Regionalidade

Buraco no Consórcio

DANIEL LIMA - 07/04/2005

Parodiando Carlos Drummond de Andrade, há um buraco no meio do caminho do Consórcio de Prefeitos rumo a efetividade e celeridade de resultados. Um buraco e tanto. E que, mais do que nunca, face às alterações legais que passarão a regulamentar o ajuntamento de dois ou mais municípios, além de Estado e União, esse buraco não pode ser simplesmente contornado, como tem sido. É preciso tapá-lo. Aliás, tapá-lo é pouco: tem de ser tapado e adubado, para que floresçam frondosos resultados.


Trata-se esse buraco da necessidade de indicação de um representante do governo federal na entidade que representa os prefeitos, com possibilidades de trânsito também em outra instituição regional que de alguma forma pode ser avalizada como minimamente produtiva, no caso a Agência de Desenvolvimento Econômico. Já a Câmara Regional, que alguns tentam ressuscitar, não passa de esqueleto inútil, como todos os esqueletos, menos os de dívidas públicas.


A falta de um representante com conhecimento regional que fale em nome do governo federal nas instâncias locais é descalabro e contra-senso. Descalabro porque os petistas comprovam também nesse caso que eram bons de bola como oposicionistas, mas cometem barbaridades quando no poder. Contra-senso porque não tem sentido qualquer entidade regional com sonhos de grandeza se furtar à imperiosidade de reforçar-se com pelo menos um quadro permanente do governo federal.


Como pode o governo federal reivindicar participação na Agência Metropolitana preparada pelo governador Geraldo Alckmin se em instâncias sub-metropolitanas, casos do Consórcio e da Agência de Desenvolvimento Econômico, simplesmente ignora essa espécie de estágio de conhecimentos e experiências extra-municipais?
No caso específico do Grande ABC, o deslize federal é monumental porque, até prova em contrário, mesmo com mais erros que acertos, o Consórcio de Prefeitos e a Agência de Desenvolvimento Econômico são os únicos exemplares metropolitanos de convergência entre municípios.


O perfil do braço de inteligência do governo federal nas entidades regionais do Grande ABC tem alguns pressupostos básicos que não podem ser desconsiderados sob pena de a emenda soar pior do que o soneto, ou seja, a indicação se converter em atentado a um modelo prospectivo, revolucionário até.


Certamente terá de ser indicado um petista, porque não se pode romper a sincronia de que o governo federal em suas dimensões oceânicas é corporativista no sentido político-partidário, como o são os governos estaduais e os governos municipais. Que o petista seja, então, inteligente, inovador, desbravador, preferencialmente com experiência administrativa e operacional. Que também entenda do riscado de relações institucionais, principalmente entre executivos e legislativos.


Melhor ainda se for descartadamente sem ambições eleitorais, de modo que se dedique a uma moldura técnico-operacional acima de veleidades e suscetibilidades que o voto popular determina.
Portanto, esse buraco nada drummondiano está aí para ser devidamente entendido com duplicidade de valor: sua própria existência sinaliza que o Consórcio de Prefeitos deixou passar por 15 anos um elefante de desprestígio federal às suas deliberações, algo que somente agora, benditamente agora, num momento crucial para a formatação do arcabouço da Agência Metropolitana, se tem a oportunidade de reparar.


Nesse momento em que secretários jurídicos das sete prefeituras do Grande ABC se dão ao trabalho de encontrar mecanismos de adequação do estatuto do Consórcio de Prefeitos à iminente sanção da legislação aprovada pela Câmara Federal e também ao enquadramento sugerido pela Fundação Getúlio Vargas, a inserção de um representante do governo federal como interlocutor permanente se torna crucial.


Jamais o Grande ABC teve oportunidade tão especial de solidificar aproximação com o governo federal: as eleições presidenciais estão aí, o presidente emergiu de São Bernardo e as profundas carências sociais e econômicas remanescentes de um desastre chamado FHC exigem inovações no campo institucional.


O distanciamento efetivo, diário, do governo federal das entidades regionais é um campo fértil para ações oportunísticas de representantes do mesmo governo federal que só enxergam o Grande ABC como prioridade em medidas seletivas, como foi o caso da aprovação da Universidade Federal. Uma conquista que precisa ser relativizada e que não pode, de forma alguma, encobrir uma realidade evidente: ainda recebemos muito pouco em relação ao que geramos de impostos federais e estaduais.


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