são vacilantes em muitos pontos nevrálgicos para a importância desse período de fundas perdas regionais. Entretanto, mesmo que o saldo não seja extraordinariamente positivo como alguns tentam vender, ou, para ser mais preciso, está muito aquém das necessidades, pelo menos os prefeitos tiveram o mérito de quebrar o gelo de décadas de distanciamento.
Já as associações comerciais e os Ciesps só se lançaram como protagonistas coletivos, mesmo assim distantes da pauta dos empreendedores locais, durante os primeiros anos de Fórum da Cidadania. Um plano especificamente voltado ao assentamento de questões mais profundamente inquietantes da classe, associado à inserção nos macroproblemas regionais, jamais foi elaborado. Age-se sob influências de pressões pontuais e localizadas em determinados municípios. Regionalidade continua sendo objeto não-identificado das supostas lideranças empresariais. Apenas a Acisa, com determinados programas, de vez em quando dá um choque de extroversão corporativa, mesmo assim sem o aparelhamento técnico específico que se recomenda.
Pior do que a constatação da falta do acorrentamento voluntário das entidades de classe empresariais é a solidificação do determinismo de manter o isolamento mútuo como prova de independência. Há muitos anos a Acisa, por exemplo, tem procurado sincronizar ações prestadoras de serviço com as demais associações comerciais, para, entre outros aspectos, alcançar o que se tornou dogma na iniciativa privada: o ganho de escala. Qual nada! Para cada eventual passo dado à frente, sempre aparece alguém para provocar dois passos atrás.
Há muitas questões regionais que poderiam ganhar agilidade se as entidades empresariais fossem unidas e reconhecessem humildemente que há especialistas no mercado que, se contratados por tempo determinado, poderiam oferecer adensamento de qualidade de informações estratégicas às próprias entidades.
Outro dia mesmo sugeri que se contasse com um profissional especializado em IPTU para vasculhar todos os municípios da região de forma a detectar os mais variados aspectos do tributo e, com base nas realidades sempre recônditas, se achassem subsídios para a uniformização dos pleitos. É impossível falar com seriedade de competitividade sem que se tenha acesso seguro às especificidades municipais da região. O mesmo vale para o ISS, o ITBI e outros impostos e taxas municipais que são uma caixa-preta porque não temos o que convencionamos chamar de capital social.
Muitos outros exemplos poderiam ser citados como atribuições que as entidades de classe empresariais compartilhariam com conhecimento de causa com demais agentes sociais da região.
O caso do trecho sul do Rodoanel é escandalosamente claro. Parece que a Associação Comercial e Industrial de Santo André vai à luta, agora com o empenho das demais entidades. Trata-se de reação atenciosa à proposta deste jornalista, mas é muito pouco ainda: a concentração de interesses estratégicos que fujam do formato essencialmente classista é uma exigência destes tempos. Como tal, obriga à constituição, mesmo que informal, de forças-tarefas decididas a valorizar o temário econômico da região.
O que quero dizer com isso? Que até mesmo de forma independente desse modelo arcaico que esbofeteia a regionalidade pretendida é possível encontrar espaço construtor de organização integrativa em questões de responsabilidade institucional. Não é, certamente, a solução ideal, que passa pela compactação e enxugamento das representações classistas dos empresários. Mas é um arremedo que quebra o galho e pode, se bem instrumentalizado, induzir à amarração estrutural mais ampla.
Traduzindo tudo isso de forma bem didática:
O ideal é que as associações comerciais e os Ciesps da região se fundissem num único organismo regional, com gestão compartilhada de base representativa igualmente regional e que se debruçasse sobre questões assemelhadas e diferenciadas de forma engenhosa.
Enquanto o bom senso perde o jogo para o individualismo, que se planejem ações integrativas de cunho institucional e voltadas ao desenvolvimento econômico sustentável, por meio de força-tarefa diretiva que atuaria mutuamente além de suas próprias e antiquadas fronteiras. Seria um remendo interessante para se chegar ao modelo ideal. Um caminho pragmático que ultrapassaria as barreiras provincianas. Um chute nos fundilhos do municipalismo que deveria ser riscado do mapa geoeconômico regional.
Será que nem disso serão capazes os dirigentes das associações comerciais e dos Ciesps e também os demais sindicatos empresariais da região, caso do varejista, dos hotéis e bares, dos moveleiros e tantos outros menos votados? Será que a maioria de seus titulares não entendeu ainda que o jogo da institucionalidade mudou completamente com a globalização e que, exatamente por isso, regionalidade passou a ser palavra de ordem?
O setor público regional — uma variante do setor público estadual e federal — está muito à vontade para impor seu jogo porque não sofre qualquer pressão organizada e planejada de agentes econômicos. É por essas e outras que todos os problemas nacionais e estaduais, sobretudo o avanço pantagruélico sobre o bolso dos contribuintes, têm a mesma fundamentação lógica: a bobagem do restante da sociedade em se manter dividido e individualizado, imaginando que um passo à frente, de vez em quando, não seja apenas uma traquinagem ótica porque, quando isso se dá de fato, o bonde da história há muito passou pela estação da responsabilidade compartilhada e produtiva. Esse jogo em que a sociedade desorganizada sempre perde precisa mudar, como recomenda o teórico da Terceira Via, Anthony Guiddens.
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24/10/2024 UFABC fracassa de novo. Novos prefeitos reagirão?